TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 89.º Volume \ 2014
720 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL XXIV) A norma do artigo 70.º, n.º 1, da Tabela de Taxas e Outras Receitas do Município de Sintra viola outrossim o princípio constitucional da proporcionalidade na atividade administrativa, compreendendo a tributária (artigo 266.º, n.º 2) na sua vertente de adequação. XXV) E ofende, bem assim, o princípio de prossecução racional do interesse público (artigo 266.º, n.º 2). XXVI) Se, na verdade, o que se pretende é conter o congestionamento do tráfego e salvaguardar os recursos naturais, é pelo exercício dos poderes de licenciamento, previstos no Decreto-lei n.º 267/2002, de 26 de novembro, e através dos adequados instrumentos de gestão territorial, designadamente através do Plano Diretor Municipal, que se alcançam esses objetivos. XXVII) Só o exercício desse poder de polícia administrativa permite impedir a localização de postos de abaste- cimento em áreas mais sensíveis, só o exercício desse poder permite estipular condições adequadas às circunstâncias concretas do local, dos acessos e da rede viária, só esse exercício permite adequadamente garantir a compatibilidade com a preservação dos recursos naturais que pudessem ser afetados e com a salvaguarda da qualidade de via ( v. g. horários de funcionamento reduzidos para máquinas ruidosas de lavagem automóvel). XXVIII) Ao invés, esta taxa só produz um desincentivo que é o de evitar o uso de imóveis privados para instalar postos de venda a retalho de carburantes, já que a diferença perante os encargos com a renda por utiliza- ção do domínio público justificam racionalmente esta opção. XXIX) É contrário à racionalidade na prossecução do interesse público deferir uma licença para um estabeleci- mento e, depois, procurar anualmente incentivá-lo a cessar a atividade por força da crescente carga de taxas. XXX) Por se turno, registe-se que os supostos fins regenerativos dos recursos ambientais e que a norina pretende fazer inculcar a título de consignação das receitas obtidas com a taxa, constitui mais uma falácia. XXXI) Primeiro, porque não pode indistintamente arrumar esses recursos na categoria dos bens públicos. Nem o ar, nem as águas subterrâneas nem os solos e subsolos são, por definição, públicos. XXXII) Depois, porque ainda que fossem públicos, isso não implica necessariamente fazerem parte do domínio público municipal. XXXIII) Aliás, se há alguma presunção sobre os bens dominiais públicos é a de pertencerem ao catálogo dos bens dominiais nacionais [artigo 84.º, n.º 1, alínea f ) , da Constituição], o que bate certo com a natureza uni- tária do Estado (artigo 6.º, n.º1). XXXIV) E, com efeito, no continente, é à Administração Central que incumbe prover à recuperação e regeneração dos recursos naturais, seja através da Agência Portuguesa do Ambiente, IP (Decreto-lei n.º 56/2012, de 12 de março), seja através das comissões regionais de coordenação e desenvolvimento regional (Decreto- -Lei n.º 228/2012, de 25 de outubro). XXXV) Nesta medida, a norma em causa viola os limites da autonomia regulamentar dos municípios (artigo 241.º), modelada pelo que a lei defina como atribuições próprias (artigo 235.º, n.º 2). XXXVI) Por fim, contanto que a norma do artigo 70.º, n.º 1, da Tabela de Taxas e Outras Receitas do Município de Sintra, revele traços tipicamente fiscais – desde logo, a incidência na capacidade contributiva (artigo 104.º, n.º 1 e n.º 2, da Constituição), de par com a falta de bilateralidade e de equivalência jurídica – não seria de excluir a sua qualificação como contribuição financeira especial em favor de entidade pública. XXXVII)Esta categoria sim, permite tributar o desgaste especial de bens públicos ou de outros recursos naturais como um fim em si, onerando um grupo homogéneo de sujeitos, ao contrário das taxas, cujo alcance moderador de certas atividades pode contar apenas para a definição do montante da taxa, havendo sem- pre de ter na base a prestação de um serviço, a remoção de um obstáculo jurídico ou a utilização privativa do domínio público. XXXVIII)A reconhecer-se materialmente uma contribuição financeira especial, ocorre violação da reserva de com- petência legislativa parlamentar [artigo 165.º, n.º 1, alínea i) ], enquanto por ato legislativo não for defi- nido o seu regime geral (que, de momento, é o dos impostos, nos termos do artigo 4.º, n.º 3, da Lei Geral Tributária).»
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