TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 89.º Volume \ 2014

564 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL a falta de formulação de conclusões na motivação de recurso, por via do qual se intenta impugnar a decisão da autoridade administrativa que aplicou uma coima, implica a rejeição do recurso, sem que o recorrente seja previamente convidado a efetuar tal formulação “[…] representa uma afetação desproporcionada do direito de defesa do impugnante/arguido, na sua dimensão de direito ao recurso, garantido pelo n.º 10 do artigo 32.º da Lei Fundamental”. Não obstante o reconhecimento da valência das garantias de defesa também no domínio contraordena- cional, o Tribunal Constitucional tem, no entanto, recusado o entendimento de que o legislador ordinário estaria constitucionalmente vinculado a estabelecer no processo contraordenacional exatamente as mesmas garantias de defesa legislativamente estabelecidas no campo processual-penal. Elucidativo a esse respeito é o que se afirmou no Acórdão n.º 395/02 (disponível em www.tribunal- constitucional.pt) : “[t]ão-pouco se pode considerar violado o n.º 1 do artigo 32.º da Constituição, que con- sagra todas as garantias de defesa, incluindo o recurso no âmbito do processo criminal, em conjugação com o n.º 10 do mesmo artigo que assegura ao arguido os direitos de audiência e defesa nos processos de contraordenação. Efetivamente, o direito de defesa do arguido está garantido nos termos da interpretação normativa posta em causa pela recorrente e inclui, inquestionavelmente, o direito de recurso perante os tri- bunais. Pretender inferir das normas constitucionais citadas uma determinada forma de contar o prazo para a interposição do recurso ou uma exigência de paridade entre prazos de recurso de decisão de autoridades administrativas (em matéria de contraordenações) e tribunais (em matéria penal) é excessivo”. Exemplar é ainda o Acórdão n.º 313/07 (disponível em www.tribunalconstitucional.pt ) , em que se disse que “[o] direito a uma segunda apreciação jurisdicional apenas se encontra constitucionalmente exigido em processo penal, não sendo esta exigência extensível aos demais processos sancionatórios, inscrevendose assim no âmbito da liberdade de conformação legislativa própria do legislador a estatuição das situações em que se justifique a possibilidade duma dupla apreciação da impugnação judicial, desde que efetuada de forma não arbitrária e proporcional”. Por último, merece ainda ser referido o Acórdão n.º 487/09 (disponível em www.tribunalconstitucional. pt) , em que, depois de se afirmar que “[a] variação do grau de vinculação aos princípios do direito criminal, e a autonomia do tipo de sanção previsto para as contraordenações, repercute-se a nível adjetivo, não se justifi- cando que sejam aplicáveis ao processo contraordenacional duma forma global e cega todos os princípios que orientam o direito processual penal” se concluiu que “[o parâmetro do n.º 1 do artigo 32.º da Constituição], conforme tem sido entendido pela jurisprudência constitucional, respeita ao processo criminal e não pode ser diretamente aplicado aos processos contraordenacionais, não havendo, assim, uma imposição constitucional ao legislador ordinário de equiparação de garantias no âmbito do processo criminal e do contraordenacional”. Os três exemplos acabados de referir concretizam o reconhecimento por parte da justiça constitucional de um maior poder de conformação do legislador na ordenação do processo contraordenacional. 9.7.2. Ainda no vasto campo da jurisprudência constitucional em matéria de direitos de defesa do arguido, também no que se refere aos direitos ao silêncio e à não autoincriminação, que, segundo o Acórdão n.º 340/13 (disponível em www.tribunalconstitucional .pt), “devem considerar-se incluídos nas garantias de defesa que o processo penal deve assegurar (artigo 32.º, n.º 1, da Constituição)”, o Tribunal, no Acórdão n.º 461/11 (disponível em www.tribunalconstitucional.pt ) , considerou que “[o] direito à não autoincrimina- ção, nomeadamente na vertente de direito ao silêncio, tendo o seu campo de eleição no âmbito do direito criminal, estende-se a qualquer processo sancionatório de direito público. Porém, o seu conteúdo é diferen- ciado, consoante o domínio do direito punitivo em que se situe a sua aplicação”. 10. A Constituição, ao determinar, no n.º 3 do artigo 30.º, que «[a] responsabilidade penal é insusce- tível de transmissão», vem estabelecer um princípio que define a ordem constitucional da República e que, justamente por se tratar de um princípio, ainda que diretamente incidente no domínio do direito penal, a ele se não encontra confinado.

RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=