TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 89.º Volume \ 2014
580 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL retroatividade (autêntica, claro é) de grau máximo, pois que vai, ao cabo e ao resto, afetar ex tunc a validade dos atos (neste caso, um contrato) que se fundava no diploma revogado e os direitos subjetivos deles deriva- dos. Afigura-se assim bem claro que se está aqui perante uma normação singular e excecionalmente onerosa, na perspetiva da segurança jurídica e da proteção da confiança legítima dos destinatários das normas jurídicas. Não se vê realmente que tão – só um juízo “pretérito” sobre o interesse público chegue para justificá-la. Mas uma outra consideração definitivamente revela – de algum modo por analogia – a “desproporção” ou o “excesso” e, logo, a “arbitrariedade” da solução legislativa em presença: é ela a relativa aos princípios jurídicos que regem os contratos administrativos. Como já se recordou neste aresto, a outro propósito, está aí garantido, em geral, à parte pública a faculdade de promover sua modificação, em nome do interesse público, como o está, em nome do mesmo interesse, o direito de promover à sua revogação ou resolução, mas apenas para o futuro: são esses os instrumentos que a ordem jurídica tem por adequados para fazer prevalecer, nessas situações contratuais, o novo juízo sobre o interesse público que o Governo ou a Admi- nistração em cada momento façam – não podendo, em nome e em razão só desse interesse ir mais além, v. g. , resolver “retroativamente” o contrato. À luz da lei e, naturalmente, em razão dos princípios de justiça em que aquela há de inspirar-se, esta outra possibilidade está-lhes vedada. Ora, o mesmo há de entender-se quando seja o próprio legislador a visar, indireta mas intencionalmente, esse objetivo, revogando retroati- vamente o diploma legal específico em que o contrato se fundou. Não podia fazê-lo – consoante o fez, ou intentou fazê-lo, no caso – a Assembleia da República, como tão-pouco o poderia ter feito, também no caso, o Governo-legislador, através de um decreto-lei. Eis o que só confirma o carácter “arbitrário” das normas da Lei n.º 14/2010 – e a conclusão de que elas vio- lam de modo inaceitável, não só o princípio da proteção da confiança legítima dos destinatários da ordem jurídica, mas inclusivamente, na sua vertente objetiva, o princípio da segurança jurídica, enquanto um dos essentialia da ideia ou conceção do Estado de direito. 39. Concluindo-se, assim, pela inconstitucionalidade, com o fundamento acabado de assinalar, da Lei n.º 14/2010, segue-se que ela não operou o efeito revogatório do Decreto-Lei n.º 188/2008, que constituía o seu objeto e conteúdo normativos. Donde que, devendo entender-se que este outro diploma se mantém na ordem jurídica, produzindo todos os seus efeitos, nele continua o “Aditamento” ao Contrato de Concessão, celebrado pelas Partes em 21 de Outubro de 2008, a encontrar o seu fundamento de validade. Assim, há que julgar improcedente o pedido inicial, formulado na presente ação pela Demandante, A.». 3. Atento o disposto no artigo 280.º, n.º 3, da Constituição da República Portuguesa (CRP), o acórdão arbitral foi comunicado ao Ministério Público junto do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, tendo a comunicação dado entrada neste tribunal no dia imediato ao do envio, ou seja, no dia 25 de outubro de 2011. De acordo com o carimbo aposto na comunicação ao Ministério Público, a mesma deu entrada nos respetivos serviços em 23 de novembro de 2011. O requerimento de interposição do presente recurso foi então interposto diretamente no Tribunal Constitucional, tendo dado entrada em 29 de novembro de 2011. Verificando-se que não fora proferido o despacho a que se refere o artigo 76.º, n.º 1, da LTC, a Relatora proferiu despacho, com data de 15 de dezembro de 2011, a determinar a remessa dos autos, a título devolu- tivo, ao tribunal que proferiu a decisão recorrida. 4. Em 17 de janeiro de 2012, o Presidente do Tribunal Arbitral proferiu o seguinte despacho: «(…) 1. Por requerimento apresentado diretamente no Tribunal Constitucional, veio o Ministério Público interpor recurso para o mesmo Venerando Tribunal – o recurso previsto no artigo 70.º n.º 1 alínea a) , da respetiva Lei (LTC) – do Acórdão final proferido, em 14 de outubro de 2010 por este Tribunal Arbitral.
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