TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 90.º Volume \ 2014
309 acórdão n.º 467/14 6. As implicações decorrentes do lugar que, segundo a CRP, a Lei das Finanças Regionais ocupa no sistema de articulação jurídico-financeira entre República e regiões são de outra índole, e resumem-se ao seguinte: ao contrário do que sucede em relação àquelas matérias que só os estatutos podem regular, com exclusão de quaisquer outras fontes – e vejam-se, por exemplo, as que estavam em causa nos casos dos Acór- dãos n. os 92/92, 657/95, 291/95, 162/99 e 128/05 –, na especial matéria que nos ocupa a norma estatutária não tem poder invalidante de norma que, constando da Lei das Finanças Regionais, disponha de modo diverso. Isto mesmo tem sido reafirmado pelo Tribunal (cfr. os já referidos os Acórdãos n. os 567/04, 11/07, 581/07, 238/08), em doutrina que, não obstante relativa a outros domínios das relações financeiras entre Estado e regiões que não aquele que especificamente está em causa no presente caso, não deixa, pelas razões expostas, de para ele valer. Como se disse no Acórdão n.º 238/08: (…) «De tudo o que anteriormente se expôs decorre a necessária conclusão de que, por força da repartição constitucional de competências, os parâmetros de validade jurídica das normas relativas às relações financeiras entre o Estado e as Regiões Autónomas se devem procurar na Constituição e não nos Estatutos Político-Administrativos das Regiões Autónomas. Assim, o Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma da Madeira não é, no que respeita às “relações financeiras entre o Estado e as Regiões Autónomas”, o referente de validade da Lei das Finanças das Regiões Autó- nomas. Pois, nos termos da Constituição, é a essa Lei, cuja aprovação e iniciativa competem em exclusividade à Assembleia da República, que cumpre regular as referidas relações financeiras. À Assembleia da República cabe, pois, concretizar, na Lei de Finanças da Regiões Autónomas, os termos exatos do princípio da autonomia financeira e do princípio da solidariedade nacional em matéria financeira; pode tam- bém definir a forma de cálculo das transferências orçamentais e, ainda, a possibilidade de prestação de garantias aos empréstimos contraídos pelas regiões autónomas. Pelo que deve, nesse plano, obediência à Constituição da República Portuguesa. Terá, nomeadamente, de respeitar a exigência da forma de lei orgânica, prescrita no artigo 166.º, n.º 2, e as demais normas e princípios constitucionais, incluindo o princípio da solidariedade nacional [decorrente do n.º 2 do artigo 225.º, da alínea j) do n.º 1 do artigo 227.º e do n.º 1 do artigo 229.º, n.º 1 da Constituição], cujo alcance foi discutido, em sede de fiscalização preventiva da constitucionalidade, no Acórdão n.º 11/07. Não está, contudo, a Assembleia da República impedida pelas normas do Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma da Madeira de regular, da forma que entender mais adequada, no quadro normativo dos precei- tos e princípios constitucionais, as matérias relativas às relações financeiras entre o Estado e as Regiões Autónomas. Nos termos da Constituição da República Portuguesa, essas relações financeiras entre o Estado e as Regiões Autónomas devem ser reguladas por uma lei de valor reforçado da Assembleia da República que possa ser modifi- cada por iniciativa parlamentar, ou seja, pela lei orgânica que define o regime das finanças das regiões autónomas [artigos 229.º, n.º 3, 164.º, alínea t) , e 166.º, n.º 2]. Ora, assentando o presente pedido de declaração de ilegalidade de normas da Lei das Finanças Regionais no valor supralegislativo dos Estatutos Político-Administrativos da Regiões Autónomas e no caráter de subordina- ção da Lei das Finanças das Regiões Autónomas a esses Estatutos, prejudicado fica, desde logo, o conhecimento das concretas questões de ilegalidade que vêm suscitadas. Essa apreciação apenas se justificaria se pudesse concluir-se pela superioridade paramétrica dos Estatutos Regio- nais relativamente à Lei de Finanças das Regiões Autónomas, caso em que se tornava ainda necessário verificar se existia uma efetiva contrariedade, conforme vem alegado, entre as impugnadas normas desta Lei e as disposições do Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma da Madeira. Não existindo, no entanto, essa alegada primazia normativa, o pedido terá necessariamente de improceder».
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