TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 90.º Volume \ 2014

265 acórdão n.º 465/14 invocados, deve ser analisada a questão da competência pública em matéria de atribuição de financiamento aos clubes desportivos para as deslocações inerentes às competições em que os mesmos participem. 72.º Por outras palavras: o juízo de inconstitucionalidade que se formula relativamente à norma prevista no artigo 4.º do Despacho normativo n.º 1/2013 face aos deveres do Estado e dos órgãos de soberania decorrentes dos artigos 6.º, n.º 1, 9.º, alínea h) , 81.º, alíneas d) e e) , 90.º, 225.º, n.º 2 e 229.º, n.º 1 da Constituição parte necessariamente do pressuposto de que, de acordo com o quadro normativo de repartição de competências entre o Estado e as Regiões Autónomas, cabia àquele, ou também àquele, a competência para regular esta matéria. 73.º É, pois, esse pressuposto inicial que de seguida se começa a edificar. C1) o quadro constitucional de repartição de competências entre o estado e as regiões autónomas. Evolução e quadro atual. 74.º A Constituição consagrou, logo na sua redação inicial, a existência de um poder legislativo próprio das Regiões Autónomas que lhes permitia “legislar, com respeito da Constituição e das leis gerais da República, em matérias de interesse específico para as regiões que não estejam reservadas à competência própria dos órgãos de soberania”, “regulamentar a legislação regional e as leis emanadas dos órgãos de soberania que não reservam para estes o respetivo poder regulamentar” e “exercer iniciativa legislativa, mediante a apresentação de propostas de lei à Assembleia da República”. [cfr. a redação originária do texto da Constituição de 1976, in As Constituições Portu- guesas – de 1822 ao Texto Atual da Constituição , Jorge Miranda (org.), 4.ª edição, Livraria Petrony, Lda.]. 75.º As sucessivas revisões ao texto constitucional produziram alterações significativas no equilíbrio de poderes, nomeadamente legislativos, entre os órgãos das regiões autónomas e os órgãos de soberania, as quais têm vindo a apurar o quadro de repartição de competências inicialmente traçado pelo legislador constituinte. (…) 105.º Em matéria de competências complementares, a revisão constitucional de 2004 aumentou a competên- cia legislativa complementar das Regiões Autónomas, podendo as Assembleias Legislativas passar a poder desen- volver, para o âmbito regional, os princípios ou as bases gerais dos regimes jurídicos contidos em leis que a eles se circunscrevam, sem as limitações anteriormente previstas na alínea correspondente – concorrendo com o Governo – e sem que tivessem de o fazer em função do respetivo “interesse específico” (neste sentido, cfr. Jorge Miranda e Rui Medeiros, Constituição, Tomo II, anotação ao artigo 112.º, pp. 264-269). 106.º A esse propósito, importa determinar o quadro das relações entre leis de bases, diplomas estaduais de desenvolvimento das mesmas e decretos legislativos regionais complementares. 107.º Em primeiro lugar, assinalar que não está excluído que os decretos legislativos regionais possam desen- volver não só leis de bases existentes em matérias concorrenciais, mas também decretos-leis de bases. Na verdade, no contexto das relações entre órgãos de soberania e parlamentos regionais, pode entender-se que a expressão empregue no artigo 227.º, n.º 1, alínea c) , da Constituição (“lei”) engloba lei e decreto-lei (sobre a matéria, cfr. P. Otero, O desenvolvimento de leis de bases pelo Governo, Lex , 1997, passim; C. Blanco de Morais, As leis reforçadas pelo procedimento no âmbito dos critérios estruturantes das relações entre atos legislativos, Coimbra, 1998, pp. 302- 306;]. Miranda, Manual , V, pp. 379 segs.; J. Miranada/R. Medeiros, Constituição , II, anotação ao artigo 198.º, pp. 698 segs.). 108.º Outro aspeto prende-se com a identificação da natureza das relações entre as leis e, ou, os decretos-leis de bases a desenvolver, e os decretos legislativos regionais de desenvolvimento. Neste contexto, há que distinguir: (i) as matérias da competência legislativa parlamentar reservada; e, (ii) as matérias da área concorrencial. 109.º Assim, perante leis de bases da Assembleia da República em matérias reservadas (quando se trate de uma reserva de “densificação parcial”, na expressão de Gomes Canotilho/Vital Moreira, – cfr. Constituição, Vol. II, anotação ao artigo 165.º), parece ser incontroverso que os decretos legislativos regionais que as desenvolvam as devem respeitar. Trata-se, simultaneamente, de uma consequência de se tratar de matéria da reserva dos órgãos de soberania e do caráter reforçado daqueles diplomas (cfr. artigo 112.º, n.º 3, da Constituição. Sobre este aspeto, cfr. C. Blanco de Morais, As leis reforçadas, p. 651).

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