TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 89.º Volume \ 2014
630 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 68. A verificação da existência de um tal equilíbrio exige um exame global dos diversos interesses em causa. O Tribunal entende que convém proceder a um tal exame tendo em conta dois elementos importantes. Primeiro, como o Tribunal já recordou, na origem da situação litigiosa encontra-se a privação de propriedade dos requerentes. Em tais situações, o «justo equilíbrio» exige o pagamento de um montante em relação razoá- vel com o valor do bem, sem o que existiria uma excessiva ofensa aos direitos dos particulares. Em seguida, o Tribunal recorda que a Convenção visa proteger direitos não teóricos e ilusórios, mas «concretos e efectivos» (parágrafo 59 supra ). Além disso, o Tribunal deve ainda examinar o comportamento das partes no litígio, incluindo os meios utilizados pelo Estado e a sua implementação ( Beyeler, supra citado § 114). 69. No caso vertente, os requerentes viram ser-lhes atribuída uma indemnização por expropriação no montante de € 197 236,25. Todavia, na sequência da fixação do montante que deviam pagar a título de custas judiciais, acabaram por não receber nada. Mais, tiveram de pagar ao Estado um saldo de € 15 000, mesmo depois de o montante das custas inicialmente fixado ter sido sensivelmente reduzido. 70. A Grande Câmara considera que não lhe compete examinar em abstracto o sistema português relativo à determinação e à fixação das custas judiciais. Como a Câmara evidenciou, os Estados devem poder adoptar as medidas que julguem necessárias para proteger o interesse geral de um financiamento equilibrado dos sistemas de justiça. Neste domínio os Estados Contratantes gozam de uma larga margem de apreciação. 71. O Tribunal deve, pois, examinar a aplicação que foi feita deste sistema no caso concreto que lhe foi submetido. A este respeito, é forçoso constatar que o resultado visado pelo artigo 1.º do Protocolo n.º 1 não foi alcançado: não só os requerentes foram desapossados do seu terreno, corno tiveram ainda de pagar € 15 000 ao Estado. 72. O Governo insiste sobre a diferente natureza jurídica que, segundo ele, existe entre a obrigação do Estado de pagar uma indemnização por expropriação e a obrigação do interveniente processual de pagar as cus- tas judiciais. Esta última obrigação não relevaria do âmbito da expropriação propriamente dita e, portanto, não teria qualquer incidência sobre a questão do respeito do artigo 1.º do Protocolo n.º 1. OTribunal admite que as finalidades jurídicas prosseguidas por cada urna destas obrigações não são, com efeito, idênticas; de resto, toma em conta esta diferença ao qualificar as custas judiciais como «contribuições» no sentido da segunda alínea do artigo 1.º do Protocolo n.º 1 (parágrafo 61 supra ). Verifica todavia que, no caso vertente, os requerentes eram partes num litígio judicial que os opunha ao Estado e que respeitava à determinação do montante de urna indemnização por expropriação, na sequência de um acto praticado pelo Estado no exercício dos seus poderes de autoridade pública. Aos olhos do Tribunal, este caso distingue-se, para efeito de um exame de proporcio- nalidade, daquele em que as custas judiciais são impostas no âmbito de um litígio de direito privado. Nas par- ticulares circunstâncias do caso, pode com efeito parecer paradoxal que o Estado retome com uma mão – por meio das custas judiciais – mais do que aquilo que concedeu com a outra. Assim, numa tal situação, a diferente natureza jurídica entre a obrigação do Estado em pagar uma indemnização de expropriação e a obrigação do interveniente processual em pagar as custas judiciais não obsta a um exame global da proporcionalidade da ingerência denunciada 73. O Governo sublinha igualmente, sob o ângulo da proporcionalidade da ingerência, o comportamento, que qualifica de temerário, adoptado pelos requerentes durante o processo. Segundo ele, a dimensão do mon- tante total pago pelos interessados é a consequência da reclamação de um montante manifestamente descon- forme com a realidade, bem corno da intensa actividade processual que desenvolveram. 74. O Tribunal constata que os requerentes pediram, com efeito, um montante bem mais elevado que todos aqueles que foram indicados nos diversos relatórios periciais produzidos no decurso do processo. Tendo em conta a legislação portuguesa nesta matéria, que era conhecida dos requerentes, a fixação a esse nível da soma pedida influenciou o montante final das custas judiciais. Todavia, o Tribunal recorda que se tratava parti- cularmente de saber se os benefícios susceptíveis de serem retirados de uma eventual exploração económica da pedreira sita no terreno deviam ser ou não incluídos na indemnização de expropriação. As jurisdições internas perante as quais a questão foi colocada discutiram-na de modo aprofundado, chegando mesmo o Tribunal de Évora ao ponto de pedir ex officio uma terceira perícia, embora as que eram exigidas por lei tivessem sido já
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