TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 89.º Volume \ 2014
556 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL prever-seantes uma forma de responsabilidade civil subsidiária), que o Tribunal, nos Acórdãos n. os 129/09 e 437/11, se não teria determinado pela inconstitucionalidade das normas então em apreciação. Simplesmente, não é essa a correta leitura da referida jurisprudência do Tribunal Constitucional. Desde logo, nos Acórdãos n. os 129/09 e 437/11, ao afastar que as normas aí em apreciação se reconduzissem ao domínio contraordenacional, o Tribunal, logicamente, não tomou qualquer posição – não tinha de o fazer – sobre a questão da extensão da proibição constitucional de transmissão da responsabilidade penal à responsa- bilidade contraordenacional. Aliás, no Acórdão n.º 129/09, na senda do que já antes se escrevera no Acórdão n.º 160/04, o Tribunal Constitucional, ao afirmar que “[a norma do artigo 30.º, n.º 3, da Constituição] não pode servir de parâmetro uniforme para a responsabilidade penal e a responsabilidade contraordenacional”, deixou propositadamente a questão em aberto. Tal significa que a qualificação da responsabilidade – matéria que, de resto, respeita ao plano infraconstitucional – se não afigurou, de todo em todo, determinante para o sentido dessas decisões. A isso acresce que, no Acórdão n.º 481/10, o fundamento do juízo de inconstitucionalidade não radica na natureza contraordenacional da responsabilidade em si mesmo considerada – que, nos termos desse aresto, ainda seria conforme à Constituição – mas noutros aspetos de regime. Por último, a circunstância de se não afigurar determinante a qualificação como contraordenacional da responsabilidade é expressamente sublinhada no Acórdão n.º 561/11, pois, embora aí se tenha afastado estar- -se perante uma situação de responsabilidade contraordenacional, acrescentou-se que, mesmo que se houvesse de entender o contrário, isto é, que a responsabilidade in casu assumia natureza contraordenacional, daí não decorreria que os princípios constitucionais fossem violados. Não o seria, porque, como aí se escreveu “[...] no domínio contraordenacional, não são automaticamente aplicáveis os princípios que regem a legislação penal, designadamente no que toca às exigências da autoria do ato-tipo para efeito de incriminação”. Em suma, não decorre de todo em todo da jurisprudência constitucional o entendimento segundo o qual aí onde houver responsabilidade contraordenacional haverá violação da Constituição, designadamente no que se refere ao princípio da proibição de transmissão da responsabilidade penal (artigo 30.º, n.º 3). 8. Não existe na jurisprudência do Tribunal Constitucional uma reflexão sobre os termos em que as normas que contêm princípios constitucionais com relevo em matéria penal valem no domínio contraorde- nacional. A inexistência dessa reflexão explica-se, em parte, por razões que se relacionam com as características do processo de fiscalização concreta da constitucionalidade, designadamente o facto de a extensão da apre- ciação que é feita pelo Tribunal estar processualmente limitada pela utilidade que a mesma produza sobre o caso concreto, o que condiciona a realização de uma interpretação integrada da Constituição como sistema normativo. Tal não significa, note-se, que o Tribunal Constitucional não tenha tomado já posição sobre questões de recorte mais fino, tais como a extensão ao domínio contraordenacional de determinados princípios constitu- cionais com relevo em matéria penal, designadamente aquele ou aqueles princípios (princípio da legalidade ou da tipicidade; princípio de non bis in idem ; princípio da aplicação retroativa da lei penal de conteúdo mais favorável, princípio da proibição dos efeitos automáticos das penas; princípio da culpa; princípio do con- traditório, princípio nemo tenetur ; etc.) que se tivessem por pertinentes para a apreciação da conformidade constitucional da “norma do caso” (vide, infra, ponto 9). Simplesmente, no que respeita à questão, de âmbito mais amplo, sobre os termos em que as normas e os princípios constitucionais com relevo em matéria penal valem no domínio contraordenacional, debalde se procurará uma reflexão sobre a mesma na jurisprudência deste Tribunal. À razão de ordem processual que já vimos explicar a inexistência de uma reflexão sobre a matéria, pode- mos adicionar uma razão de ordem metodológica relacionada com a própria estrutura das normas consti- tucionais que contêm princípios. É que tais normas são insuscetíveis de comportar uma aplicação segundo uma lógica de tudo-ou-nada, através de uma operação que nelas procure subsumir parcelas da realidade que
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