TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 90.º Volume \ 2014

261 acórdão n.º 465/14 39.º Impõe, portanto, ao Estado, uma atuação que seja criadora de condições para que todos os portugueses, sem distinção, tenham acesso às mesmas oportunidades em termos económicos, sociais e culturais. 40.º Conforme frisam Jorge Miranda e Rui Medeiros a propósito da norma em causa “fazer da igualdade um valor real e efetivo é com efeito uma tarefa do Estado, que lhe permite tratamentos diferenciados em ordem a «asse- gurar a igualdade de oportunidades e a operar as necessárias correções das desigualdades na distribuição da riqueza e do rendimento» [artigo 81.º, alínea b) ], privilegiando «as pessoas mais desfavorecidas» [artigo 81.º, alínea a) ], orientando o desenvolvimento económico e social no sentido da «coesão económica e social de todo o território nacional, eliminando progressivamente as diferenças económicas e sociais entre a cidade e o campo e entre o litoral e o interior» [artigo 81.º, alínea d) ] e promovendo «a correção das desigualdades derivadas da insularidade das regiões autónomas» [artigo 81.º, alínea e) ].” (cfr. Jorge Miranda e Rui Medeiros, Constituição Portuguesa Anotada, Tomo II, Coimbra, 2006, p. 19). 41.º Os autores incluem estas incumbências na tarefa de promoção da igualdade de oportunidades, atribuída ao Estado pela Constituição, salientando que “o Estado Social de direito interpretado pela Constituição Portuguesa adota, de uma forma nítida, aquele segundo princípio da justiça que, em J. Rawls, exige do Estado a proteção dos menos favorecidos de modo a assegurar uma justa igualdade de oportunidades. O princípio da igualdade foi proclamado como valor inerente ao Estado de direito e surgiu como arma jurídica na luta contra os privilégios estamentais do Estado absoluto. O Estado de direito é um Estado de leis e, sendo a lei, por definição, norma geral e abstrata, obriga e protege de igual forma todos os cidadãos. A eficácia deste entendimento da igualdade (formal) foi inegável e continua a ser hoje uma das traves mestras da cultura pública democrática, encarnando o primeiro princípio da justiça de J. Rawls, qual seja, o sistema de iguais direitos-liberdades de todos. Proclamar a igualdade de direitos e deveres é, porém, insuficiente quando nem todos os cidadãos possuem os mesmos meios e condições para exercer esses direitos ou para suportar esses deveres. Começa assim a perspetivar-se a necessidade de considerar uma outra dimensão da igualdade, a igualdade material ou substancial, que atenda às condições objetivas da igualdade da oportunidades e de custos.” (cfr. Jorge Miranda e Rui Medeiros, Constituição, Tomo II, pp. 18-19). 42.º Neste sentido, pode dizer-se que o princípio do Estado de direito unitário e, nomeadamente, as suas implicações em termos de coesão económica e social de todo o território, são uma derivação ou consequência do princípio da igualdade, consagrado no artigo 13.º da Constituição. Com efeito, é porque todos os cidadãos têm a mesma dignidade social que o Estado deve assumir como tarefa garantir que todos têm acesso às mesmas oportu- nidades criando condições para a verificação da necessária coesão económica e social. 43.º Por outro lado, “o desenvolvimento harmonioso de todo o território nacional”, que deve ser promovido pelo Estado “tendo em conta, designadamente, o caráter ultraperiférico dos arquipélagos dos Açores e da Madeira” [artigo 9.º, alínea g) ] é um objetivo decorrente da necessidade, constitucionalmente consagrada, de o Estado asse- gurar a coesão económica e social do País. Deste modo, e conforme salientam Gomes Canotilho e Vital Moreira, “a Constituição (LC n.º 1/97) pretendeu que a «tomada em conta» dos condicionalismos das regiões ultraperiféricas fosse não apenas uma imposição comunitária ou europeia eventualmente cumprida em termos dos tratados euro- peus, mas também que constituísse uma norma-tarefa sediada na Constituição e impositiva do estabelecimento de medidas específicas tendentes a assegurar o desenvolvimento harmonioso dessas regiões.” (cfr. Constituição, Vol. I, p. 281). 44.º Resulta, por conseguinte, do conjunto composto pelas normas consagradas na alínea g) do artigo 9.º da Constituição – (i) promover o desenvolvimento harmonioso de todo o território nacional” e (ii) tomar em conta, nessa promoção, o caráter ultraperiférico dos arquipélagos dos Açores e da Madeira, a atribuição de tarefas positivas ao Estado português, às quais se aludiu supra, tendentes a repor a igualdade de oportunidades entre o continente e as ilhas e, necessariamente, entre os habitantes do continente e os habitantes das ilhas. 45.º É, pois, a própria Constituição que toma posição a favor da necessidade de serem adotadas medidas que, sem prejuízo da autonomia reconhecida às regiões autónomas, lhes permitam desenvolver-se em condições de tendencial igualdade face ao continente.

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