TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 89.º Volume \ 2014
698 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL O Código de Trabalho aprovado pela Lei 99/2003, 27/08 revogando o diploma supra referido, estatuía no seu artigo 533.º que: “1 – Os instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho não podem: a) Contrariar as normas legais imperativas; b) Estabelecer regulamentação das atividades económicas, nomeadamente no tocante aos períodos de funcionamento das empresas, ao regime fiscal e à formação dos preços; c) Conferir eficácia retroativa a qualquer das suas cláusulas, salvo tratando-se de cláusulas de natureza pecuniária de instrumento de regulamentação coletiva de trabalho negocial. ” A republicação do dito diploma por força da aprovação da Lei 7/2009, de 12 de Fevereiro (mantida pela Lei 3/2012, 10/01) veio dar nova redação à norma supra referida prevendo-se agora no artigo 478.º que: “1 – O instrumento de regulamentação coletiva de trabalho não pode: a) Contrariar norma legal imperativa; b) Regulamentar atividades económicas, nomeadamente períodos de funcionamento, regime fiscal, forma- ção dos preços e exercício da atividade de empresas de trabalho temporário, incluindo o contrato de utilização; c) Conferir eficácia retroativa a qualquer cláusula que não seja de natureza pecuniária.” Ora se a omissão de referência a instrumento de regulamentação coletiva de trabalho negocial, vista de forma literal, pode induzir a ideia de que qualquer instrumento de regulamentação coletiva de trabalho, seja ele negocial ou não, pode agora conferir eficácia retroativa a cláusula de natureza pecuniária, a consideração do espírito da revisão laboral em causa e dos princípios constitucionais da iniciativa económica e da igualdade não permite tal interpretação quando estiverem em causa instrumentos não negociais. Efetivamente conforme decorre da exposição de motivos do dito diploma refletem-se no mesmo “as preo- cupações com a necessidade de assumir um compromisso social capaz de compatibilizar as exigências de com- petitividade das empresas com a valorização do diálogo social e de promover a reforma necessária à combinação entre a inevitável intervenção no domínio da legislação do trabalho e as alterações necessárias nos sistemas de proteção social e de emprego. (...) a revisão laboral enquadra-se numa estratégia de reforma mais ampla, que prevê a criação de outros instrumentos indispensáveis ao efetivo crescimento económico, à melhoria da com- petitividade empresarial, ao aumento da produtividade, à melhoria da empregabilidade dos cidadãos e da qua- lidade de emprego, uma estratégia norteada, também no sentido do combate às desigualdades e da promoção da partilha mais equitativa dos resultados do progresso económico.” Ora compreende-se que instrumento negociado pelos contratantes – representantes de entidades patronais e trabalhadores – esteja autorizado a conferir eficácia retroativa a cláusulas de natureza pecuniária uma vez que se trata de acordos concluídos após processo de negociação dos envolvidos durante o qual os mesmos, após a devida ponderação, voluntariamente, cedem nos interesses que lhes respeitam encontrando, desse modo dialogante, um equilíbrio de valores e interesses que todos beneficia. Mas tal processo de negociação e cedência voluntária não existe nos instrumentos de regulamentação coletiva não negociados como é o caso das Portarias de extensão que não resultam de um ato voluntário mas de uma impo- sição visando a extensão de determinado acordo coletivo a terceiros que nele não intervieram e que, por via dela, passam a estar vinculados aos comandos que dele resultam. Se nenhum problema se vislumbra no que tange aos efeitos futuros de tais determinações (pois que se equipa- ram aos de uma lei) já o mesmo se não pode afirmar no que respeita aos efeitos da eventual retroatividade que a mesma Portaria possa impor quanto a questões pecuniárias.
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