TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 90.º Volume \ 2014

113 acórdão n.º 413/14 Artigo 115.º da LOE 2014 a) As normas deste preceito ofendem o princípio da proporcionalidade (artigo 2.º) e o princípio da igualdade (artigo 13.º). b) Doentes e desempregados constituem categorias, definidas substantivamente em função de fatores dos mais vulnerabilizadores na vida individual e social, a que a Constituição confere uma proteção compensatória [vide artigo 59.º, n.º 1, alínea e) e artigo 63.º, n.º 3], traduzida em prestações pecuniárias específicas, verificados certos requisitos. Ainda que sem se descer agora abaixo do mínimo legal (inferior ao salário mínimo), é consti- tucionalmente inadmissível gravar, de novo, essas prestações com reduções de 5 e 6%. c) Embora o ponto já tenha sido objeto de exame, há aspetos novos que se colocam à segunda vez e no específico contexto orçamental em que tal ocorre. d) Que as prestações que são devidas, em execução do programa constitucional a doentes e desempregados sejam, em dois anos consecutivos, objeto de uma ablação que já atinge os 10 e 12% de redução é algo de constitucio- nalmente inadmissível. e) Invertendo a ordem de prioridades da proteção constitucional, atribui-se aqui, de forma repetida, a doentes e desempregados um tratamento “em pior”, num contexto em que se desagravam outros e se reduz o esforço exigido noutras direções. Aliás, não tendo o legislador imposto a todos, a partir do valor mínimo considerado, contribuições adicionais específicas no valor de 10% a 12%, escolher doentes e desempregados para esse efeito ofende o princípio da proporcionalidade em várias das suas dimensões (nomeadamente o da necessidade) e ainda o princípio da igualdade, por aplicação – repetida e duplicada – de tratamento mais gravoso a quem é constitucionalmente merecedor de mais proteção. (…) Artigo 117.º da LOE 2014 a) As normas do artigo 117.º da LOE contendem com o princípio da proteção da confiança, ínsito no princípio do Estado de direito (artigo 2.º), o princípio geral da igualdade (artigo 13.º, n.º 1), e o princípio da proporcio- nalidade, também decorrente do princípio do Estado de direito. Há ainda restrição do direito à propriedade, direito com natureza análoga aos direitos, liberdades e garantias, restrição essa que se deve entender como violadora do princípio da proporcionalidade. b) Opta-se, para essas pensões e para os seus titulares, por um tratamento mais gravoso, a ponto de atingir a desapropriação total – quando aqueles fatores imporiam proteção diferencial (sobre a viuvez e a orfandade, é expressa a orientação protetora da nossa constituição social – cfr. artigo 63.º, n.º 4). c) Prevê-se no artigo 117.º da LOE 2014 a ablação, parcial ou total, de prestações a atribuir ou pagas a título de pensão de sobrevivência. Sendo o primeiro caso em que se atinge este nível sacrificial na esfera da segurança social, é injustificável que seja em situações de viuvez e análogas, e em sede contributiva, que se pretenda con- sumar esse excesso. d) Em alguns casos, as normas em causa consubstanciam uma redução retrospetiva, operada através de recálculo, de pensões de sobrevivência já em pagamento, pelo que afetam direitos consolidados na esfera patrimonial dos seus titulares, o que constitui uma afetação gravosa e inédita do direito à pensão protegido constitucional- mente. e) Na medida em que não haja um interesse público suficientemente forte que justifique uma afetação tão gra- vosa, tanto do direito à segurança social, quanto da confiança legítima que os cidadãos depositam na continui- dade e estabilidade do regime jurídico em vigor e, sobretudo, na estabilidade de direitos já formados, aquela afetação terá de ser configurada como inconstitucional. f ) As normas do artigo 117.º da LOE 2014 contém soluções legislativas manifestamente assistemáticas e desen- quadradas de qualquer esforço global de sustentabilidade do sistema público de proteção social e de repartição inter e intrageracional do ónus dessa sustentabilidade, merecendo por isso o mesmo destino que as normas que estiveram em apreciação no Acórdão n.º 862/13 desse Tribunal, isto é, a declaração de inconstitucionalidade por violação do princípio da proteção da confiança.

RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=