TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 89.º Volume \ 2014

627 acórdão n.º 218/14 parágrafo do artigo 1.º do Protocolo n.º 1, e que esta disposição visava casos particulares de ofensa ao direito ao respeito dos bens. No caso, contudo, a Câmara entendeu que a situação «denunciada» devia ser examinada à luz da norma constante da primeira frase do primeiro parágrafo do artigo 1.º do Protocolo n.º 1, que reveste carácter geral e que enuncia o princípio do respeito dos bens. Relevou que os requerentes não contestavam a legalidade da expropriação enquanto tal, nem a da regulamentação sobre custas judiciais que lhes fora aplicada, precisando que nada indiciava, de resto, que a ingerência litigiosa tivesse revestido um carácter arbitrário, nomeadamente, a partir do momento em que os requerentes tinham podido submeter os seus argumentos perante os tribunais nacionais. Diversamente do Governo, a Câmara entendeu que não se podia censurar aos requerentes terem tentado, pelos meios processuais à sua disposição, convencer o tribunal a incluir na indemni- zação por expropriação elementos que eram, em seu parecer, essenciais. Julgou que não lhe competia examinar de modo geral o sistema português relativo à determinação e à fixação das custas judiciais, mas constatou que, no caso, a aplicação concreta deste sistema tinha conduzido a uma ausência total de reparação dos requerentes pela expropriação dos seus bens. Concluiu, assim, que as condições de indemnização — ou, mais precisamente, a ausência de indemnização — tinham imposto aos requerentes um encargo excessivo, susceptível de romper o justo equilíbrio que deve reinar entre o interesse geral da comunidade e os direitos fundamentais do indivíduo. B. Tese do Governo perante a Grande Câmara 53. O Governo faz notar, a propósito do objecto da queixa, que a expropriação enquanto tal não está submetida ao exame do Tribunal. Salienta que os requerentes introduziram efectivamente uma queixa a este respeito, mas que o Tribunal a rejeitou por extemporaneidade. Apenas estaria aqui em causa, por conseguinte, a compatibilidade do montante exigido aos requerentes a título de custas judiciais com o artigo 1.º do Protocolo n.º 1. 54. Examinando, em seguida, o sistema português de pagamento das custas judiciais aplicável na época e o que está em vigor desde 2008, o Governo observa que a Convenção não impõe a gratuitidade dos serviços da justiça. Ela prevê, em contrapartida, o direito de os Estados aprovarem, no exercício da sua margem de aprecia- ção, as leis que visam assegurar o pagamento dos «impostos» e de outras «contribuições» no sentido do artigo 1.º do Protocolo n.º 1, entendendo-se, de acordo com uma jurisprudência antiga e bem firmada da Comissão Europeia dos Direitos do Homem, que as custas judiciais constituiriam tais «contribuições» [ Agis Antoniades c. Reino Unido , n.º 15434/89, decisão da Comissão de 15 de Fevereiro de 1990, Décisions et rapports (DR), 64, p. 237]. 55. O Governo critica o acórdão da Câmara, considerando que é metodologicamente inapropriado e juri- dicamente incorrecto confundir a indemnização de expropriação e o montante a pagar na sequência de uma condenação em custas judiciais. Referindo-se ao voto de vencido anexo ao acórdão (vide parágrafo 5 supra ), o Governo considera que as conclusões da Câmara são fruto de uma «amálgama falaciosa» entre duas situações distintas do ponto de vista jurídico, que levou a misturar «dois títulos, um de crédito e outro de débito, que são {. . .] independentes um do outro». O Governo indica, a título de exemplo, a situação em que um credor instaura uma acção perante um tribunal com o fim de obter o pagamento de uma certa quantia e o devedor opõe um pedido reconvencional superior à pretensão do credor; se o tribunal fizer jus ao pedido reconvencio- nal, o credor não receberá qualquer montante e deverá ainda pagar as custas, sem que se possa ver aí, segundo o Governo, qualquer ofensa ao direito ao respeito dos bens. 56. Para o Governo, a alegada ofensa aos direitos dos requerentes decorreria unicamente da condenação dos interessados no pagamento das custas judiciais. Ora, estas teriam sido fixadas no respeito das disposições apli- cáveis do Código de Processo Civil e do Código das Custas Judiciais, por um lado, e do princípio da propor- cionalidade, por outro. O montante total pago pelos requerentes – que corresponderia a 1,02 % do montante do pedido – teria, com efeito, sido fixado tendo em conta a intensa actividade processual de que teriam feito prova e do próprio montante que pediam, o qual se afastava manifestamente da rea1idade.”

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