TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 89.º Volume \ 2014

635 acórdão n.º 218/14 9. Ora, do Acórdão citado e da jurisprudência de que se socorre resulta que a taxa de justiça assume uma natureza bilateral ou correspetiva, constituindo contrapartida devida pela utilização do serviço público da justiça por parte do respetivo sujeito passivo, já que não se propugna a gratuidade dos serviços judiciais. Não sendo exigida uma equivalência rigorosa de valor económico entre o custo e o serviço, dispõe o legislador de uma «larga margem de liberdade de conformação em matéria de definição do montante das taxas» sendo, porém, necessário que «a causa e justificação do tributo possa ainda encontrar-se, material- mente, no serviço recebido pelo utente, pelo que uma desproporção manifesta ou flagrante com o custo do serviço e com a sua utilidade para tal utente afeta claramente uma tal relação sinalagmática que a taxa pres- supõe» (cfr. Acórdão n.º 143/02; no mesmo sentido, Acórdão n.º 227/07). Assim sendo, não pode deixar de se assinalar que os critérios de cálculo da taxa de justiça, na medida em que condicionam «o exercício do direito fundamental de acesso à justiça (artigo 20.º da Constituição), constituem, pois, a essa luz, zona constitucionalmente sensível, sujeita, por isso, a parâmetros de conforma- ção material que garantam um mínimo de proporcionalidade entre o valor cobrado ao cidadão que recorre ao sistema público de administração da justiça e o custo/utilidade do serviço que efetivamente lhe foi pres- tado (artigos 2.º e 18.º, n.º 2, da mesma Lei Fundamental), de modo a impedir a adoção de soluções de tal modo onerosas que se convertam em obstáculos práticos ao efetivo exercício de um tal direito.» (cfr. Acórdão n.º 421/13). Note-se que o que está em causa na dimensão normativa que nos ocupa não é tanto a bondade consti- tucional do critério estabelecido pelo legislador para a fixação das custas devidas, mas sobretudo, tendo em conta os demais elementos relevantes no caso, os resultados da aplicação daquele critério na determinação do valor da tributação em custas, na medida em que os expropriados, para além da ablação do seu direito de propriedade sobre o bem, acabam por não apenas não usufruir de qualquer parte da indemnização atribuída como ficam onerados a pagar um valor (em custas) que manifestamente a excede. Com a maior relevância para o presente recurso, o aresto acima (parcialmente) transcrito n.º 470/2007 – e que se refere especificamente à norma constante do artigo 66.º, n.º 2, do Código das Custas Judiciais – conclui que os limites impostos pelo princípio da proporcionalidade e pelo próprio direito de acesso aos tribunais (que fica comprometido quando o risco de ter de pagar custas incomportáveis funciona como inibi- dor do recurso à justiça por parte dos cidadãos) são claramente desrespeitados, quando do critério normativo adotado pelas instâncias para a fixação das custas devidas pelos recorrentes resulta que, tendo os recorrentes ficado privados do seu prédio por força da expropriação, não só a indemnização que lhes era devida pela expropriação lhes é totalmente absorvida pelas custas, como ainda terão de pagar a mais, de custas, um valor que ultrapassava, naquele caso, os cem mil euros. 10. Na ponderação dos fins e dos meios convocada pelo princípio da proporcionalidade, é necessário atender ao concreto montante quantitativo atingido pelas taxas devidas em face da situação sub judice . Assim, independentemente de qualquer juízo empírico sobre o montante excessivo das custas – que não cumpriria a este Tribunal formular – e não se tomando o limite de cem mil euros considerado no Acórdão n.º 470/07 como valor absoluto (pois reportado ainda à situação então analisada), não pode deixar de considerar-se, como decorre da decisão judicial recorrida, proferida, em conferência, pelo Tribunal da Relação de Coimbra, que aquele montante representa um valor desproporcionado, pois «no caso em apreço, as custas devidas, com recurso à aplicação do artigo 66.º, n.º 2, do CCJ ultrapassam em € 3 413,94 o valor da indemnização (4 610,42), excedendo, por isso, de “forma intolerável” aquele valor.» (cfr. fls. 53). Nos autos relativos à expropriação do imóvel foi fixada a respectiva indemnização em € 4 610,42, tendo as custas das instâncias correspondido ao valor de € 6 779,96, acrescido das custas ao Tribunal Cons- titucional no valor de € 1244,40, atingindo o valor global de € 8 024,36. Daqui se retira que, em termos percentuais, as custas devidas correspondem a 174% do valor da indemnização fixada (se considerarmos o valor global) ou a 147% desse valor (considerando apenas as custas das instâncias); em qualquer dos casos,

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