TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 90.º Volume \ 2014

160 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL A alteração de incidência da taxa de redução remuneratória tem o declarado objetivo de introduzir uma alteração da política salarial na Administração Pública, partindo de dados que apontam genericamente para práticas salariais no setor público que diferem substancialmente do padrão que é observado no setor privado, de que resulta que sejam pagas no setor público, comparativamente com o setor privado, remunerações mais elevadas para funções de menor exigência e remunerações mais baixas para funções de maior complexidade e exigência ( Relatório do OE 2014, p. 49). Deste modo, a substituição da taxa de caráter progressivo entre 3,5% e 10%, afetando mais intensa- mente os rendimentos mais elevados, em vigor desde 1 de janeiro de 2011, por uma taxa progressiva entre 2,5% e 12% para remunerações até € 2000 e que se fixa em 12% acima desse valor, visa, segundo o legis- lador, manter a progressividade na redução remuneratória mas em termos mais equitativos, quer dentro da Administração Pública, quer face ao setor privado. A aplicação de uma taxa fixa a partir dos € 2000 – como se afirma – tem também como “objetivo não agravar ainda mais a fraca competividade das remunerações públicas do Estado relativamente ao setor privado para os grupos com maiores qualificações e responsabi- lidade”, por se tratar de grupos aos quais as condições oferecidas são menos competitivas que as do setor privado ( Relatório do OE 2014 , p. 49). Tratando-se, no entanto, de uma medida que o proponente da norma continua a entender como sendo de natureza transitória e prevalecentemente destinada, a promover o reequilíbrio orçamental numa conjun- tura de emergência financeira, ela acaba por acentuar relativamente a níveis remuneratórios intermédios o caráter desproporcional da redução salarial no confronto com titulares de outros rendimentos. E essa ilação adquire especial validade no que se refere à extensão da redução a remunerações que se situam entre os € 675 e € 1000, por se tratar aí de rendimentos muito exíguos, que anteriormente haviam sido excluídos do corte salarial – relativamente aos quais o Tribunal considerou já que qualquer sacrifício adicional seria excessivamente gravoso (Acórdão n.º 187/13)–, e que seria de todo desrazoável que pudessem ser agora afetados a pretexto da necessidade de corrigir potencias desajustamentos do atual sistema retribu- tivo da Administração Pública. 47. Em conclusão: Do ponto de vista da quantificação do esforço adicional exigido aos trabalhadores do setor público no âmbito da consolidação orçamental, a extensão da desigualdade de tratamento implicada na solução con- sagrada no artigo 33.º da Lei n.º 83-C/2013 corresponde a uma acentuação significativa do grau de dife- renciação originado pelos termos em que a redução das respetivas remunerações base mensais se encontrava prevista nos artigos 19.º, n.º 1, 20.º, n.º 1, 27.º, n.º 1, das Leis n. os 55-A/2010, 64-B/2011, e 66-B/2012, respetivamente. Ainda que se admita que esses termos não definem um limite inultrapassável, a verdade é que a redução agora estabelecida não constitui, quando globalmente considerada, uma versão relevantemente atenuada da desigualdade gerada pela Lei n.º 66-B/2012, quando a tal redução foi associada a suspensão total ou parcial do pagamento do subsídio de férias ou 14.º mês. Apenas no escalão das remunerações mais elevadas – as superiores a € 4165 − se produz um desagravamento generalizado e de valor significativo (4,43%). Por assim ser, a solução legislativa consagrada no artigo 33.º da Lei n.º 83-C/2013 só poderia ser objeto de um julgamento distinto daquele que foi realizado no Acórdão n.º 187/13, se a caracterização dos planos normativos e/ou orçamental em que se inscreve a medida impugnada se tivesse alterado ao ponto de tornar constitucionalmente admissível a fixação da medida da desigualdade prevista para 2014 num ponto equiva- lente àquele que foi censurado no referido aresto. Não se verificando, no plano normativo, a concorrência de quaisquer fatores de desagravamento da situação remuneratória dos trabalhadores do setor público relativamente aos verificados no contexto da Lei n.º 66-B/2012, aquela alteração apenas poderia relacionar-se com as acrescidas exigências da consolidação orçamental resultantes do mais baixo limite fixado para o défice.

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