TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 90.º Volume \ 2014

241 acórdão n.º 413/14 que a maior parte destas pensões de sobrevivência serão, porventura, atribuídas a mulheres que se dedicaram à família e nunca trabalharam. Tudo visto e ponderado, pronuncio-me no sentido de que a norma do artigo 117.º da Lei n.º 83-C/2013, de 31 de dezembro, não é inconstitucional. B) Quanto à alínea d) da decisão Votei a decisão da alínea d) , relativa ao artigo 75.º da Lei n.º 83-C/2013, de 31 de dezembro, essen- cialmente, porque considero que o primeiro teste da confiança não está preenchido. Ainda que se pudesse admitir, numa visão menos formalista do conceito de Estado, que, no caso das empresas públicas em que o Estado detém uma influência dominante, nos termos do artigo 9.º, n.º 1, alíneas a) a d), do Decreto-lei n.º 133/2013, de 3 de outubro, se poderia equacionar a hipótese da eventual violação do princípio da con- fiança. Porém, estendendo-se o âmbito de aplicação da norma do artigo 75.º da Lei n.º 83-C/2013, de 31 de dezembro, a todo o sector público empresarial, o qual abrange empresas em que o Estado detém influên- cia dominante na decisão empresarial, a par de outras, em que não a detém, para se chegar a uma eventual inconstitucionalidade teria de se proceder à segmentação da norma. Ora, a aceitação da inconstitucionalidade parcial pressupõe a cindibilidade da norma, o que me parece de difícil realização neste caso. Com efeito, o estabelecimento claro e inequívoco de uma fronteira entre a parte da norma que, eventualmente, poderia estar ferida de inconstitucionalidade e aquela que, sem quais- quer dúvidas, se afigura conforme à Constituição é extremamente difícil. Aliás, o Tribunal nem sequer dis- põe de informação suficiente para levar a cabo esta tarefa. Acrescente-se que num processo, como o presente, que se integra na fiscalização abstracta sucessiva de uma norma legal (ou melhor dito, orçamental já em execução), o princípio da presunção da conformidade constitucional das normas legais, impõe-se particu- larmente, pelo que o juiz constitucional, na dúvida, não deve declarar a inconstitucionalidade da norma ou de parte dela. Considero, pois, que só se poderia admitir a inconstitucionalidade parcial da norma se ela se afigurasse claramente cindível, o que não sucede. – Ana Guerra Martins. DECLARAÇÃO DE VOTO Não pude acompanhar as deliberações do Tribunal relativas (a) à não inconstitucionalidade da abolição dos complementos de pensões pagos por empresas do sector público empresarial (SPE), determinada pelo artigo 75.º, (b) à inconstitucionalidade da redução das pensões de sobrevivência, determinada pelo artigo 117.º, e (c) à restrição de efeitos ex nunc da declaração de inconstitucionalidade do artigo 33.º, todos do Orçamento do Estado para 2014. I – Tenho por excessivamente formalista a consideração da autonomia jurídica das empresas do SPE, que sustentou, no essencial, a deliberação do Tribunal relativa à não inconstitucionalidade da abolição dos complementos de pensões pagos por empresas do sector público empresarial (SPE). Entendo que, por um lado, é real e quase sempre determinante a influência do Governo nas empresas do sector empresarial do Estado (que constitui a parte mais significativa do SPE), nomeadamente naquelas – como o Metropoli- tano de Lisboa e a Carris – que o Governo sempre refere quando trata de enfatizar dificuldades económi- cas, como fez na documentação que enviou ao Tribunal (e nas quais o Estado é accionista único). O Governo não só nomeia (e exonera) as administrações, como, através dos membros do Governo que exercem os poderes que a lei confere ao Estado na qualidade de accionista de tais empresas, condiciona fortemente a gestão empresarial. Esta circunstância torna, a meu ver, insuficiente o argumento da autonomia jurídica, para sustentar que o Governo nada teve a ver com as decisões gestionárias deter- minantes do pagamento dos complementos das pensões, de que resultaria a falta de fundamento para o investimento de confiança.

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