TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 89.º Volume \ 2014
56 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL artigo 43.º do Decreto n.º 24/2013, simplesmente por integrarem a administração estadual (descon- centrada). Quanto à primeira perspetiva, a violação do princípio da igualdade resulta da ausência de um critério material que justifique o tratamento diferenciado de trabalhadores que, exercendo funções públicas e tendo a mesma remuneração base, pertencem a aparelhos administrativos diferentes: de um lado, a administração regional autónoma (direta e indireta) e em certa medida a administração local açoriana; do outro, a admi- nistração estadual, a administração local continental e a administração pública da Região Autónoma da Madeira. O modelo de cálculo da remuneração complementar regional e a sua atribuição aos trabalhadores em fun- ções públicas, em função do aparelho administrativo a que pertencem, revelam que a medida legislativa posta em crise não se funda num critério material objetivo, não apresentando qualquer conexão com uma ideia de “correção de desigualdades derivadas da insularidade”, nos termos do n.º 1 do artigo 229.º da Constituição. Na verdade, ainda que possam existir, no contexto regional açoriano, desigualdades factuais relati- vamente ao território nacional, – hipoteticamente espelhadas nos indicadores estatísticos do rendimento líquido disponível das pessoas ou nos índices de preços ao consumidor – tais assimetrias deverão ser corri- gidas através de medidas de natureza fiscal, que, por definição, abrangem todos os residentes. Tal é o caso da redução de 20% de todas as “taxas nacionais do imposto sobre o rendimento das pessoas singulares” e da redução, também de 20%, das diferentes taxas nacionais do IVA, ambas previstas pelo artigo 31.º do Decreto n.º 24/2013 da Assembleia Legislativa Regional (na nova redação que confere aos artigos 4.º e 7.º do Decreto Legislativo Regional n.º 2/99/A, de 20 de janeiro). Relativamente aos grupos de pessoas agora em confronto, não existe nenhuma desigualdade de facto que possa ser corrigida através da atribuição de uma remuneração complementar distribuída em conformi- dade com uma tabela como a aprovada pelo n.º 2 do artigo 43.º Desde logo, a ideia de que as desigual- dades decorrentes da insularidade poderiam ser mais intensas sensivelmente a meio da tabela, nos escalões remuneratórios entre os 1500 € e os 2200 € , não tem qualquer verosimilhança. Assim sendo, tal medida apenas pode ser explicada como forma de diminuir o impacto das reduções remuneratórias, previstas no artigo 33.º do Orçamento do Estado para 2014, sobre os trabalhadores da administração autónoma e da administração autárquica açorianas. No tocante à segunda perspetiva, de cariz intrarregional, a violação do princípio da igualdade resulta da circunstância de as alterações introduzidas pelo artigo 43.º do Decreto n.º 24/2013 não abrangerem todos os trabalhadores públicos do universo regional açoriano afetados pelos cortes remuneratórios previstos no Orçamento do Estado para 2014. De facto, o complemento remuneratório, decorrente das referidas altera- ções, incide diferentemente sobre os trabalhadores públicos, já que: – se aplica imediatamente aos trabalhadores da administração regional autónoma; – mediatamente aos trabalhadores do setor público empresarial regional; – e apenas condicionalmente aos trabalhadores da administração local insular; – não se aplica aos trabalhadores da administração pública estadual, que desempenham a sua função no território açoriano. É certo que a Assembleia Legislativa dos Açores apenas pode legislar sobre a administração autonómica propriamente dita, sob pena de extravasar o parâmetro da sua competência legislativa que é definido pelo conceito institucional de “âmbito regional”, resultante da alínea a) do n.º 1 do artigo 227.º da Constituição (Acórdãos n. os 258/07 e 304/11). Por isso, aquela Assembleia não pode dispor legislativamente para o Estado e tem de respeitar o estatuto e a autonomia financeiras das autarquias locais [artigo 165.º, n.º 1, alínea q) , da Constituição]. Porém, em nenhum caso, deverá produzir um regime jurídico desconforme com o princípio da igualdade, de modo a forçar outros órgãos legislativos a corrigir as desigualdades de tratamento advenien- tes de tal regime.
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