TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 90.º Volume \ 2014
31 acórdão n.º 574/14 nas remunerações de quem aufere por verbas públicas, dada a “eficácia imediata” na consolidação ou redução do défice orçamental (Acórdão n.º 396/11). Um tal registo permaneceu excecional com as necessidades a que pretendeu fazer face, em especial a de cumprir o PAEF e a de cessar o Procedimento por Défice Excessivo. Acontece que as normas impugnadas, no horizonte temporal referido, indiciam um estado de urgência permanente que tende a tornar normal a medida de redução remuneratória dos trabalhadores da Adminis- tração Pública. Com efeito, o excesso de perduração temporal da medida generaliza a situação de urgência que a ditou, sem resolver definitivamente a situação problemática das finanças públicas, uma vez que uma intervenção em situação de urgência não resolve duravelmente o problema da sustentabilidade das finanças públicas. Ora, a duração da medida por um período de oito anos, o correspondente a um quinto da vida ativa de um trabalhador, transforma o transitório em normal. As normas impugnadas comprometem-se assim na via de um “provisório permanente” que é excessivamente onerosa para os afetados. Se a necessidade urgente de fazer face a uma situação de grave e extrema emergência financeira não tornava excessivo o sacrifício da remuneração, a mesma ponderação não pode ser feita quando a temporalidade do excecional tende a impor- -se como normal. Para os fins da consolidação orçamental e da sustentabilidade a longo prazo das finanças públicas, que são objetivos da responsabilidade nacional e de interesse nacional, não é razoável impor por oito anos consecutivos sacrifícios adicionais a um determinado grupo de cidadãos, sem que tenham sido criadas alternativas que evitassem o prolongamento da medida após a cessação do PAEF. Neste contexto, a gravidade do sacrifício que se impõe nas normas questionadas sobrepõe-se ao fim que se pretende alcançar, em evidente desconformidade com o princípio da proibição do excesso. – Lino Rodrigues Ribeiro. DECLARAÇÃO DE VOTO Encontro-me vencido no que respeita à pronúncia de não inconstitucionalidade constante da alínea a) da decisão, pois entendo que as normas contidas nos artigos 2.º e 4.º do Decreto n.º 264/XII, as quais contêm o essencial do regime de reduções remuneratórias incidentes sobre um conjunto de trabalhadores, agentes e titulares de cargos públicos, que têm em comum auferirem rendimentos através de verbas públicas, para vigorarem pelo remanescente do ano de 2014 e pelos anos de 2015, 2016, 2017 e 2018 violam o prin- cípio da igualdade (artigo 13.º da Constituição) em todo o seu âmbito de aplicação temporal. Com efeito, e em linha com o que referi em declaração de voto junta ao Acórdão n.º 413/14 (tributário do entendimento constante dos Acórdãos n. os 396/11 e 187/13, de que me afastei), agora que se mostra ultra- passada a situação de emergência financeira – por natureza temporária e de curto prazo – que precedeu e con- duziu ao PAEF, e que também está no origem do incumprimento que conduziu ao Procedimento de Défice Excessivo em curso, considero que não existe justificação material válida para que se continue a diferenciar negativamente quem recebe por verbas públicas, atribuindo a esse grupo de pessoas uma posição sacrificial de primeira linha na prossecução do objetivo de redução do défice orçamental e, em geral, de equilíbrio das contas públicas, que a todos, enquanto comunidade, envolve, interessa e beneficia. Tal tarefa, como o esforço associado de redução da dívida pública, diz respeito à generalidade dos cidadãos, não existindo razões válidas para que seja feito recair com peso acrescido sobre os trabalhadores e agentes que recebem a sua remuneração por verbas públicas, por confronto com os demais trabalhadores e titulares de outros rendimentos. Nessa medida, a infração do princípio da igualdade que considero presente na medida de redução remuneratória constante do artigo 2.º do Decreto n.º 264/XII atinge toda a sua expressão sacrificial, pois considero-a, desde o ponto inicial do programa normativo que emana da articulação desse preceito com o mecanismo contido no artigo 4.º do diploma, desprovida de justificação material bastante. Esse juízo atinge naturalmente a aplicação da medida no período remanescente do corrente ano de 2014 e também, por maioria de razão, a cumulação da redução remuneratória nos quatro anos subsequentes – o que potencia o sacrifício –, independentemente do seu grau mais mitigado – 80% do valor inicial – no decurso do ano de 2015 e, potencialmente, nos anos subsequentes, até 2019.
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