TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 90.º Volume \ 2014
123 acórdão n.º 413/14 36.º Nos termos da lei orçamental, são destinatários da medida não todos os pensionistas de sobrevivência, mas apenas aqueles que percebem já um determinado montante global mensal a título de pensão – mais concretamente, pelo menos uma das prestações previstas no acima citado n.º 7, excluindo a própria pensão de sobrevivência, con- forme flui, por seu turno, do n.º 15 do artigo 117.º, igualmente supra aludido. 37.º De igual modo, admitindo-se, aqui como ali, em um horizonte hipotético, que a medida ablativa agora questionada não suscite um juízo de ilegitimidade constitucional quanto à sua aceitação de princípio e, em iden- tidade de atitude intelectual, percebendo-a tal como normativamente construída e derramada no artigo 117.º da LOE2014, entendo que a mesma não passa incólume à luz de um juízo de conformidade com a Lei Fundamental, por violação do princípio da igualdade (artigo 13.º da Constituição). 38.º E não cumpre com esse princípio constitucional tanto na dimensão de cálculo das pensões de sobrevivên- cia a atribuir como na de recálculo ou redução das pensões de sobrevivência já atribuídas, pelas razões que passo a densificar. 39.º Assente a ablação legislativamente gizada, de sentido regressivo, em um pressuposto de licitude da aposi- ção de condição de recursos à atribuição ou manutenção do pagamento das pensões de sobrevivência, verifica-se que o círculo de pensionistas de sobrevivência afetados é composto por aqueles que auferem já determinado mon- tante mensal (igual ou superior a € 2000, segundo o limiar fixado na lei) a título de pensão paga por quaisquer entidades públicas. 40.º De outro modo dito, o legislador elegeu como único grupo de cidadãos visados aqueles pensionistas de sobrevivência que percebam rendimentos de pensões a cargo de quaisquer entidades públicas (com as exceções consignadas no n.º 8 do artigo 117.º), isentando do âmbito subjetivo da ablação os pensionistas de sobrevivência que, não sendo titulares de uma das pensões ou prestações relevantes para efeitos da aplicação da medida contes- tada, aufiram igualmente valor global mensal igual ou superior a € 2000 a título de outras fontes de rendimento. 41.º Temos assim, dentro do universo dos pensionistas de sobrevivência, uma diferenciação entre estes pensio- nistas, com distinção de deveres, uns suportando uma amputação no seu direito à pensão, em virtude de auferirem um valor global mensal a título de pensão igual ou superior a € 2000, que não onera em idêntica medida outros titulares de pensões de sobrevivência a cargo da CGA e do CNP e que preenchem idêntica condição de recursos, pelo simples facto de estes provirem de outra fonte que não as pensões abrangidas para efeitos do cômputo de rendimento mensal relevante para a aplicação da medida vertida no artigo 117.º 42.º As normas constantes do preceito em causa denotam pois uma desigualdade entre pensionistas de sobrevi- vência com idêntica condição de recursos, em função do tipo ou natureza dos rendimentos auferidos, sacrificando o legislador exclusivamente os direitos de certos pensionistas de sobrevivência. 43.º Este tratamento diferenciador dentro do próprio universo dos pensionistas de sobrevivência cujas pensões são pagas por dinheiros públicos não se coaduna com o princípio constitucional da igualdade, o qual reclama que, mesmo em uma circunstância de desequilíbrio das contas públicas, as medidas adotadas para lhe fazer face não devem ser assumidas pelo legislador como recaindo, ante um universo de pensionistas de sobrevivência que preen- chem idêntica condição de recursos, somente sobre uma parte desses pensionistas, sob pena de um tratamento injustificadamente desigual. 44.º O princípio constitucional da igualdade postula que se dê tratamento igual a situações de facto essencial- mente iguais e tratamento diferente para as situações de facto desiguais, não proibindo o mesmo princípio, em absoluto, as diferenciações, mas apenas aquelas que se afigurem destituídas de um fundamento razoável, sinonimi- zando, nesta sua dimensão, a proibição do arbítrio. 45.º Na situação vertente não se vislumbra critério objetivo, constitucionalmente relevante, que possa com racionalidade justificar a diferenciação de tratamento apontada. 46.º Com efeito, a medida questionada pode ser enquadrada, mais genericamente, na necessidade de «garantir a compatibilização do sistema de pensões com a sustentabilidade das finanças públicas» (veja-se o Relatório do OE2014, p. 56), contabilizando-se como medida de consolidação orçamental do lado da despesa. 47.º Estando em causa uma medida contabilisticamente entendida como dirigida à redução da despesa pública, afetando as pensões de sobrevivência de determinados pensionistas, não se vislumbra a existência de qualquer
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