TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 89.º Volume \ 2014

574 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL a decisão de recusa de aplicação da norma por parte do Tribunal Arbitral deu entrada nos serviços do Ministério Público junto do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, pelo que o presente recurso foi interposto dentro do prazo legalmente previsto, não sendo extemporâneo. IV – Tendo em conta o contexto que rodeia a emissão da Lei n.º 14/2010, através da qual a Assembleia da República viria a decidir a revogação, com efeitos retroativos, do Decreto-Lei n.º 188/2008 – que autorizara a Administração do Porto de Lisboa (APL) a celebrar o Aditamento ao Contrato de Concessão e redefinira as bases a que este último deveria obedecer –, importa verificar, para aferir da tutela jurídico-constitucional da «confiança», se estão ou não reunidos os quatro requisitos ou “testes”, identificados no Acórdão n.º 128/09 e que o tribunal arbitral aplicou. V – Em primeiro lugar, para que haja lugar à tutela jurídico-constitucional da confiança é necessário, que o Estado tenha encetado comportamentos capazes de gerar nos particulares expectativas de continui- dade, requisito que, no caso presente, não pode deixar de se dar por verificado; com efeito, o Estado, num primeiro momento, criou expetativas quanto à constituição de tal relação contratual (que culmi- naram na assinatura de um Termo de Acordo, em que as partes definiram e aprovaram as alterações a introduzir no Contrato); num segundo momento, gerou uma expetativa fundada quanto à continui- dade de determinada política portuária pública (o Governo aprovou a proposta de diploma que havia sido consensualizada entre a Apl e a Liscont, a qual veio a converter-se no Decreto-Lei n.º 188/2008, de 23 de setembro, tendo sido estabelecido o limite temporal a partir do qual a APL poderia resgatar a concessão por motivos de interesse público). VI – Na sequência deste diploma, passa a poder dizer-se que não estamos perante uma mera expetativa da Liscont, mas antes, em bom rigor, perante um direito, contratualmente fundado, por via da celebra- ção, em 21 de outubro de 2008, com a Apl do «Aditamento ao Contrato de Concessão de Explora- ção do Terminal de Contentores de Alcântara» (fundado num diploma legislativo governamental); e a confiança quanto à continuidade do comportamento estadual é, obviamente, reforçada quando o legislador parlamentar rejeitou o Projeto de Resolução n.º 400/X de cessação de vigência do Decreto- -Lei n.º 188/2008. VII – O segundo requisito já tem a ver com a exigência de as expetativas da Liscont serem legítimas, jus- tificadas e fundadas em boas razões e também quanto a ele há que concluir positivamente, pois as expetativas de continuidade aqui em causa (no plano legislativo e no plano contratual) alicerçam-se no Memorando de Entendimento (também outorgado pelo Estado português), no Termo de Acordo assinado entre a Liscont e a APL (entidade da administração indireta do Estado, sujeita a tutela gover- namental), num diploma legislativo governamental (o Decreto-Lei n.º 188/2008) e no «Aditamento ao Contrato» (em que uma das partes é uma entidade da administração indireta do Estado, sujeita a tutela governamental – a APL); além de estes documentos públicos terem por detrás todo um proces- so conducente à redefinição da política pública portuária, no qual a própria Liscont foi interveniente; por outro lado, a circunstância de o «Aditamento ao Contrato» ter sido celebrado entre a apresentação do Pedido de apreciação parlamentar n.º 94/X e o seu desfecho (caducidade da iniciativa parlamentar) não desqualifica as expetativas. VIII– Em terceiro lugar, devem os privados ter feito planos de vida tendo em conta a perspetiva de conti- nuidade do «comportamento» estadual, requisito que também importa dar como verificado, uma vez que a decisão recorrida deu como provado que “logo após a celebração do «Aditamento», a Liscont

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