TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 89.º Volume \ 2014
78 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Como se vem afirmando, sendo objetivo fundamental das Regiões Autónomas o respetivo desenvolvi- mento económico e social – assim como o fim específico de correção das desigualdades derivadas da insulari- dade –, é condição da sua operância o poder de dispor, com certo grau de liberdade, das suas receitas. O desenho constitucional da autonomia orçamental assenta, deste modo, na preponderância da liber- dade de opção da Assembleia Legislativa Regional, isenta, conforme reconhece o requerente, de um escrutí- nio de mérito político por parte dos órgãos de soberania. As Regiões Autónomas, dotadas dos seus próprios recursos e de uma certa margem de “independência orçamental” (Jorge Miranda e Rui Medeiros, Consti- tuição da República Portuguesa Anotada , Tomo III, 2007, p. 330) encontram-se constitucionalmente legi- timadas para a afetação e gestão das suas receitas, de acordo com o seu próprio juízo de oportunidade, para prossecução dos objetivos económico-sociais por si delineados. Como referiu este Tribunal, no Acórdão n.º 567/04, dispondo as Regiões Autónomas de poder orça- mental, podem «tomar autonomamente as decisões de afetação das receitas às suas despesas [cfr. artigo 227.º, n.º 1, alínea j) , da Constituição]», ou seja, dispõem do poder de «decidir quais as finalidades das despesas, quais os serviços que recebem os créditos orçamentais e o seu volume». Também neste domínio, a autonomia regional é «autonomia como liberdade de decisão dentro do leque de competências constitucional e estatutariamente definidas, sem qualquer tutela ou controlo dos órgãos do governo central» (Gomes Canotilho, Direito Constitucional e Teoria da Constituição, 7.ª edição, Almedina, Coimbra, p. 360). Assim sendo, resulta, igualmente, nesta perspetiva, que a criação ou modelação da disciplina jurídica da remuneração complementar – cuja atribuição tem por efeito onerar, de forma circunscrita, o orçamento regional – se enquadra dentro da competência da Assembleia Legislativa da Região Autónoma, sendo exer- cida no quadro da autonomia financeira regional. Pelo que se conclui que as normas em apreciação não só não padecem de inconstitucionalidade por violação da reserva legislativa dos órgãos de soberania ínsita nos princípios da unidade do Estado e da solida- riedade nacional, como foram emitidas no âmbito da autonomia financeira (orçamental) que a Constituição consigna à Região Autónoma. b) Apreciação da inconstitucionalidade por violação do princípio da igualdade (artigos 13.º e 229.º, n.º 1, da Constituição) 34. Invoca, igualmente, o Representante da República para a Região Autónoma dos Açores que «as normas conjugadas do n.º 1 e n.º 2 do artigo 43.º do Decreto n.º 24/2013 vêm introduzir no ordenamento jurídico uma diferenciação de tratamento – vêm tratar mais favoravelmente determinadas categorias de trabalhadores em funções públicas, por comparação com o regime geral que resulta do Orçamento do Estado – sem que, contudo, exista um fundamento material suficiente para justificar esse mesmo tratamento diferenciado». Segundo o requerente, as normas em causa tratam de modo diverso os trabalhadores da administração regional autónoma (direta e indireta), – que beneficiariam da medida –, bem como os trabalhadores da administração local açoriana, – que poderiam vir a dela beneficiar por opção da administração local –, rela- tivamente aos trabalhadores da Administração Pública da Região Autónoma da Madeira, assim como aos trabalhadores de toda a Administração estadual, designadamente os trabalhadores da Administração estadual que exerçam funções nas ilhas – que não usufruiriam de remuneração complementar, ainda que auferissem o mesmo rendimento base. Tal tratamento diferenciado traduzir-se-ia numa violação do princípio da igualdade já que teria lugar apenas pelo facto de os trabalhadores pertencerem a «aparelhos administrativos diferentes». 35. A construção do requerente para censura das normas sob o ponto de vista de igualdade parte, de novo, da ideia de que as disposições questionadas visam contrariar as normas orçamentais do Estado que impuseram reduções remuneratórias aos trabalhadores do setor público (33.º) e proibiram revalorizações salariais (39.º).
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