TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 90.º Volume \ 2014
243 acórdão n.º 413/14 2. Discordo da fixação de efeitos ex nunc da declaração de inconstitucionalidade das normas do mesmo artigo 33.º da Lei n.º 83-C/2013, de 31 de dezembro, pois entendo que, no quarto ano de aplicação de reduções remuneratórias de quem aufere por verbas públicas, e perante condicionalidades externas qualita- tivamente distintas daquelas presentes em anteriores decisões do Tribunal Constitucional, não se verificam para tal razões de excecional relevo, como exige o n.º 4 do artigo 282.º da Constituição. 3. Também não acompanho a posição que encontrou vencimento na alínea c) da decisão, quanto ao juízo de inconstitucionalidade das normas do artigo 117.º da Lei n.º 83-C/2013, de 31 de dezembro (pen- sões de sobrevivência). Atuando a norma no interior do sistema de segurança social, como restrição da cumulação de pensões, a medida em apreço traduz a ponderação do legislador democrático, contida na sua margem de determinação, de que a intervenção reconfiguradora inserida numa estratégia de contenção da despesa pública com prestações sociais deveria incidir primacialmente sobre a parcela correspondente à com- pensação da perda de rendimentos do trabalho com a morte do beneficiário, tida como resposta previdencial suplementar ou de acréscimo – e por isso a componente mais dúctil em face de pressão insustentável sobre o sistema de pensões –, sempre que coexista com outros rendimentos de pensões. Enquanto medida relativa ao sistema de pensões, dirigida à sustentabilidade do sistema de segurança social e em particular à sustentabilidade do sistema de pensões, obedecendo a um princípio de equidade intergeracional, não se vê que a sua coerência e racionalidade fique colocada em crise quando não conside- rada a integralidade dos rendimentos do sujeito. Não se trata aqui de aferir da capacidade contributiva do sujeito, mas da sua posição como beneficiário do sistema de pensões, o que permite compreender, ao que me parece, a diferenciação entre quem aufere uma pensão, sendo essa a única prestação do sistema de segurança social de que beneficia – o que corres- ponderá as mais das vezes a cônjuges ou unidos de facto que nunca exerceram atividade laboral remunerada, contribuindo em dedicação exclusiva para a vida familiar e dependendo economicamente por inteiro dos rendimentos do trabalho do beneficiário falecido –, e aqueles que, fruto da atuação concomitante de dife- rentes situações de facto ou relações de vida geradoras de proteção, beneficiam de mais do que uma pensão, presumindo então o legislador que a dependência em vida do beneficiário que subjaz à atribuição de pensão de sobrevivência não era completa e, desse jeito, a perda de rendimentos a compensar seria menos acentuada. Note-se que o direito à pensão de sobrevivência relativamente a titulares que não sejam os cônjuges e mem- bros de união de facto ou os filhos menores já depende da demonstração de uma situação de dependência económica em relação ao beneficiário falecido, sendo o impacto da solução de redução ou recálculo mais mitigado do que aconteceria com a limitação das condições da atribuição da pensão de sobrevivência. É certo que, tomando o universo dos cônjuges ou membros sobrevivos de união de facto que percebam várias pensões, entre as quais uma pensão de sobrevivência, a concreta modelação da medida suscita inter- rogações de resposta duvidosa. Mas, em todos os quadros aplicativos, denota-se que os níveis de redução são tanto maiores quanto o peso relativo que a pensão de sobrevivência assume no valor acumulado, o que encontra relação com a distinta natureza das pensões em pagamento e o diferente lastro contributivo espe- cífico que a cada uma corresponde, sendo mais elevado no que respeita à pensão de aposentação ou reforma (sobre a evolução do esforço contributivo relativo às pensões de sobrevivência, cfr. João Carlos Loureiro, Sobre a Chamada Convergência das Pensões: O caso das Pensões de Sobrevivência, Coimbra, 2013, pp. 11 a 14). Ou seja, na concretização da medida de redução e recálculo, não se atendeu apenas ao valor global das pen- sões em pagamento, mas também à natureza da prestação e ao que cada uma significa em termos do esforço contributivo autónomo associado à proteção da eventualidade morte e do seu impacto nos cônjuges e unidos de facto sobrevivos, de acordo com o princípio da contributividade. Essa ponderação confere, ao que me parece, fundamento razoável e bastante ao tratamento diferenciado no (re)cálculo ou redução de pensões de sobrevivência, também no plano da igualdade interna.
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