TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 90.º Volume \ 2014

313 acórdão n.º 468/14 3. A Lei do Tribunal Constitucional não contém norma específica que regule a dedução de incidentes pós-decisórios que tenham por objeto acórdãos proferidos pelo Tribunal Constitucional em sede de fiscaliza- ção abstrata de constitucionalidade (preventiva ou sucessiva), sendo que a única disposição de remissão sub- sidiária para legislação aplicável é a que consta do artigo 69.º dessa Lei, que se refere à tramitação dos recursos em fiscalização concreta. Em todo o caso, estando em causa uma decisão judicial proferida no âmbito da atividade jurisdicional do Tribunal, deverá entender-se que o Acórdão, ainda que proferido em fiscalização sucessiva, está sujeito aos princípios gerais do processo aplicáveis a decisões insuscetíveis de recurso, tor- nando-se irrelevante, face aos interesses subjacentes à intervenção do Tribunal nessa forma de processo, que o novo Código de Processo Civil tenha deixado de contemplar o pedido de aclaração que constava do antigo artigo 669.º, n.º 1 (cfr., neste sentido, em situação similar, o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 58/95). Não há, por isso, obstáculo à admissibilidade do requerimento. 4. Sucede que o Acórdão, na parte a que se refere o pedido, não contém qualquer obscuridade ou ambi- guidade que deva ser suprida. No n.º 99 do Acórdão, o Tribunal apenas procedeu à limitação dos efeitos da declaração de inconstitu- cionalidade das normas do artigo 33.º da Lei do Orçamento do Estado para 2014, nos termos consentidos pelo n.º 4 do artigo 282.º da Constituição, atribuindo, com fundamento em interesse público de excecional relevo, eficácia ex nunc a essa declaração de inconstitucionalidade, de modo a que apenas produza efeitos «a partir da data da sua decisão». E, consequentemente, na alínea f ) da parte dispositiva, determinou que «a declaração da inconstitucionalidade constante da alínea a) só produza efeitos a partir da data da presente decisão». Sabe-se que o efeito geral normal da declaração de inconstitucionalidade é o efeito ex tunc, implicando que a declaração de inconstitucionalidade produza efeitos desde a entrada em vigor da norma declarada inconstitucional (artigo 282.º, n.º 1). A atribuição de efeitos ex nunc a partir da data da decisão é uma das possibilidades abertas pelo n.º 4 do artigo 282.º, que permite, no condicionalismo aí previsto, a fixação de efeitos com «um alcance mais restrito». O alcance mais restrito significa que a sentença declarativa de incons- titucionalidade não tem efeitos retroativos reportados à entrada em vigor da norma declarada inconstitucio- nal, como resultaria do n.º 1 do citado artigo 282.º, mas produz efeitos a partir de um momento ulterior, que poderá ser a data da declaração da inconstitucionalidade ou da publicação do Acórdão (Gomes Canotilho/ Vital Moreira, Constituição da República Portuguesa Anotada, vol. II, 4.ª edição, p. 978). No caso, o Tribunal optou por limitar efeitos por referência à data da decisão de inconstitucionalidade e, portanto, à própria data da prolação do acórdão. Datando o Acórdão de 30 de maio de 2014, os efeitos da declaração de inconstitucionalidade produzem-se a partir do dia imediato, por aplicação de um princípio geral de direito – que se entendeu não ser necessário explicitar – segundo o qual no cômputo do termo não se conta o dia em que ocorre o evento a partir do qual ele deve iniciar-se [cfr. artigo 279.º, alínea b) , do Código Civil]. A decisão relativa à limitação de efeitos não oferece, por isso, quaisquer dúvidas, quer quanto ao con- teúdo decisório da limitação ( ex nunc ), quer quanto à sua extensão temporal (a partir da data da decisão). Os esclarecimentos que o requerente pretende obter não derivam, por isso, de qualquer obscuridade ou ambiguidade que o acórdão contenha quanto à limitação dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade, mas relacionam-se com aspetos de ordem prática que respeitam já ao cumprimento do julgado e extravasam o âmbito da atividade jurisdicional do Tribunal. 5. O Tribunal Constitucional, enquanto órgão jurisdicional de fiscalização da constitucionalidade, não pode intervir no âmbito da competência administrativa do Governo. Assim como não pode criar inovatoria- mente parâmetros normativos de regulação da vida coletiva que invadam a esfera do legislador ordinário e exorbitem a função de administração de justiça em matéria de natureza jurídico-constitucional. E esse prin- cípio é aplicável tanto em relação a uma decisão de inconstitucionalidade como em relação a uma decisão de

RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=