TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 89.º Volume \ 2014

528 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL 10. Da jurisprudência referida, relevam, em especial, os Acórdãos n. os 227/07 e 116/08, pois proferidos no âmbito de procedimentos cautelares e recursos neles interpostos, como ocorre in casu . Pode ler-se no primeiro: «(…) Sobre o problema de saber se, com a inexistência de qualquer limite máximo para a taxa de justiça devida em procedimentos cautelares e recursos neles interpostos, cujo valor excede € 49 879,79, o montante deste tributo pode vir – e concretamente vem – a tornar-se flagrantemente desproporcionado ao serviço prestado, de tal forma que se revela “completamente alheio” ao custo da prestação deste ou à utilidade que o particular dele retira, apenas se dirá que não procede o argumento, avançado pelo Ministério Público, da “normal complexidade e delicadeza que está subjacente à generalidade dos litígios que envolvem valores dessa natureza”, que nem sempre se verificará na direta proporção do valor da causa e sem qualquer limite máximo. E também não procede o argumento da “relevância económica dos direitos e interesses que subjazem ao ato ou procedimento – e, portanto, da ‘utilidade’ auferida pelo utente – cuja prática se pretende alcançar ou cuja tramitação se desencadeia”, pois não é forçoso que a utilidade que se pretende retirar do serviço de administração da justiça aumente proporcionalmente ao aumento do valor da ação. Entende-se que o aprofundamento dos limites objetivos à qualificação de um tributo como taxa ou como imposto – designadamente, a consideração de que se está perante um serviço apenas prestado pelo Estado (dado o monopólio público do uso da força) e a fixação das custas em proporção direta ao valor da causa sem qualquer limite máximo – não poderia deixar de conduzir a considerar que a “taxa de justiça” devida em procedimentos cautelares, e recursos neles interpostos, no montante de € 584 403,82, é desproporcionada ao custo do serviço ou à utilidade tirada do procedimento cautelar. Pelo que, nestas circunstâncias, ficaria mesmo posta em causa a relação de correspondência entre o serviço e o tributo, o qual dificilmente poderia ser qualificado como verdadeira taxa. 9. Deve, aliás, notar-se que o que está em causa na dimensão normativa em apreço não é tanto – ou não é apenas – a bondade constitucional do critério elegido para a fixação das custas em função do valor da causa, mas, tendo em conta os demais elementos do critério de tributação, ou seja, os concretos escalões quantitativos fixados e o modo como operam, a ausência de qualquer limite máximo para o valor da causa, e, consequentemente, para os resultados da aplicação daquele critério na determinação do valor da tributação em custas, independentemente da complexidade do processo, ou, mesmo, da sua concreta e efetiva utilidade para o recorrente (podendo tratar-se, como no caso, de um procedimento cautelar)». E, mais à frente: «(…) De acordo com o que se considerou no Acórdão n.º 608/99 (publicado no Diário da República , II Série, de 16 de março de 2000), “na área em questão” [matéria de custas judiciais], o princípio da proporcionalidade reveste, “pelo menos, três sentidos: o de ‘equilíbrio entre a consagração do direito de acesso ao direito e aos tribu- nais e os custos inerentes a tal exercício’; o da responsabilização de cada parte pelas custas ‘de acordo com a regra da causalidade, da sucumbência ou do proveito retirado da intervenção jurisdicional’; e o do ajustamento dos ‘quantitativos globais das custas a determinados critérios relacionados com o valor do processo, com a respetiva tramitação, com a maior ou menor complexidade da causa e até com os comportamentos das partes’”. Ora, afigura-se claro que a interpretação normativa segundo a qual o montante da taxa de justiça devida em procedimentos cautelares e recursos neles interpostos cujo valor excede 49 879,79 € é definido em função do valor da ação sem qualquer limite máximo, e da qual resultaria, no caso, um montante de custas de € 584 403,82, não se situa logo dentro de limites razoáveis, e antes comporta uma restrição desproporcionada ao direito de acesso aos tribunais. Com efeito, a ponderação de meios e fins a que este Tribunal é conduzido não pode deixar de ter presente o quantitativo concreto da taxa de justiça exigida às ora recorridas – que era, repete-se, de € 584 403,82 –, originando um débito de custas muito superior aos custos da prestação do serviço de administração da justiça

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