TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 89.º Volume \ 2014
749 acórdão n.º 104/14 46.º É essa diferença – substancial – nos efeitos que tal omissão tem nas posições jurídicas das partes que jus- tifica o tratamento diferenciado que é dado à questão no Código de Processo Civil. 47.º Poderá argumentar-se que o procedimento de Injunção – e a Ação Declarativa Especial em que se trans- muta – é um processo simplificado, contudo, tal simplicidade é meramente aparente. 48.º Especialmente se se tiver em conta que este(s) pode(m) ser aplicável(eis) a ações de qualquer valor, desde que estejam em causa transações comerciais – cfr. Decreto-lei n.º 32/2003, de 17 de fevereiro –, transformando-se o Procedimento Injuntivo em Ação Declarativa Ordinária com a apresentação da Contestação ou a sua distribuição por frustração de citação do Requerido. 49.º Pode-se, deste modo, concluir que o regime simplificado de tramitação, pressuposto neste procedimento, encontra a sua fundamentação, cada vez mais, na expectativa de simplicidade jurídica da pretensão substantiva, não correspondendo a uma menor importância dos interesses pecuniários envolvidos. 50.º Mais, a escolha da forma do processo, as mais das vezes – e assim sucede no caso concreto –, depende exclusivamente da vontade do Autor que pode optar por demandar o Réu através do procedimento de injunção ou da forma especial da ação declarativa para cumprimento dos contratos ou, ainda, do processo comum de declara- ção, não sendo razoável que a escolha do Autor faça diminuir os direitos de defesa do réu. 51.º Posto isto, diga-se que a Constituição da República Portuguesa estabelece no seu artigo 20.º um direito de acesso ao Direito e tutela jurisdicional efetiva, que só pode efetivar – se através de um processo equitativo e orientado para a justiça material sem demasiadas peias formalísticas (vide, neste sentido, Constituição da República Portuguesa Anotada, de Gomes Canotilho e Vital Moreira). 52.º Conforme refere, a este propósito, Lopes do Rego, “as exigências de simplificação e celeridade – assentes na necessidade de dirimição do litígio em tempo útil – terão, pois, necessariamente que implicar um delicado balanceamento ou ponderação de interesses por parte do legislador infraconstitucional – podendo nelas funda- damente basear-se o estabelecimento de certos efeitos cominatórios ou preclusivos para as partes ou a adoção de ‘mecanismos que desencorajem as partes de adotar comportamentos capazes de conduzir ao protelamento inde- vido do processo’, sem, todavia, aniquilar ou restringir desproporcionadamente o núcleo fundamental do direito de acesso à justiça e os princípios e garantias de um processo equitativo e contraditório que lhe estão subjacentes, como instrumentos indispensáveis à obtenção de uma decisão jurisdicional – não apenas célere – mas também justa, adequada e ponderada” (“Os princípios constitucionais da proibição da indefesa, da proporcionalidade dos ónus e comi nações e o regime da citação em processo civil”, in Estudos em Homenagem ao Conselheiro José Manuel Cardoso da Costa, Coimbra Editora, 2003, página 855). 53.º O Tribunal Constitucional, chamado a pronunciar-se sobre esta questão, afirmou no seu Acórdão n.º 625/03 que “ponto é saber se esse diverso tratamento afronta normas ou princípios constitucionalmente con- sagrados. [...] Num primeiro passo, mister é que se não passe em claro que o desentranhamento do requerimento de injunção não consequência irremissivelmente que o seu autor deixe de ter acesso aos tribunais. Tal desentranha- mento, na verdade, configura uma figura de extinção da instância, desta forma não precludindo a possibilidade de aquele autor vir, novamente, quer através de novo procedimento de injunção, quer através de nova ação, fazer valer o direito que se propôs com o anterior procedimento” (disponível em www.tribunalconstitucional.pt ) . 54.º Mais, ainda segundo o mesmo Aresto, “há que atentar que o não pagamento pelo réu da taxa inicial quando contesta a ação resultante da frustração de procedimento injuntivo, também não é desprovido de con- sequências, visto que um dos requisitos de atendimento da contestação é justamente o do pagamento de uma taxa equivalente ao dobro da em falta. Trata-se, assim, de sancionamentos diversos que não deixam de atender ao diferente posicionamento do autor e do réu da ação em que se ‘converteu’ o procedimento de injunção. E diz-se posicionamento diverso, já que, se porventura a consequência do não pagamento da taxa de justiça inicial por parte do réu quando contesta a ação fosse idêntica à prevista para o autor, o desentranhamento da contestação acarretaria a aplicação dos efeitos cominatórios decorrentes da falta de contestação, como óbvias repercussões no mérito da causa (cfr. artigo 2.º do Regime), sendo vedado ao réu, posteriormente (e não interessará aqui entrar em linha de conta com as hipóteses em que é possibilitado o recurso de revisão), o acesso ao tribunal para poder exercer de forma efetiva o seu direito de defesa”.
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