TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 90.º Volume \ 2014
266 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 110.º Portanto, em matéria concorrencial, quando a Assembleia Legislativa de uma região autónoma se limita a desenvolver, em matérias não estatutárias, uma lei ou um decreto-lei de bases, os respetivos diplomas regionais de desenvolvimento estão subordinados aos correspondentes diplomas de bases. 111.º Por outro lado, em matéria concorrencial, as Assembleias Legislativas das Regiões Autónomas podem sempre, por decreto legislativo regional aprovado, não já ao abrigo da alínea c) do n.º 1 do artigo 227.º, mas sim com base na competência legislativa primária consagrada na alínea a) do n.º 1 do mesmo artigo, e desde que com observância dos limites a essa competência, contrariar as leis ou decretos-leis de bases em matéria concorrencial (cfr., próximo, P. Machete, Elementos , p. 129, que defende que, “ainda que se verifique uma qualquer desconfor- midade entre o decreto legislativo regional de desenvolvimento e a correspondente lei de bases [em matérias não reservadas à Assembleia da República], não parece que haja aí mais do que uma simples irregularidade sem conse- quências para a vigência do ato normativo regional”, uma vez que as regiões autónomas sempre poderiam exercer a sua competência legislativa primária). 112.º Por fim, em matéria de competências delegadas, através da VI revisão constitucional, as Assembleias Legislativas das regiões autónomas passaram a poder legislar, nos termos do disposto no artigo 227.º, n.º 1, alínea b) , da Constituição, quando e na medida em que para tanto sejam autorizadas, em algumas das matérias da reserva relativa de competência da Assembleia da República. Recorde-se que, no quadro da versão anterior da Consti- tuição, a “especificidade constitutiva” das autorizações legislativas regionais (na expressão de Gomes Canotilho, Direito constitucional e Teoria da Constituição , Almedina, reimpressão da 7.ª edição de 2003, p. 813) – enqua- drando-se no contexto da prevalência do direito estadual –, consistia na atribuição, às Assembleias Legislativas, da faculdade de afastarem os princípios fundamentais das leis gerais da República em matérias não reservadas (e não em conceder-lhes a possibilidade de legislarem em matéria reservada). 113.º Traçado o quadro da repartição vertical de competências, importa agora atender ao quadro de repartição horizontal de competências. Recorde-se, a este respeito, que a separação horizontal de poderes tem em vista um critério de repartição de competências entre os órgãos de soberania e os órgãos da região autónoma de acordo com as matérias que estejam em causa, sendo equacionáveis três critérios (cfr., por todos, C. Blanco de Morais, A autonomia legislativa, pp. 266-267): (i) Um sistema de lista única estadual, em que a Constituição apenas identifica as competências do Estado, pertencendo as restantes aos entes menores; (ii) Um sistema de lista plural, em que a Constituição discrimina, pelo menos, as matérias em que é compe- tente o Estado e aqueloutras em que são competentes os entes menores; (iii) Um sistema de lista regional, em que a Constituição especifica apenas as matérias da competência dos entes menores, permanecendo as restantes na titularidade do Estado. 114.º Até 2004, a Constituição previa um sistema de lista plural, em que à lista estadual se juntavam duas listas regionais (uma constante da Constituição e outra dos Estatutos regionais). Com a VI revisão constitucional, man- teve-se o sistema de lista plural, mas com uma diferença: a lista regional foi desconstitucionalizada e expressamente remetida para os Estatutos (cfr. C. Blanco de Morais, A autonomia legislativa, pp. 423 segs., M. Lúcia Amaral, A forma da República – Uma Introdução ao Estudo do Direito Constitucional , Coimbra, 2012, p. 376). 115.º A este propósito, é significativa a alteração introduzida pela revisão constitucional de 2004 ao eliminar o conceito de “interesse específico” como limite positivo para o exercício do poder legislativo regional na medida em que, ao fazê-lo, se eliminou um dos mais fortes argumentos a favor de uma reserva de competência legislativa regional, inacessível aos órgãos de soberania (sobre aquela, cfr. J. M. de Albuquerque Calheiros / R. Medeiros, “As regiões autónomas e a aplicação das diretivas comunitárias”, in Direito e Justiça, 1993, pp. 881 segs.). 116.º Também a eliminação da necessidade de obediência aos “princípios fundamentais” das “leis gerais da República comporta uma significativa alteração em matéria de repartição horizontal de competências na medida em que afasta uma das condicionantes à capacidade legislativa das assembleias legislativas das regiões autónomas. 117.º Outra das alterações trazidas pela VI revisão constitucional com repercussões ao nível da distribuição horizontal de competências foi a devolução, às Regiões Autónomas, da competência para transporem diretivas
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