TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 89.º Volume \ 2014

555 acórdão n.º 201/14 Embora alguma doutrina visse nessas normas um desiderato de “mera garantia de satisfação da sanção pecuniária”, considerando que a mesma consagrava uma responsabilidade solidária, não quanto à infração, mas antes quanto ao pagamento da coima em que a pessoa coletiva fora condenada, pois tanto bastaria para que aquela garantia de satisfação fosse alcançada (João Soares Ribeiro, “Análise do Novo Regime Geral das Contraordenações”, in Questões Laborais, 2000, p. 20), uma outra posição doutrinária considera fictícia a separação entre a responsabilidade pelo cometimento da contraordenação, a recair sobre a pessoa coletiva, e a responsabilidade pelo pagamento da coima, a recair sobre a pessoa coletiva e respetivos administradores ou gerentes (vide Nuno Brandão, “O regime sancionatório das pessoas coletivas na revisão do Código Penal”, in Direito Penal Económico e Europeu – textos doutrinários, Coimbra Editora, 2009, p. 469). Isto porque a coima constitui uma “sanção de caráter repressivo”, entendida enquanto “advertência social ao agente”, pelo facto de este não ter respeitado a ordem vigente, e cuja finalidade é essencialmente a de “reafirmação dessa mesma ordem vigente” (Jorge de Figueiredo Dias, Direito Penal – Parte Geral, Tomo I, Coimbra Editora, pp. 165-166; e João Matos Viana, “A (in)constitucionalidade da responsabilidade subsidiária dos administra- dores e gerentes pelas coimas aplicadas à sociedade”, in Revista de Finanças Públicas e de Direito Fiscal, n.º 2, 2009, p. 203). Como é bom de ver, o artigo 551.º, n.º 3, do Código do Trabalho (2009) permite que um terceiro, que não o agente do facto, seja coresponsabilizado pelo pagamento da coima, “independentemente da sua participação na comissão da infração” (Nuno Brandão, ob. cit. , p. 470), e independentemente de lhe ser autonomamente imputável a causação culposa de uma qualquer situação obstativa de satisfação do crédito junto do infrator, corresponsabilização essa que é, aliás, acentuada através da consagração de um regime de responsabilidade solidária (ao invés de subsidiária). Em sentido contrário, argumentar-se-á que o terceiro fica apenas responsável pelo pagamento da coima, não lhe sendo transmitida a autoria do ilícito contraordenacional em si mesma considerada. À objeção de que seria fictícia a separação entre a responsabilidade pelo cometimento da contraordenação, a recair sobre a pessoa coletiva, e a responsabilidade pelo pagamento da coima, a recair sobre a pessoa coletiva e respeti- vos administradores ou gerentes, contrapor-se-á que a relevância jurídica da separação assenta no facto de, dependendo da infração que estiver em causa, poder admitir-se, em abstrato, que, juntamente com o paga- mento de uma coima, a pessoa coletiva responsável pela contraordenação ter sido também condenada em sanções assessórias de natureza não-pecuniária (cfr. artigo 562.º do mesmo Código), pelo cumprimento das quais aqueles sujeitos não ficam responsáveis. Por que assim é, é, pelo menos, duvidoso que se possa, com rigor, falar sequer em transmissão da responsabilidade – qualquer que seja a sua natureza – ou mesmo quali- ficar a responsabilidade como contraordenacional, estabelecendo antes a norma sub judicio um instrumento de natureza civil que atribui ao credor – a autoridade administrativa competente pelo processo contraordena- cional – o poder de exigir a um terceiro o cumprimento, através do pagamento da coima, da obrigação que tem como sujeito passivo a pessoa coletiva. Seja qual for o entendimento que se adote sobre a natureza da responsabilidade estabelecida na norma do artigo 551.º, n.º 3, do Código do Trabalho (2009) – matéria que, aliás, pertence ao domínio do direito infraconstitucional –, tal norma não viola a Constituição. 7. Ainda que se desse por assente que a responsabilidade contida no artigo 551.º, n.º 3, do Código do Trabalho (2009) é de natureza contraordenacional, jamais essa qualificação, efetuada no plano do direito infraconstitucional, se revelaria só por si determinante para efeitos do juízo sobre a sua conformidade cons- titucional. De acordo com uma certa leitura da jurisprudência do Tribunal Constitucional que analisámos (vide supra, ponto 5), a natureza da responsabilidade do agente teria sido decisiva para o juízo sobre a conformi- dade constitucional das normas em apreciação. Com efeito, teria sido pela circunstância de aí se ter afas- tado a natureza contraordenacional do título por que é responsabilizado o agente (tendo-se considerado aí

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