TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 90.º Volume \ 2014

260 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL representado pela necessidade de custear viagens especialmente dispendiosas, porquanto envolvem necessaria- mente o uso de meios de transporte tendencialmente mais caros que os terrestres, como o avião ou o barco. 31.º Ora, fácil é compreender que os atletas e as equipas desportivas das regiões autónomas sofrem os mesmos constrangimentos financeiros que os atletas e as equipas desportivas do continente sofreriam se não tivessem o apoio que o Estado decidiu atribuir-lhes. Aliás, arrisca-se até dizer que o esforço financeiro destes últimos será superior na medida em que a maior parte dos eventos desportivos deverá ter lugar no continente e não nas ilhas… 32.º Do exposto decorre, portanto, que o pedido de declaração da ilegalidade contido no presente requeri- mento se fundamenta, entre outros argumentos, na violação do princípio da continuidade territorial ínsito no artigo 10.º do EPARAM, circunstância que concorre, juntamente com o já descrito fundamento relativo à incons- titucionalidade por violação dos “direitos das regiões”, para a legitimidade da Requerente. II. Dos fundamentos da inconstitucionalidade da norma prevista no artigo 4.º do despacho normativo n.º 1/2013 A) Os parâmetros constitucionais violados 33.º A fundamentação avançada na parte inicial deste requerimento permite já antecipar quais os parâmetros constitucionais que se consideram violados pela norma contida no artigo 4.º do Despacho normativo n.º 1/2013. 34.º Em primeiro lugar, o princípio do Estado de direito unitário, previsto no artigo 6.º da Constituição, que apresenta a seguinte redação: “1. O Estado é unitário e respeita na sua organização e funcionamento o regime autonómico insular e os princípios da subsidiariedade, da autonomia das autarquias locais e da descentralização democrática da admi- nistração pública. 2. Os arquipélagos dos Açores e da Madeira constituem regiões autónomas dotadas de estatutos político- -administrativos e de órgãos de governo próprio.” 35.º Conforme salientam Gomes Canotilho e Vital Moreira, “do caráter unitário do Estado resulta ainda a imediaticidade das relações jurídicas entre o poder central e os cidadãos, não podendo existir «corpos intermediá- rios» impeditivos das relações diretas entre o Estado e os cidadãos.” E, mais à frente, “as regiões autónomas consti- tuem uma das grandes inovações da CRP (embora com precedentes nacionais e estrangeiros). A sua existência não põe em causa a unidade do Estado, nem a sua autonomia pode alargar-se de modo a afetá-la (vide artigo 225.º-3). O n.º 2 não constitui uma exceção ao n.º 1.” (cfr. Constituição da República Portuguesa Anotada, Vol. I, Coimbra, 4.ª edição revista, 2007, pp. 233-235). 36.º Neste sentido, o n.º 2 do artigo 225.º da Constituição vem também fazer referência, no contexto dos objetivos da autonomia regional, ao “reforço da unidade nacional e dos laços de solidariedade entre todos os portu- gueses” – uma referência da qual resulta, sem qualquer dúvida, que a autonomia político-administrativa atribuída pela Constituição às regiões autónomas se conforma num quadro de “regionalismo cooperativo” (neste sentido, cfr. Jorge Miranda e Rui Medeiros, Constituição Portuguesa Anotada , Tomo III, Coimbra, 2007, p. 277). 37.º A autonomia regional exerce-se, pois, no contexto de um Estado unitário e que se pretende uno e coeso. A Constituição dá sucessivas indicações dessa perspetiva, salientando “a igualdade real entre todos os portugueses” [artigo 9.º, alínea d) ], “o desenvolvimento harmonioso de todo o território nacional”, que deve ser promovido pelo Estado “tendo em conta, designadamente, o caráter ultraperiférico dos arquipélagos dos Açores e da Madeira” [artigo 9.º, alínea g) ]; a “coesão económica e social de todo o território nacional” [artigo 81.º, alínea d) ]; o “cresci- mento equilibrado de todos os setores e regiões” [artigo 81.º, alínea d) ]; a “correção das desigualdades derivadas da insularidade das regiões autónomas” [artigo 81.º, alínea e) ]; e “o desenvolvimento integrado de setores e regiões” (artigo 90.º). 38.º A igualdade real entre todos os portugueses é um dos objetivos do Estado social a que alude a alínea d) do artigo 9.º da Constituição, através do qual se realiza a democracia económica, social e cultural a que se refere o artigo 2.º da Constituição.

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