TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 89.º Volume \ 2014
561 acórdão n.º 201/14 contraordenacional, ainda que a margem dessa liberdade seja maior relativamente àquela de que este dispõe na configuração do ilícito penal, designadamente no que se refere à definição do que o legislador pode assu- mir e o que deve ser deixado ao juiz na determinação concreta da sanção. Princípio de non bis in idem 9.3. No que se refere ao princípio de non bis in idem , o Tribunal, no Acórdão n.º 263/94 (disponível em www.tribunalconstitucional.pt ) , considerou “[ser] evidente que a problemática do princípio de non bis in idem se põe relativamente a cada direito sancionatório, sendo certo que só no plano do direito criminal o princípio tem expressa consagração constitucional. Poder-se-á sustentar, é claro, que o princípio é aplicável também por analogia nos outros direitos sancionatórios públicos, no âmbito interno respetivo”. De acordo com esse dictum, em virtude da referida evidência, haveria uma lacuna no texto da Consti- tuição cuja integração se operaria por recurso à analogia. Princípio da aplicação retroativa da lei penal de conteúdo mais favorável 9.4. Sobre a extensão ao domínio contraordenacional do princípio da aplicação retroativa da lei penal de conteúdo mais favorável, escreveu-se, no Acórdão n.º 227/92 (disponível em www.tribunalconstitucional.pt ) , que “[t]al princípio […], na sua ideia essencial, há de […] valer também no domínio do ilícito de mera orde- nacional social”. Tal significa que, à imagem do que vimos suceder relativamente aos princípios da legalidade e da tipici- dade (vide, supra, ponto 9.1.), embora o princípio da aplicação retroativa da lei penal de conteúdo mais favo- rável não valha “com o mesmo rigor” ou “com o mesmo grau de exigência” para o ilícito de mera ordenação social, ele vale “na sua ideia essencial”, ainda que se não tenha ainda desenvolvido um critério que permita densificar o conteúdo do conceito de “ideia essencial” desse princípio. Princípio da proibição dos efeitos automáticos das penas (artigo 30.º, n.º 4) 9.5. O Tribunal Constitucional teve igualmente oportunidade de se pronunciar sobre a extensão a outros domínios do direito sancionatório público do princípio da proibição dos efeitos automáticos das penas, expressamente consagrado para o direito penal no artigo 30.º, n.º 4, da Constituição. No Acórdão n.º 282/86 (disponível em www.tribunalconstitucional.pt ) , entendeu-se que “[o] facto de se não tratar aqui do terreno criminal não impede a aplicação do princípio constitucional do artigo 30.º, n.º 4. Se às penas criminais não pode acrescentar-se, a título de efeito de pena, a perda de direitos profissionais, por maioria de razão isso está vedado quando se trate de penas sem caráter criminal”. Essa mesma posição foi, posteriormente, confirmada no Acórdão n.º 19/04 (disponível em www.tribu- nalconstitucional.pt) , em que se afirmou que “[t]endo em conta que o feito em apreciação se reporta a uma sanção que decorre automaticamente da imposição da pena de multa pelo cometimento de infrações previs- tas em matéria (hoje) contraordenacional, deverá ser sublinhado que este órgão de administração de justiça tem adotado uma postura de acordo com a qual a injunção contida no n.º 4 do artigo 30.º do diploma básico é também aplicável no domínio do ilícito administrativo (cfr. Acórdãos n. os 282/96, citado, in Acórdãos , 8.º Volume, pp. 207 e segs., e 522/95, idem , 32.º Volume, pp. 345 e segs.). O argumento é, portanto, o de que se nem mesmo a violação de bens jurídicos dignos de tutela penal con- sente que à sanção penal possam ser associados efeitos automáticos que se traduzam na perda de direitos, então, por maioria de razão, tal proibição há de valer relativamente à violação de bens jurídicos menos relevantes.
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