TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 89.º Volume \ 2014
616 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Ou seja: não garantindo a Constituição a gratuitidade do acesso à justiça, a mesma impõe, em contrapar- tida, a proibição da denegação da justiça por razões de insuficiência económica. Conforme se escreveu no Acórdão n.º 608/99 do Tribunal Constitucional, em matéria de custas judiciais, o princípio da proporcionalidade reveste, «pelo menos, três sentidos: o de “equilíbrio entre a consagração do direito de acesso ao direito e aos tribunais e os custos inerentes a tal exercício”; o da responsabilização de cada parte pelas custas “de acordo com a regra da causalidade, da sucumbência ou do proveito retirado da interven- ção jurisdicional”; e o do ajustamento dos “quantitativos globais das custas a determinados critérios relaciona- dos com o valor do processo, com a respetiva tramitação, com a maior ou menor complexidade da causa e até com os comportamentos das partes”». Assim, a respeito do direito ao acesso à justiça e da correspondente proibição de denegação da justiça por razões de natureza económica, tem o Tribunal Constitucional sufragado o entendimento de que ainda que a Constituição não imponha a gratuitidade daquele acesso, veda, todavia, ao legislador a adopção de regras das quais resulte que os encargos a suportar por quem recorra à administração da Justiça possam, na prática, cons- tituir um entrave inultrapassável ou um clamoroso sacrifício para assegurar tal acesso. E é na linha deste entendimento, que o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 470/07, de 25 de Setem- bro de 2007, proferido no processo n.º 647/06, cuja doutrina e fundamentos merecem o melhor acolhimento, veio “julgar inconstitucional, por violação das disposições conjugadas dos artigos 18.º, n.º 2, e 20.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa, a norma do artigo 66.º, n.º 2, do código das Custas Judiciais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 224-A/96, de 26 de Novembro, interpretada por forma a permitir que as custas devidas pelo expropriado excedam de formo intolerável o montante da indemnização depositada.” No caso em apreço, as custas devidas, com recurso à aplicação do artigo 66.º, n.º 2 do CCJ ultrapassa em € 3 413,94 o valor do da indemnização (4 610,42), excedendo, por isso, de “forma intolerável aquele valor. Impõe-se, por isso, que as custas sejam reduzidas de forma a apenas exceder de forma razoável o montante da indemnização. Ponderando os valores aqui em conflito – o direito do Estado no pagamento dos encargos devidos pelo acionamento pelos expropriados dos órgãos jurisdicionais e a proibição de negar a estes o acesso à justiça por motivos de ordem económica – mostra-se equilibrada uma solução que determine como limite das custas a suportar pelos mesmos quantia correspondente ao valor da indemnização fixada, acrescida de 1/3 do valor cor- respondente à diferença entre esse montante e o montante de todas as custas liquidadas no âmbito do processo expropriativo. Síntese conclusiva É inconstitucional, por violação das disposições conjugadas dos artigos 18.º., n.º 2, e 20.º, n.º 1, da Cons- tituição da República Portuguesa, a norma do artigo 66.º, n.º 2, do código das Custas Judiciais, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 224-A/96, de 26 de Novembro, interpretada por forma a permitir que as custas devidas pelo expropriado excedam de forma intolerável o montante da indemnização depositada. Nestes termos, dando parcial provimento ao agravo, revoga-se o despacho recorrido, determinando-se que o montante das custas a suportar pelos expropriados/agravantes no âmbito do processo de expropriação terá como limite o valor da indemnização fixada, acrescido de 1/3 do valor correspondente à diferença entre esse montante e o montante de todas as custas liquidadas no âmbito do processo expropriativo. Custas pelos agravantes” (fim de transcrição). 4. O Ministério Público, notificado dessa decisão, veio reclamar para a conferência requerendo que sobre a matéria recaia acórdão (art. 700.º/3 do CPC). Tudo visto, cumpre apreciar e decidir: A questão versa o montante das custas a pagar pelo expropriado em processo de expropriação, em comparação com o valor recebido a título de indemnização. Na perspectiva dos recorrentes, aquele não deve exceder o valor recebido a título de indemnização.
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