TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 89.º Volume \ 2014

54 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Este princípio de solidariedade nacional tem um conteúdo mínimo constitucionalmente determinável, devendo ser convocado como princípio valorativo de aferição da justiça das soluções político-legislativas e político-financeiras tomadas pelo Estado e pelas Regiões Autónomas. Assim, em situações extremas, tal princípio pode ser utilizado para decidir sobre a invalidade de soluções legislativas flagrantemente contrárias aos critérios de justiça e de equidade que devem nortear as relações entre os cidadãos residentes em todo o território nacional ou, numa perspetiva institucional, entre as Autonomias Regionais e a República. Neste princípio está inclusive contida uma importante dimensão simbólica, assente na ideia de que todos os por- tugueses se encontram empenhados na construção de um destino comum e que, portanto, devem partilhar equitativamente tanto os benefícios quanto as dificuldades desse percurso. Como o Tribunal Constitucional já referiu, no seu Acórdão n.º 11/07, a respeito do regime da Lei das Finanças Regionais, «o princípio, dito da solidariedade nacional, não pode ser perspetivado por forma a dele se extrair uma só direccionalidade, qual seja a da solidariedade representar unicamente a imposição de obri- gações do Estado para com as Regiões Autónomas, pois que, sendo uma das tarefas fundamentais do Estado a de promover o desenvolvimento harmonioso de todo o território nacional, tendo em conta, inter alia, o caráter ultraperiférico dos Açores e da Madeira [cfr. alínea g) do artigo 9.º da Constituição], visando a auto- nomia das Regiões, a par da participação democrática dos cidadãos, do desenvolvimento económico-social e da promoção e defesa dos interesses regionais, o reforço da unidade nacional e dos laços de solidariedade de todos os portugueses (n.º 2 do artigo 225.º), torna-se inequívoco que, neste ponto, não poderão deixar de ser ponderados também os interesses das populações do território nacional no seu todo, consequentemente aqui se incluindo as próprias populações do território “historicamente definido no continente europeu”». Nestes termos, não se mostra decisiva a circunstância de as alterações introduzidas pelo artigo 43.º do Decreto-Lei n.º 24/2013 não implicarem um acréscimo de transferências financeiras do Orçamento do Estado para o da Região Autónoma dos Açores, no ano de 2014, nem o facto de a eventual pronúncia pela sua inconstitucionalidade, com a consequente eliminação de tal norma, não alterar a disponibilidade das ver- bas respetivas pelos órgãos de governo regionais, não beneficiando os contribuintes do Continente. Decisivo é, sim, que o esforço de solidariedade, no contexto de crise económica e financeira, seja partilhado por todos, nomeadamente os que recebem as suas remunerações de verbas públicas, em todo o território nacional. Pelo exposto, o regime privilegiador introduzido pelo referido artigo 43.º fere o conteúdo mínimo do princípio de solidariedade nacional, colocando em perigo um dos objetivos da autonomia político-adminis- trativa: o já referido reforço dos laços que unem todos os portugueses. A última revisão do Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma dos Açores (Lei n.º 2/2009, de 12 de janeiro, doravante EPARAA) procurou blindar o regime constante do Decreto Legislativo Regional n.º 8/2002/A, conferindo expressamente à respetiva Assembleia Legislativa competência para definir regimes legais em matéria de complemento regional de pensão; complemento à retribuição mínima mensal garantida e remuneração complementar aos funcionários, agentes e demais trabalhadores da administração regional autónoma. Ora, cumpre acentuar que, no que se refere à remuneração complementar regional, a jurisprudência acima transcrita não coloca diretamente em causa a possibilidade de a Assembleia Legislativa manter em vigor o regime jurídico do Decreto Legislativo Regional n.º 8/2002/A. Aliás, uma pronúncia do Tribunal Constitucional pela inconstitucionalidade do artigo 43.º do Decreto n.º 24/2013 da Assembleia Legislativa Regional em nada afetará a vigência do regime que atualmente disciplina tal figura. Nem tão-pouco se pode legitimamente questionar a capacidade legislativa da Assembleia parlamentar açoriana para rever ou atualizar o regime substantivo da remuneração complementar regional, em conformidade com o espírito que presidiu à sua aprovação e à sua inclusão, aquando da revisão de 2009 do Estatuto Político-Administrativo, entre as matérias da competência legislativa regional. Porém, encontra-se vedado à Assembleia Legislativa Regional subverter o instituto de “remuneração complementar regional”, ao abrigo da alínea f ) do artigo 67.º do Estatuto referido, esvaziando, dessa forma,

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