TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 89.º Volume \ 2014

557 acórdão n.º 201/14 caibam na sua previsão normativa. À questão de saber se as normas constitucionais que contêm princípios com relevo em matéria penal ordenam o domínio contraordenacional é impossível responder através de um método que se limite a identificar a situação de facto abstratamente prevista para assim verificar se a parcela da realidade se subsume à previsão normativa ou dela está excluída. A estrutura normativa do princípio requer, pois, uma hermenêutica própria. Diversamente do que se verifica relativamente às normas constitucionais que contêm regras, que se cumprem através da obediência, os princípios cumprem-se através da adesão (vide, nesse sentido, Gustavo Zagrebelsky, Il diritto mite, 2.ª edição, Einaudi, Torino, 1992, nota 96, p. 149), isto é através de processos gradativos de otimização, e não através de processos disjuntivos de sim-ou-não. Porque assim é, a ponderação efetuada, atendendo às circunstâncias de cada caso concreto, entre deter- minado princípio constitucional com relevo em matéria penal e outros direitos, interesses ou valores, neces- sariamente conduz a juízos valorativos sobre o peso relativo a atribuir a cada elemento que, por definição, não permitem uma tomada de posição categórica sobre a valência dos princípios constitucionais com relevo em matéria penal no domínio contraordenacional. Esses dois fatores – de ordem processual, o primeiro; de ordem metodológica, o outro – explicam por que razão a jurisprudência do Tribunal Constitucional sobre a matéria da extensão ao domínio contraorde- nacional dos princípios constitucionais com relevo em matéria penal se revela necessariamente fragmentária. E não é óbvio que uma resposta unitária a essa questão seja virtuosa ou sequer viável. Assim, importa tomar como ponto de partida justamente aquilo que é a jurisprudência fragmentária do Tribunal Constitucional, pelo que, de seguida, se procede a uma análise, ainda que sucinta, das principais decisões em que se pôs o problema da valência de determinados princípios constitucionais com relevo em matéria penal no domínio contraordenacional. Princípios da legalidade e da tipicidade 9.1. É rica a jurisprudência deste Tribunal sobre a extensão dos princípios da legalidade e da tipicidade ao domínio contraordenacional. No Acórdão n.º 574/95 (disponível em www.tribunalconstitucional.pt ) , escreveu-se que “[…] o prin- cípio da legalidade das sanções, o princípio da culpa e, bem assim, o princípio da proibição de sanções de duração ilimitada ou indefinida valem, na sua ideia essencial, para todo o direito público sancionatório, maxime , para o domínio do direito de mera ordenação social. (Quanto à extensão aos demais domínios san- cionatórios de alguns princípios que a Constituição apenas consagra para as leis penais, cfr., entre outros, o Acórdão n.º 227/92, já citado, e a Doutrina aí indicada)”. Mais recentemente, no Acórdão n.º 466/12 (disponível em www.tribunalconstitucional.pt ) , disse-se que “[n]ão se pode afirmar que as exigências de tipicidade valham no direito de mera ordenação social com o mesmo rigor que no direito criminal. Aliás nem sequer existe no artigo 29.º da Constituição, que se refere às garantias substantivas do direito criminal, um preceito semelhante àquele que existe no artigo 32.º, a respeito das garantias processuais, alargando-as, com as necessárias adaptações, a todos os outros processos sancionatórios (artigo 32.º, n.º 10)”. Esse aresto inspirou-se, por sua vez, no Acórdão n.º 41/04 (disponível e m www.tribunalconstitucional. pt) , o qual, no que se refere à exigência de determinação relativamente ao conteúdo do ilícito típico nas con- traordenações, havia sustentado que “[…] a Constituição não requer para o ilícito de mera ordenação social o mesmo grau de exigência que requer para os crimes”, embora também houvesse considerado que “[e]stá, porém, consolidado no pensamento constitucional que o direito sancionatório público, enquanto restrição relevante de direitos fundamentais, participa do essencial das garantias consagradas explicitamente para o direito penal, isto é, do núcleo de garantias relativas à segurança, certeza, confiança e previsibilidade dos cida- dãos (cfr. Acórdãos do Tribunal Constitucional n. os 158/92, de 23 de abril, 263/94, de 23 de março, publi-

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