TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 90.º Volume \ 2014
271 acórdão n.º 465/14 164.º Ora, o artigo 51.º da LBAFD dispõe, sobre o tópico da respetiva regulamentação, que “A presente lei, nas matérias que não sejam reserva da Assembleia da República, deve ser objeto de regulamentação, por decreto-lei, no prazo de 180 dias.” 165.º A Assembleia da República entendeu, portanto, reservar ao Governo a competência para regulamentar a lei em causa. Ora, como é sabido e já ficou referido supra, a alínea d) do artigo 227.º da Constituição confere às regiões autónomas competência para regulamentarem (i) a legislação regional e (ii) as leis emanadas dos órgãos de soberania que não reservem para estes o poder regulamentar. 166.º Quais são, então, as consequências que decorrem da LBAFD em termos de competências legislativas e regulamentares dos órgãos de soberania e dos órgãos regionais em matéria de desporto e atividade física? 167.º Em primeiro lugar, que devem ser adotadas medidas que permitam corrigir os desequilíbrios resultantes da insularidade e do afastamento, por forma a garantir a participação dos praticantes e dos clubes das Regiões Autónomas nas competições desportivas de âmbito nacional. 168.º Em segundo lugar, no que toca à matéria dos apoios públicos à prática desportiva, que incumbe à Admi- nistração Pública na área do desporto apoiar e desenvolver a prática desportiva regular e de alto rendimento, através da disponibilização de meios técnicos, humanos e financeiros. Como é matéria que é deixada para regulamentação posterior. 169.º Em terceiro lugar, que a competência para regulamentar a referida lei de bases é exclusivamente do Governo, dela se excluindo os órgãos regionais. 170.º Resulta, portanto, do quadro traçado pela LBAFD que devem ser realizadas ações positivas na área do desporto no sentido de promover a respetiva prática em todo o país e, em especial. a garantir a participação dos praticantes e dos clubes das Regiões Autónomas nas competições desportivas de âmbito nacional. 171.º Resulta ainda da referida lei de bases que a forma como esse apoio à prática desportiva deve ocorrer é matéria que cabe ao Governo regulamentar. 172.º Em conclusão, de acordo com a LBAFD, não cabia à Assembleia Legislativa da Região Autónoma da Madeira regulamentar a matéria do financiamento a atletas e equipas desportivas com vista à sua participação em competições desportivas nacionais; cabia, isso sim, ao Governo. 173.º A propósito da capacidade dos órgãos de soberania para limitar a competência regulamentar dos órgãos regionais, entende Pedro Machete que “a decisão do legislador da República de reservar, ou não, a regulamentação das «leis (…)» que emana situa-se na respetiva liberdade de conformação e, embora se deva orientar em conformi- dade com a concordância prática entre os princípios da unidade e da autonomia, não é em concreto jurisdicional- mente sindicável” (in A obrigatoriedade de executar a legislação nacional , p. 137). 174.º Jorge Miranda e Rui Medeiros defendem, todavia, a posição contrária, entendendo que “(…) após 2004, eliminado o limite das leis gerais da República, deve entender-se que os órgãos de soberania apenas podem reservar para si a faculdade de regulamentar leis que se integrem no âmbito da reserva dos órgãos de soberania ou que não versem sobre matérias enunciadas nos estatutos com matérias sobre as quais as Assembleias Legislativas podem legislar.” (cfr. Constituição, Tomo III, p. 311). 175.º É questionável, no entanto, que assim seja. Com efeito, mesmo em matérias relativamente às quais as assembleias legislativas das regiões autónomas podem legislar – uma lista consideravelmente ampla, que abrange diversos domínios da normação pública – pode haver casos em que os órgãos de soberania, atendendo, por exem- plo, ao princípio da unidade do Estado ou ao princípio da solidariedade, queiram reservar para si a competência regulamentar, o que lhes permitirá criar uma regulamentação uniforme para todo o território nacional. 176.º Com efeito, mesmo após a revisão constitucional de 2004, os princípios da unidade do Estado e do res- peito pela integridade da soberania do Estado constituem limites genéricos à autonomia político – administrativa das regiões autónomas, 177.º Ao mesmo tempo que, tal como o Tribunal Constitucional vem entendendo, o limite do âmbito regional hoje consagrado na Constituição como um dos pressupostos do poder legislativo regional (e, portanto, necessa- riamente, do poder regulamentar) para além da inegável dimensão territorial, deve ser visto como sucedâneo do
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