TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 90.º Volume \ 2014
174 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL de segurança social, por estar intimamente conexionada com a das relações laborais, se encontra ainda natu- ralmente no âmbito da contratação coletiva. E que, para além disso, o direito de contratação coletiva, por se enquadrar no âmbito dos direitos, liberdades e garantias, está sujeito ao regime do artigo 18.º, pelo que ape- nas pode ser restringido «nos casos expressamente previstos na Constituição, devendo as restrições limitar-se ao necessário para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos» e não «dimi- nuir a extensão e o alcance do conteúdo essencial» do direito. É que, de acordo com um tal entendimento, o artigo 56.º, n.º 3, da Constituição, ao remeter para a lei, constituiria credencial bastante para que a lei pudesse restringir o referido direito de contratação coletiva. Questão é que, como então se considerou relati- vamente ao artigo 6.º, n.º 1, alínea e) , do Decreto-Lei n.º 519-C1/79, se não atinja o seu conteúdo essencial e que as restrições se apresentem necessárias para a salvaguarda de outros direitos e interesses. Neste outro contexto, o Tribunal exprimiu este ponto de vista: «Com efeito, muito embora se considere [na perspetiva ora adotada] que o âmbito da contratação coletiva abrange naturalmente as prestações complementares de segurança social, forçoso se afigura reconhecer que tal matéria não constitui o cerne do objeto da negociação das condições da prestação de trabalho, sempre se apre- sentando como questão lateral, já que é ao Estado que incumbe, em primeira linha, garantir o direito à segurança social. Não pode, pois, como acima se referiu, ser tida como pertencendo ao núcleo duro do direito, ou seja, como fazendo parte do seu conteúdo essencial. Por outro lado, existem fortes interesses em presença que permitem considerar como necessária, adequada e proporcionada a restrição em causa: (a) o interesse das empresas e do aparelho produtivo, já que, perante uma negociação complexa, facilmente aquelas podem ser levadas, por imediatismo, a ceder em aspetos que, não implicando custos imediatos, se virão a traduzir em custos elevados e incomportáveis no futuro, pondo em causa a própria sobrevivência a médio prazo; (b) o interesse dos próprios trabalhadores, uma vez que, renunciando a vantagens imediatas, podem ver, no futuro, inviabilizadas as esperadas compensações financeiras de tipo previdencial, por impossibilidade de cumprimento por parte das respetivas empresas; (c) o interesse público, pois que o incumprimento dos compromissos em matéria de prestações complementa- res pode criar graves problemas de ordem social, que o Estado, em última análise, acaba por ser chamado a resolver. Concluindo este ponto: a norma sub iudicio não viola, pois, os artigos 56.º, n. os 3 e 4, 17.º e 18.º, n.º 2, da Constituição da República.» 64. A referida alínea e) do n.º 1 do artigo 6.º do Decreto-Lei n.º 519-C1/79, de 29 de dezembro – sobre que se pronunciou o Acórdão n.º 517/98 –, foi alterada pelo Decreto-Lei n.º 209/92, de 2 de outu- bro, passando a consignar que «[o]s instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho não podem […] estabelecer e regular benefícios complementares dos assegurados pelo sistema de segurança social, salvo se ao abrigo e nos termos da legislação relativa aos regimes profissionais complementares de segurança social ou equivalentes, bem como aqueles em que a responsabilidade pela sua atribuição tenha sido transferida para instituições seguradoras». O diploma foi entretanto revogado pelo artigo 21.º, n.º 1, alínea g) , da Lei n.º 99/2003, de 27 de agosto – o diploma que aprovou o Código do Trabalho de 2003. Este último, assim como o Código do Trabalho aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro – e que se encontra presentemente em vigor – afastou a proibição expressa de os instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho estabelecerem e regularem «benefícios complementares dos assegurados pelas instituições de previdência».
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