TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 89.º Volume \ 2014

657 acórdão n.º 238/14 S. Não obstante as supra citadas disposições constitucionais, o legislador estabeleceu no diploma das Custas Processuais um regime diferenciado para litigantes com um volume de ações ou procedimentos superior a 200, considerando uma base anual. T. Uma ação interposta, por um litigante que haja interposto mais de 200 ações no ano anterior, representa, para um determinado tribunal, o mesmo custo que uma ação semelhante, em função do valor e da forma de processo, mas que interposta por um litigante que não tenha interposto nenhuma outra ação no ano anterior. U. O custo intrínseco, unitário, de uma ação judicial não é suscetível de se alterar pelo facto de aquele sujeito ter intentado mais 1, 50, ou 1000 ações. V. O fundamento invocado pelo legislador para o estabelecimento de um regime agravado para os grandes litigantes foi o de considerar que o volume de ações intentadas consubstancia um uso abusivo dos tribunais. W. Tal fundamento é ilícito, porquanto não tem qualquer relação com o custo do serviço, pelo que viola os princípios gerais da Lei Geral Tributária, e particularmente os princípios da Igualdade e do Acesso aos Tribunais, previstos nos artigos 13.º e 20.º da Constituição. X. Constituindo um fundamento ilícito, por se basear em distinções arbitrárias ou irrazoáveis, que carecerem de fundamento jurídico-material bastante. Y. O regime previsto no n.º 3 do artigo 13.º do Regulamento das Custas Processuais penaliza o recurso aos tribunais por parte de um determinado tipo de cidadãos e, permite a possibilidade de aplicação, a dois cidadãos na mesmíssima situação, de regimes completamente distintos, unicamente em função de fatores totalmente estranhos a eles. Z. Tal inconstitucionalidade é ainda mais notória quando, nos termos do disposto no Decreto-Lei n.º 14/2011, de 25 de janeiro, regulamentado pela Portaria n.º 119/2011, de 29 de janeiro, uma parte substancial da receita do agravamento da taxa de justiça, se destina a financiar o Fundo para a Modernização da Justiça, sem qualquer ligação ao pleito em que ocorre. AA. Pretendendo o Estado, com este agravamento reverter para as empresas a quem é imposto o pagamento de taxa de justiça agravada uma obrigação que é sua, e sob a capa de uma taxa, impor que as empresas supor- tem não só o custo dos seus próprios processos como também o custo de todo o sistema judicial! BB. Sendo o agravamento da taxa de justiça uma sanção ilegítima, desproporcional e injustificada pelo exercício legítimo do direito de acesso aos tribunais! CC. Onde o mesmo Estado que não cria alternativas e impõe o recurso à via judicial como única solução para a recuperação de créditos se arroga no direito de estabelecer um agravamento pelo facto de as empresas recorrerem à via que lhes é imposta! DD. Por cada vez que recorrem à via judicial, as empresas, tal como qualquer cidadão, pagam já o valor justo por esse recurso: a taxa de justiça. EE. Não se concebendo que um sujeito pague mais ou menos por um determinado ato processual apenas e só em função do número de ações a que deu entrada no ano anterior! FF. Inexistindo, pois, qualquer justificação legal para o agravamento da taxa de justiça apenas e só pelo facto de ter dado entrada em qualquer tribunal, no ano anterior, de 200 ou mais ações, procedimentos ou exe- cuções. GG. O regime em causa é, pois, em causa é violador do princípio do acesso aos tribunais constante do n.º 1 do artigo 20.º da CRP, porquanto, ao aumentar drasticamente o valor da taxa de justiça para determinados litigantes em função do número de processos a que deram origem no ano anterior, e, em suma, à sua capa- cidade económica, ao desincentivar o recurso à via judicial tornando-a verdadeiramente incomportável ou demasiado onerosa, torna extremamente difícil aquele acesso, que não é uma simples prestação de serviço onerosa em que sinalagmaticamente se exige uma retribuição ou preço em troca.

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