TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 89.º Volume \ 2014

588 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL do artigo 280.º deve, evidentemente, continuar a ser entendida. A sua aplicação aos recursos das decisões arbitrais que recusem a aplicação de uma norma está portanto fora de dúvida: as razões de ordem pública que justificam a sujeição dos tribunais arbitrais à Constituição conjugam-se especialmente com as razões pelas quais a CRP previu o recurso obrigatório quanto ao Ministério Público. Já o mesmo não se diga quanto ao modo de tramitação deste tipo de recursos. Desde logo, há dúvi- das quanto ao modo de comunicação da decisão arbitral (que recusa a aplicação de normas) ao Ministério Público, para que este possa exercer a função que o n.º 3 do artigo 280.º da CRP lhe atribui. Como não há representação do Ministério Público junto dos tribunais arbitrais, a incerteza – que a lei não resolve – é inelutável. Do mesmo modo, há dúvidas quanto à questão de saber em que tribunal deve ser apresentado o requerimento de interposição do recurso: se no tribunal a quo, segundo a regra geral do processo civil, se no tribunal ad quem , atentas as especificidades de que se revestem os tribunais arbitrais. A propósito de certas matérias e de certos recursos, a lei resolve este último problema no segundo sentido – dizendo expressamente que o recurso da decisão arbitral deve, diferentemente do que resulta da regra geral de processo, ser apresen- tado no tribunal ad quem . É o que sucede, por exemplo, com o Código das Expropriações em relação a todos os recursos (artigo 58.º) ou com a lei sobre arbitragem em matéria tributária em relação aos recursos inter- postos para o Tribunal Constitucional (artigo 25.º, n.º 4, do Decreto-Lei n.º 10/2011, de 20 de janeiro). Na ausência de uma regra geral, a dúvida persiste. Todas estas dúvidas devem ser respondidas tendo em conta a natureza e razão de ser do recurso que o Ministério Público interpõe, obrigatoriamente, quando os tribunais recusam a aplicação de norma com fundamento em inconstitucionalidade. É neste contexto valorativo que deverá ser resolvida a questão prévia relativa à admissibilidade do presente recurso. 2. A recorrida B., S. A., impugna o despacho de admissão do recurso proferido pelo presidente do tribu- nal arbitral, invocando duas razões essenciais. Por um lado, entende que, sendo o requerimento de interposi- ção do recurso de constitucionalidade dirigido ao Tribunal Constitucional, não competiria ao presidente do tribunal arbitral decidir sobre a admissibilidade do mesmo; por outro, sustenta que sempre seria de concluir pela extemporaneidade do recurso interposto, atento o prazo previsto no n.º 1 do artigo 75.º da LTC. 2.1. A impugnante conclui que o presidente do tribunal arbitral deveria ter-se eximido de conhecer o requerimento de recurso apresentado pelo Ministério Público, visto que o mesmo não lhe era dirigido, não se vislumbrando, assim, qualquer base legal para o exercício da competência estabelecida no artigo 76.º, n.º 1, da LTC, segundo o qual «compete ao tribunal que tiver proferido a decisão recorrida apreciar a admissão do respetivo recurso».  O requerimento de interposição do recurso é no entanto inequívoco quanto à vontade, que nele se manifesta, de recorrer para o Tribunal Constitucional e quanto à natureza e objeto do recurso que se pretende interpor. É o que se diz no despacho impugnado, afirmação que aqui se reitera. Ora, perante as incertezas que envolvem a questão de saber onde é que deve ser apresentado o requerimento respeitante a este tipo de recursos – se junto do tribunal a quo, se junto ao tribunal ad quem – não é sustentável invocar o artigo 684.º-B, n.º 1, primeira parte, do Código de Processo Civil, na redação então vigente. O facto de o requerimento não ter sido dirigido ao tribunal que proferiu a decisão recorrida não é motivo suficiente para determinar o seu não recebi- mento. Justamente o que está em causa é a incerteza quanto à questão de saber se, atentas as especificidades dos tribunais arbitrais, também aqui vale a regra processual geral, segundo a qual os recursos se interpõem mediante requerimento dirigido ao tribunal que proferiu a decisão recorrida. Como vimos, em relação a recursos comuns proferidos de decisões arbitrais em matéria de expropriação, a lei contempla, precisamente, a solução oposta; o mesmo sucedendo, em relação a recursos de constitucionalidade interpostos obrigatoriamente pelo Ministério Público em matéria tributária. Abstrair destas especialidades de regime, invocando, como se de um dado firme se tratasse, a aplicação ao caso da regra geral de processo civil, significa resolver a incerteza gerada pelo regime legal – que, recorde-se, é silente quanto a uma solução genéricapara todos os recursos de constitucionalidade

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