TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 90.º Volume \ 2014

172 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL não seja financeiramente autossustentável. Deste modo, a lei salvaguarda não apenas os interesses dos bene- ficiários como a própria autonomia de gestão da empresa devedora. Por todo o exposto, deve entender-se que as razões de interesse público que ditaram o artigo 75.º, n.º 4, da Lei n.º 83-C/2013 sempre seriam aptas a justificar, em ponderação, a suspensão do pagamento de com- plementos de pensão que até à aprovação da citada Lei vinham sendo pagos por empresas do setor público empresarial financeiramente não autossustentáveis. Violação dos princípios da igualdade e da proporcionalidade 62. A exposição anterior permite evidenciar também que as soluções do artigo 75.º da Lei n.º 83-C/2013 não são nem arbitrárias nem excessivas. Contrariamente ao que defendem os requerentes, não é exato que o legislador tenha isolado «categorias específicas de pensionistas» e introduzido diferenciações sem um qualquer fundamento racional. O citado artigo 75.º visa acautelar a sustentabilidade das empresas do setor público empresarial, prevenindo e minorando os impactos orçamentais negativos associados ao seu desequilíbrio financeiro. Por ser assim, justifica-se que apenas sejam visadas as empresas de tal setor que tenham apresentado resultados líquidos negativos nos três últimos exercícios apurados, à data de entrada em vigor da Lei n.º 83-C/2013, uma vez que em relação a elas já se verifica terem iniciado um ciclo de exploração deficitária justificativo da adoção de medidas racionalizadora dos gastos e perdas incorridos. E é precisamente esse o contexto que explica a suspensão do pagamento aos tra- balhadores no ativo e aos antigos trabalhadores já aposentados de complementos correspondentes a benefícios que não constituem nem retribuição nem pensão devida nos termos da legislação sobre segurança social: tal medida consubstancia um esforço de contenção de gastos com pessoal que, em rigor, não revestem natureza operacional, uma vez que são alheios à atividade produtiva que constitui o objeto da empresa. Por outro lado, na perspetiva do princípio da proibição do excesso, já se assinalou que, ao permitir diminuir a despesa corrente das empresas visadas, a medida em causa contribui não só para o respetivo sanea- mento financeiro como para a consolidação das contas públicas, através da redução das transferências, atuais ou potenciais, do Orçamento do Estado para tais empresas, a fim de compensar a situação deficitária. Ela é por isso adequada e necessária aos fins legítimos que visa atingir. Além disso, ponderando aqueles interesses públicos com os interesses dos particulares que são afetados pela medida, e tendo em conta igualmente quer o seu caráter não definitivo, quer a circunstância de a mesma medida respeitar a dimensão negativa da garan- tia do mínimo de existência, não se mostra que a opção do legislador em apreciação seja desproporcionada, desequilibrada ou desrazoável. Violação do direito de contratação coletiva 63. Por último, importa considerar o argumento relativo à violação do direito de contratação coletiva (artigo 56.º, n.º 3, da Constituição). Segundo os requerentes, tal direito é posto em causa em virtude da natureza imperativa conferida ao regime do artigo 75.º da Lei n.º 83-C/2013 pelo seu n.º 7, enquanto se verificarem as condições nele estabelecidas, prevalecendo sobre instrumentos de regulação coletiva de tra- balho. Com efeito, defendem que, na medida em que são revogadas normas livremente acordadas em sede de contratação coletiva e é afastada a possibilidade de negociações futuras sobre a matéria, o citado direito fundamental é violado. O Tribunal Constitucional tem entendido que o direito de contratação coletiva é um direito que os trabalhadores apenas podem exercer através das associações sindicais, sendo, além disso, um direito que se acha colocado sob reserva da lei: a Constituição garante-o, de facto, «nos termos da lei» (artigo 56.º, n.º 3). Isto significa que a lei pode regular o direito de negociação e contratação coletiva – delimitando-o ou restringindo-o –, mas deixando sempre um conjunto minimamente significativo de matérias aberto a essa negociação. Ou seja, pelo menos, a lei há de garantir uma reserva da convenção coletiva.

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