TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 90.º Volume \ 2014

301 acórdão n.º 466/14 27.º Porém, nos termos da Constituição, só a lei (formal) pode dispor “sobre os deveres, responsabilidade e incom- patibilidades dos titulares de cargos políticos” e sobre “as consequências do respetivo incumprimento” (CRP, artigo 117.º, n.º 1 e, ainda, sobre os limites à renovação sucessiva de mandatos, artigo 118.º, n.º 2). 28.º Acresce, finalmente, concorrendo no sentido desta ser matéria de reserva de lei formal, que é, também, da exclusiva competência da Assembleia da República legislar sobre o “estatuto dos titulares dos órgãos de soberania e do poder local” [(artigo 164.º, alínea m) ]. 29.º Sendo certo, por uma parte, que, não raro frequentemente, os titulares de “cargos políticos” o são igualmente de “órgãos de soberania” e, por outra parte, que os titulares dos “órgãos do poder local” são, invariavelmente, “titulares de cargos políticos”. 30.º Aliás, em anotação ao artigo 164.º (Reserva absoluta de competência legislativa), alínea m) , da lei constitucio- nal, nota a melhor doutrina que “o âmbito da matéria da alínea m) – estatuto dos titulares de órgãos de soberania e do poder local bem como os restantes órgãos constitucionais ou eleitos por sufrágio direto ou universal – surge claramente delimitado por referência aos artigos 110.º e 117.º. Trata-se, entre outras coisas, de definir o regime de responsabilidade de cargos aí mencionados (…)” [Gomes Canotilho/Vital Moreira, Constituição de República Portuguesa, Anotada, vol. II, 4.ª edição, revista, 314 (n.º XVIII) (Coimbra: Coimbra Editora, 2010)], sufragando assim a tese segundo a qual a reserva de lei do artigo 164.º, alínea m) , está referida e abrange a matéria atinente ao estatuto dos titulares de cargos políticos, no sentido do artigo 117.º, n.º 1, da Constituição. 31.º Por conseguinte, e em conclusão, o Governo, através de definição legal de “dirigentes” contida no artigo 3.º, alínea a) , na dimensão que respeita a todos “aqueles que se encontram investidos em cargos políticos”, que é um preceito legal integrado no Decreto-Lei n.º 127/2012, cit., veio dispor inovatoriamente sobre a matéria atinente e integrada na reserva (absoluta) de competência da Assembleia da República [CRP, artigo 117.º, n.º 1, e ainda, artigos 110.º, n.º 1, 118.º, n.º 2 e 164.º, alínea m) ]. 32.º Termos em que, a norma jurídica constante do artigo 3.º, alínea a) , do Decreto-Lei n.º 127/2012, cit., na parte respeitante à expressão “Para efeitos de aplicação da LCPA, entende-se por: a) «Dirigentes», aqueles que se encon- tram investidos em cargos políticos”, infringe as citadas disposições constitucionais em matéria de reserva de lei (formal) e, por conseguinte, é organicamente inconstitucional (CRP, artigo 277.º, n.º 1), a qual deve ser declarada para valer, com força obrigatória geral, nos termos constitucionais (artigo 282.º, n.º 1).» 3. Notificado, nos termos e para os efeitos dos artigos 54.º e 55.º, n.º 3, da Lei do Tribunal Constitu- cional, o Primeiro-Ministro veio oferecer o merecimento dos autos, adiantando, porém, que, no âmbito da discussão na especialidade da Proposta de Lei n.º 102/XII (que procede à segunda alteração à Lei do Orça- mento do Estado para 2012, aprovada pela Lei n.º 64-B/2011, de 30 de dezembro), haviam já sido apre- sentadas alterações aos artigos 5.º da Lei n.º 8/2012, de 21 de fevereiro, e 3.º do Decreto-Lei n.º 127/2012, de 21 de junho, que modificariam a norma objeto de fiscalização. O autor da norma juntou ainda aos autos documentos relativos aos trabalhos parlamentares.

RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=