TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 90.º Volume \ 2014

32 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Assim sendo, a linha argumentativa que suporta a pronúncia de inconstitucionalidade constante da alínea b) da decisão, incluindo a indeterminação e contingência que decorre da conformação normativa do mecanismo de reversão decorrente dos n. os  2 e 3 do artigo 4.º do Decreto n.º 264/XII, condicionado ao preenchimento do conceito inteiramente aberto de disponibilidade orçamental, constitui um plus , refor- çando o juízo de inadmissibilidade constitucional, por violação do princípio da igualdade na repartição dos encargos públicos, que decorre da repetida – acumulada – desigualdade de tratamento na repartição dos encargos públicos entre quem recebe remuneração por verbas públicas e quem aufere outros rendimentos. Nessa medida, por decorrência lógica de fundamentos mais abrangentes, acompanho a pronúncia de inconstitucionalidade constante da alínea b) da decisão, incidente sobre a vertente do programa normativo de reduções remuneratórias relativa aos anos de 2016, 2017 e 2018. – Fernando Ventura. DECLARAÇÃO DE VOTO Vencida quanto à pronúncia de inconstitucionalidade pelas seguintes razões: 1. OTribunal faz assentar o presente juízo de inconstitucionalidade na manutenção da sua própria juris- prudência sobre anteriores medidas legislativas que impunham reduções remuneratórias. Como sempre dissenti dessa jurisprudência (cfr., por último, a minha declaração de voto aposta no Acórdão n.º 413/14), não posso deixar de divergir de mais uma decisão jurisprudencial que oferece, como único ou principal argumento para o juízo de inconstitucionalidade, a autoridade de fundamentos passados que nunca compartilhei. A este ponto, no entanto, acresce um outro, que, no presente caso, assume acen- tuada relevância. Se, nas decisões anteriores a que acima me referi, o ponto nevrálgico da dissensão (tal como a entendi), se situava no devido traçar de fronteiras entre a competência própria do Tribunal Constitucional e a com- petência própria do legislador ordinário – tendo eu sempre concluído que, quando aplicada ao domínio das reduções salariais, a fórmula da “igualdade proporcional” conduziria o Tribunal a ocupar um espaço que nos termos constitucionais apenas ao poder legislativo pertence –, por maioria de razão concluo que, no presente caso, a manutenção acrítica de argumentos sustentados no passado exponencia em muito o desequilíbrio já existente entre o que, de acordo com a CRP, cabe à jurisdição constitucional e o que pode e deve fazer o poder político, legitimamente mandatado. De forma alguma compreendo por que razão se entende que a Constituição proíbe que este último possa desenhar uma política económica no quadro de uma previsão de quatro anos, onde, relativamente aos “cortes salariais” iniciados em 2011, se apresente como plano possível o faseamento da sua progressiva reversão. Como não entendo que seja possível aplicar a este mapa futuro – e desse modo condicionando estratégias político-económicas de médio prazo – a fórmula da “igualdade pro- porcional”, com o seu teste do “limite do sacrifício”. Qual o par comparativo que, no quadro incerto de um plano político futuro (sem que se saiba quais são as decisões que vão ser tomadas em domínios outros como os que pertencem à política fiscal), pode ser eleito para efeitos de comparação? Qual a medida de diferença de tratamento [entre quem e quem] a ser apreciada sob o ponto de vista da proporcionalidade? Qual, enfim, o critério seguro para aferir do seu excesso, daí se extraindo o juízo de inconstitucionalidade? 2. Mas para além de todas estas dúvidas, para as quais não encontrei resposta, um outro ponto há na fundamentação do Acórdão que merece a minha dissensão. Enquanto, nas suas anteriores decisões sobre “cortes” salariais no setor público, o Tribunal decidiu as questões que lhe foram colocadas sem que na sua argumentação se tivesse sequer ponderado o mandato cons- titucional para com a integração europeia (cfr. artigo 7.º, n. os 5 e 6, da CRP), a presente decisão, embora se limite a remeter para jurisprudência anterior, dedica uma parte da sua fundamentação à descrição do quadro normativo de coordenação e governação da União Económica e Monetária.

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