TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 90.º Volume \ 2014
227 acórdão n.º 413/14 Sublinhe-se que a construção da norma foi uma opção do legislador – concentrou numa só norma a redução remuneratória, sem distinguir segmentos – e é esta opção legislativa que determina que a decisão de inconstitucionalidade recaia sobre a norma assim concebida. 5. Relembre-se, por outro lado, que, quando o Tribunal, em 2013 (Acórdão n.º 187/13), declarou a inconstitucionalidade da suspensão total ou parcialmente do pagamento do subsídio de férias ou equivalente – estando em causa uma medida que atingia dois grupos de destinatários (pensionistas e trabalhadores que auferem por verbas públicas), e não, como agora, apenas os trabalhadores no ativo, o Tribunal não decidiu no sentido da limitação temporal de efeitos, deixando a norma de vigorar desde o início da sua vigência. 6. Acrescente-se que defender a produção de efeitos regra da decisão de inconstitucionalidade é, aliás, o que mais sentido fará para aqueles que consideraram, anteriormente, a inconstitucionalidade das reduções remuneratórias. Quem entendeu já, quanto ao OE 2013, que era inconstitucional proceder a reduções remuneratórias (entendendo, assim, que em 2013 não deveriam já ter vigorado), sustentará, em coerência, por maioria de razão, que as reduções (que já não deveriam ter vigorado e que são agora mais gravosas) não possam, em 2014, produzir efeitos até à data da presente decisão do Tribunal. 7. Entendo, por fim, que este Tribunal não pode, reiteradamente, e incoerentemente, afastar os efeitos regra, permitindo, sistematicamente, e ao contrário daquela que é a solução constitucional normal, que nor- mas inconstitucionais produzam efeitos. – Catarina Sarmento e Castro. DECLARAÇÃO DE VOTO 1. Votei vencido quanto à declaração de não inconstitucionalidade das normas constantes do artigo 75.º da Lei n.º 83-C/2013, de 31 de dezembro, que suspenderam o pagamento de complementos de pensões nas empresas do setor público empresarial que tenham apresentado resultados líquidos negativos nos três últimos exercícios, por entender que tal medida viola o direito à contratação coletiva estabelecido no artigo 56.º, n.º 3, da Constituição, e o princípio da proteção da confiança inerente ao modelo do Estado de direito democrático, consagrado no artigo 2.º da Constituição. O referido artigo 75.º determina a suspensão de normas constantes de instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho que se encontram em vigor, impondo uma ineficácia temporária destas normas, cuja ces- sação fica condicionada à ocorrência de um determinado facto futuro – três anos consecutivos de resultados líquidos positivos nas empresas afetadas. Essas normas respeitam à atribuição de complementos de pensão dos sistemas de proteção social. Se, por um lado, é verdade que não estamos perante uma matéria que integre a reserva da convenção coletiva, por outro lado, atenta a sua conexão imediata com os direitos dos trabalhadores à segurança eco- nómica na velhice, ela é naturalmente vocacionada para ser objeto de negociação coletiva, não existindo qualquer disposição legal que proíba a sua contratualização. As normas suspensivas do pagamento dos suplementos livremente acordados constituem, pois, numa intromissão na eficácia do conteúdo do que foi livremente contratualizado. Essa intromissão constitui uma restrição à eficácia do exercício do direito à contratação coletiva a que preside um interesse público (diminuição das despesas das empresas que integram o setor empresarial do Estado, com a consequente diminuição do montante das transferências de verbas do Orçamento Geral do Estado para estas empresas) que não é capaz de justificar tal restrição, num juízo estrito de proporciona- lidade, atento o nível particularmente intenso da confiança depositada na eficácia do contratado e o grau elevado das consequências lesivas da frustração do investimento nessa confiança.
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