TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 90.º Volume \ 2014
213 acórdão n.º 413/14 tem sobre os respetivos trabalhadores), confundindo Estado-empregador e Estado-legislador, e pressupõe que a garantia do direito fundamental à retribuição não tem igual expressão para todos os trabalhadores, o que não pode ser aceite. Conclui-se, assim, que não existe correspondência entre a característica identificadora do grupo de pessoas formado pelos trabalhadores do setor público e o tratamento diferenciado que lhes é proporcionado relativamente aos demais cidadãos portugueses. 17. Em regra, todos devem contribuir, de acordo com as suas capacidades, para um objetivo que a todos aproveita: a diminuição do défice do Estado. Na medida em que visam solucionar um problema do Estado, enquanto coletividade, o interesse público por elas prosseguido diz respeito à generalidade dos cidadãos e não, unicamente, aos trabalhadores do setor público. A redução da despesa pública, tendo em vista assegu- rar a prossecução das finalidades estaduais, onde se incluem também as prestações sociais, por fundada que seja no contexto económico e financeiro atual, não legitima o sacrifício adicional, e desprovido de qualquer compensação específica, de apenas alguns para satisfação dos interesses de todos. A seleção de quem deve ser chamado a solver os encargos públicos tem como limite a igualdade na repartição dos encargos públicos, bem como a respetiva capacidade contributiva. 18. Afasto-me, portanto, da fundamentação do Acórdão, quando ali se afirma que não é no fundamento mas na medida da diferenciação que reside o problema referente ao parâmetro da igualdade (n.º 33). Em si mesmo, o princípio da igualdade não contém nenhuma escala de avaliação para determinar uma relação con- trária ao Direito, pelo que não é possível uma afetação deste princípio que se contenha ainda dentro dos limites do tolerável. Não está, pois, nas mãos do Tribunal Constitucional definir a medida da diferença tolerável. Não havendo correspondência entre as características diferenciadoras dos grupos identificados pela norma e as diferenças de tratamento detetadas, não existe verdadeiro fundamento para a discriminação. c. Quanto à fixação de efeitos da declaração de inconstitucionalidade com força obrigatória geral 19. Apesar de ter votado favoravelmente a fixação de efeitos, preferia uma solução em que a restrição de efeitos apenas abrangesse a parte da norma do artigo 33.º da LOE que, de acordo com a fundamentação do Acórdão, excede o limite do razoável e que justifica a declaração de inconstitucionalidade – ou seja, a restri- ção dos efeitos devia abranger apenas a redução remuneratória entre 3,5% e 10% para trabalhadores do setor público que aufiram remunerações base superiores a € 1500, aplicando-se aos restantes efeitos da norma a eficácia regra ex tunc . Tratava-se de uma solução mais adequada e juridicamente possível que, todavia, não mereceu acolhimento. Tomo esta posição apesar de considerar que a inconstitucionalidade da norma também afeta esta dimen- são normativa do artigo 33.º da LOE, uma vez que a decisão de modelação de efeitos constitui uma decisão distinta do Tribunal Constitucional, que incide sobre os efeitos da declaração de inconstitucionalidade, tendo, portanto, como seu pressuposto a decisão já tomada pelo Tribunal Constitucional e sendo depen- dente desta. 20. O Tribunal Constitucional é autorizado pelo artigo 282.º, n.º 4, da Constituição a fixar os efeitos da declaração de inconstitucionalidade, de forma a alcançar um efeito mais restrito ou menos oneroso do que a eficácia normal desta declaração, prevista no artigo 282.º, n. os 1 e 2, quando tal for exigível por imperativos de segurança jurídica, equidade ou interesse público de especial relevo. Ao usar este poder, o Tribunal não está a restringir os efeitos da inconstitucionalidade proprio sensu da norma em questão, uma vez que estes estão fixados na Constituição, mas os efeitos da declaração de inconstitucionalidade do Tribunal propriamente dita. Nestes termos, o Tribunal Constitucional tem competência para restringir qualquer efeito da declaração (o efeito retroativo e o efeito repristinatório), em razão do tempo ( v. g., até à publicação do Acórdão), da
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