TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 89.º Volume \ 2014

79 acórdão n.º 55/14 Ora, começam por valer, também aqui, as razões atrás enunciadas relativas à caracterização da medida em causa: as normas em apreciação não estabelecem uma derrogação às normas orçamentais que preveem as reduções remuneratórias e que proíbem as revalorizações salariais, antes criam e modelam a atribuição, pela Região Autónoma, de uma prestação complementar à remuneração. 36. Ainda que se afaste a existência de uma contradição formal das normas em apreciação com as mencionadas normas orçamentais, é inegável que a instituição de uma remuneração complementar regional introduz um regime que diferencia, positivamente, os trabalhadores que recebem por verbas da Região, aumentando o seu rendimento disponível. Sublinhe-se, porém, que não tem fundamento constitucional pretender-se que a igualdade inscrita no artigo 13.º da Constituição obriga a que se omita qualquer diferenciação positiva. Já a Comissão Constitucional, no Parecer n.º 15/81, perfilhara o entendimento de que o legislador constitucional não considera ilícita a criação de regimes jurídicos mais favoráveis para certos grupos de cidadãos, quando se tem em vista uma tendencial «igualdade de oportunidades ou igualdade de tratamento de facto». A Comissão concluiu no sentido de não se declarar a inconstitucionalidade de um regulamento do Governo da República que previa uma alteração dos preços nas tarifas aéreas, mais vantajosas para os residentes nas Regiões Autónomas. Nesse Parecer afirmou-se: «Sucede, porém, que tais discriminações favoráveis ou positivas têm uma razão de ser evidente, não configu- rando, por isso, uma violação ao princípio da igualdade, tal como é postulado na nossa Constituição (artigo 13.º): o legislador considera atendível a circunstância de os cidadãos portugueses residirem habitualmente nas regiões autónomas, em ilhas afastadas do continente, para introduzir reduções dos preços de viagens aéreas que, de alguma maneira, minorem os inconvenientes da insularidade e do desigual desenvolvimento sócio-económico das próprias regiões autónomas por referência ao continente (...).» 37. Muitas vezes, é na perspetiva da diferenciação estabelecida entre as soluções adotadas para o con- tinente e as soluções adotadas para todos os que, numa Região Autónoma, se enquadrem em determinado grupo, que vem pedido ao Tribunal Constitucional que proceda à sua avaliação, de modo a aferir do seu respeito pelo princípio da igualdade. E desse ponto de vista, a justificação da diferença de tratamento vem sendo encontrada na própria condição regional do grupo em causa: as especificidades económicas, sociais e culturais do arquipélago justi- ficariam a autonomização da prossecução de interesses regionais especiais (Vieira de Andrade, “Autonomia regulamentar e reserva de lei”, in Estudos em homenagem ao Prof. Doutor Afonso Rodrigues Queiró, Coimbra, 1984, p. 21), orientados no sentido da correção das desigualdades face ao mesmo grupo do continente, ou, até, de outra Região Autónoma (artigo 229.º, n.º 1, da Constituição). É o que se pode apreender, por exemplo, do Acórdão n.º 304/11. Aí se disse que «Se a Região Autónoma, com recursos próprios, pretende discriminar positivamente as pessoas que padecem de determinada doença tentando compensar, com apoio clínico, as suas desvantagens, é livre de o fazer. Neste campo estritamente económico-social e fora das maté- rias constitucionalmente reservadas aos órgãos de soberania, a autonomia legislativa regional prevalece sobre a igualdade formal». O Tribunal considerou determinante, para a validade da diferenciação regional esta- belecida no sentido da atribuição de benefícios sociais, o facto de estes serem aprovados pelas Regiões nos estritos limites do seu poder legislativo, e de serem custeados pelas próprias Regiões.  Muitas vezes é o próprio legislador nacional que modela os regimes jurídicos, ou admite a sua mode- lação pela Região Autónoma, de forma a acomodar as diferenças justificadas pelas especiais características geográficas, económicas e sociais das Regiões insulares. Para a situação em análise, é particularmente impres- siva a já mencionada possibilidade de adaptação do sistema fiscal nacional às especificidades regionais, que a Lei das Finanças das Regiões Autónomas (artigo 59.º) abre às Regiões, autorizando a diminuição das taxas nacionais do IRS, do IRC, do IVA e dos impostos especiais de consumo, admitindo deduções à coleta espe- ciais, assim como benefícios fiscais diferenciados.

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