TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 89.º Volume \ 2014

508 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL G) Pois, naturalmente, o acesso à informação bancária dos clientes do Recorrente em nada contribuiria para se chegar a uma conclusão quanto ao preço porque o Recorrente efetivamente alienou um imóvel (quanto muito interessariam as contas dos adquirentes desses imóveis). H) Na verdade, as contas dos clientes da sociedade aqui Recorrente, não estão de modo algum aqui em causa, pois a atividade que o Recorrente exerce é completamente irrelevante para estes efeitos, na medida em que, tal como qualquer outra sociedade, com um qualquer ramo de atividade, que compre ou aliene um imóvel, o Recorrente com certeza tem contabilidade e tem contas bancárias de onde sai o dinheiro para as suas compras e entra o dinheiro das suas vendas. l) Relativamente à pretensa violação do direito à tutela jurisdicional efetiva, diremos apenas que o contribuinte conhece as regras do mecanismo do artigo 139 do CIRC, pelo que ao acioná-lo tem que cumprir com as mes- mas, tal como a administração tributária. J) Inconstitucional seria, isso sim, não existir o mecanismo do artigo 139.º do CIRC! K) O legislador no artigo 139.º do CIRC não coartou a possibilidade de impugnação judicial, antes se limitou a fazê-la depender do prévio esgotamento dos meios tutelares graciosos antes de recorrer aos tribunais, especial- mente porque estamos perante uma matéria cuja natureza permite uma eficaz resolução administrativa à seme- lhança do que fez, por exemplo, nos artigos 131.º n.º 1, 132.º n.º 3 e 133.º no 2 do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), a propósito das impugnações em caso de autoliquidação, retenção na fonte e pagamento por conta, que dependem de reclamação prévia (vide Acórdão n.º 3872/10 de 21 de setembro de 2010 do Tribunal Central Administrativo). L) No artigo 139.º n.º 6 do CIRC, o legislador entendeu que as escrituras públicas não constituem prova sufi- ciente do preço efetivamente praticado no negócio, para efeitos de afastamento da norma anti abuso do artigo 64.º do CIRC, o que veio refletir alguma jurisprudência, nomeadamente o Acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul n.º 3101/01 de 29/04/2003 (anterior portanto aos artigos 64.º e 139.º do CIRC), a pro- pósito de correções de valores suportados em escrituras públicas. M) Face aos valores em presença, considerou-se pois neste Acórdão que a possibilidade de acesso às contas bancá- rias seria o meio adequado e necessário à obtenção do fim visado (de tributação pelo lucro real e afastamento de uma norma anti abuso), não tendo assim considerado o disposto no 139.º n.º 6 do CIRC como uma medida excessiva relativamente ao fim a obter, o que significa que o princípio da proporcionalidade foi respeitado. N) O dever fundamental de pagar impostos, estabelecido no artigo 103.º 1 e 2 da CRP, já não se esgota no tradi- cional cumprimento de obrigações pecuniárias. O) Efetivamente, face à deslocação sistemática de fases do procedimento de determinação, liquidação e cum- primento das obrigações fiscais para os particulares, assiste-se atualmente a uma transformação funcional da administração tributária, relegada fundamentalmente para funções de controlo e fiscalização dos impostos, tornando-se inevitável que o Estado reforce os poderes de inspeção da administração tributária. P) Ora, esse reforço não deverá deixar de compreender o acesso da administração tributária a informações prote- gidas pelo segredo bancário. Q) Outro aspeto a considerar é o de que, de acordo com o artigo 104.º n.º 2 da CRP, a tributação das empresas incide fundamentalmente sobre o seu lucro real (em detrimento do modelo de tributação pelo lucro normal), visto como afloração dos princípios da igualdade e da capacidade contributiva, sendo que a natureza do prin- cípio da tributação pelo lucro real, articulada com a natureza subsidiária do recurso a presunções como forma de determinar o rendimento real recomenda que a administração tributária esteja dotada de amplos poderes de controlo e de investigação, por forma a averiguar se a contabilidade das empresas, relembre-se, a forma prefe- rencial pela qual é determinado o lucro real se mostra ou não adequada para a determinação do lucro real. R) Uma vez que, nos termos do, pelo ora Recorrente invocado, artigo 266.º da CRP, a Administração Tributária está subordinada à Constituição e à lei, e que no caso em apreço se limitou a cumprir com a lei aplicável, não se vislumbra em que medida a sua atuação poderá ter desrespeitado o princípio da boa-fé. S) Em suma, não estamos em presença de qualquer violação de direitos, liberdades e garantias, T) Pois o que está em causa é apenas a privacidade, não a vida íntima privada,

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