TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 90.º Volume \ 2014
330 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL de matérias, estatutariamente enunciadas e definidas, que formam o âmbito da competência legislativa das regiões. Nos termos do Acórdão n.º 187/12: «É sabido que a sexta revisão da Constituição da República, levada a cabo pela Lei Constitucional n.º 1/2004, veio alterar profundamente o modelo básico de repartição de competências legislativas entre Estado e regiões. No centro da alteração encontra-se a nova função que às normas estatutárias é agora atribuída. De acordo com a atual redação da alínea a) do n.º 1 do artigo 227.º, e dos n. os 1 e 2 do artigo 228.º da CRP, cabe aos estatutos político-administrativos enunciar as matérias, ou os setores de atividade, em relação às quais se exerce a autonomia regional, em harmonia com o princípio da supletividade da legislação nacional. Daqui resulta, portanto, um qua- dro constitucional de repartição de competências entre República e regiões que, sendo diverso do vigente antes da sexta revisão da CRP – e tendo sido adotado pelo legislador de revisão com o intuito de assegurar uma mais ampla leitura do princípio da autonomia regional –, devolve aos estatutos político-administrativos a função de completar ou integrar o próprio modelo constitucional de repartição de competências entre legislador nacional e legislador regional. Na verdade, e como tem dito o Tribunal (vejam-se, entre outros, os Acórdãos n.º 258/07, 402/08, 432/08 e 304/11), o âmbito de atuação daquele último legislador passou a ser definido pela Constituição e pelos Estatutos Político-Administrativos das regiões, que, uma vez respeitadas as exigências impostas pelo âmbito regional e pela reserva de competência dos órgãos de soberania [artigos 112.º, n.º 4; 227.º, n.º 1, alínea a) da CRP], definem os setores de atividade sobre os quais se exercerá a competência legislativa regional.» Atento o valor supralegislativo da norma estatutária que atribui à região competência material para legislar no domínio das fundações de direito privado, constante da alínea e) do artigo 67.º dos Estatutos Político-Administrativos da Região Autónoma dos Açores, vejamos se dela decorre o efeito invalidante peti- cionado pelos requerentes. E) Competência para o reconhecimento 9. Os requerentes sustentam a ilegalidade da norma que estabelece um modelo de administração uni- tária quanto à entidade competente para o reconhecimento de fundações privadas, cometendo ao Primeiro- -Ministro, com faculdade de delegação, a competência para o reconhecimento das fundações privadas. Na ótica dos requerentes, a autorização estatutária contida na alínea e) do artigo 67.º do EPARAA comete ao legislador regional a faculdade de dispor, entre outras vertentes do regime das fundações privadas, sobre a atribuição de competência para o reconhecimento das fundações sediadas no arquipélago dos Açores, cujo valor supraordenador consideram infringido pela Lei-Quadro das Fundações. Centremos, então, a atenção no ato de reconhecimento e na sua função no regime das fundações privadas. 10. Na ausência de uma definição legal do conceito de fundação, é comummente aceite que este poderá ser alcançado através da consideração dos pontos identitários do respetivo regime jurídico, tal como este se encontra definido no Código Civil. Por via disso, ela é caracterizável, enquanto pessoa coletiva, a partir dos dois atos, em regra, lógica e cronologicamente sequenciais: o ato de instituição e o ato de reconhecimento, representando o segundo a “positiva apreciação da presença dos elementos essenciais da figura, no conteúdo precetivo do primeiro” (cfr. Joaquim de Sousa Ribeiro, “As Fundações no Código Civil: Regime Atual e Pro- jeto de Reforma” , in Lusíada, Revista de Ciência e Cultura , n. os 1 e 2, Coimbra Editora, 2001, p. 59). Enquanto negócio jurídico unilateral, a instituição corresponde à manifestação da vontade do institui- dor – compreendendo este um ou mais sujeitos, pessoas físicas ou pessoas coletivas – em afetar um patri- mónio a um determinado fim duradouro (artigo 186.º, n.º 1, do Código Civil), podendo tal manifestação revestir a forma de ato entre vivos, através de escritura pública (cfr. artigo 185.º, n.º 2, do Código Civil, na redação conferida pela Lei n.º 24/2012), ou de disposição de bens por testamento.
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