TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 89.º Volume \ 2014
507 acórdão n.º 145/14 II – Sendo certo que se podem admitir restrições a esse direito por razões de salvaguarda de outros direitos e inte- resses constitucionalmente protegidos, designadamente a obtenção de receitas necessárias à prossecução do interesse público; III – Terão de ser consagrados mecanismos que acautelem os interesses pela tutela constitucional da privacidade. IV – O n.º 6 e o n.º 7 do artigo 139.º do CIRC pressupõem a perda da reserva da privacidade do banco, dos seus administradores e, por consequência, dos seus milhares de clientes, como condição sine qua non para o exercí- cio procedimental e processual do direito à prova do seu rendimento real; V – Tal pressuposto atenta de forma injustificada e desproporcionada contra (i) o direito à tutela da reserva da vida privada, contra (ii) o direito à tutela jurisdicional efetiva, bem como, contra (iii) o direito à tributação pelo rendimento real – todos direitos constitucionalmente protegidos; VI – Para além de que, sublinha-se, tal exigência é desadequada e desproporcionada em relação ao desiderato que visa alcançar; VII – Existem outros meios de prova, menos lesivos para os direitos fundamentais do contribuinte, adequados à demonstração do preço efetivo de venda dos imóveis; VIII – Em suma, a derrogação do sigilo bancário nos moldes previstos no n.º 6 do artigo 139.º, ao constituir uma condição prejudicial do acesso ao direito de produção de prova nele previsto e da impugnação da respetiva liquidação, constitui uma violação injustificada da reserva da intimidade da vida privada, uma restrição ao exer- cício efetivo do direito de acesso à justiça desajustada e desproporcionada, na medida em que é extremamente abrangente e ampla e, consequentemente, uma violação do direito à tributação pelo lucro real. A Fazenda Pública contra-alegou, concluindo do seguinte modo: «(…) A) O objeto do presente recurso passa por analisar e decidir a constitucionalidade do artigo 139.º n.º 6 do CIRC. B) A delimitação do âmbito do direito à intimidade da vida privada é uma questão bastante controversa, quer no plano jurisprudencial, quer no plano doutrinal. C) De qualquer modo, a conclusão que se impõe face à doutrina e jurisprudência predominantes é a de que o sigilo bancário não recai no âmbito de proteção do direito à reserva sobre a intimidade da vida privada, previsto no artigo 26.º da CRP, na medida em que não atinge o âmago, a essência, da reserva da intimidade da vida privada, podendo apenas pôr eventualmente em causa a privacidade dos contribuintes, não a sua intimidade. D) Ora, não constituindo o segredo bancário um valor absoluto, nem sequer estando diretamente englobado no que é nuclear à reserva da intimidade da vida privada e familiar, o mesmo terá de ceder, sempre que isso seja necessário para acautelar outros valores de hierarquia mais elevada, de harmonia com o princípio da prevalên- cia do interesse preponderante. E) E como refere o ora recorrente nas suas conclusões do recurso Sendo certo que se podem admitir restrições a esse direito por razões de salvaguarda de outros direitos e interesses constitucionalmente protegidos, designa- damente a obtenção de receitas necessárias à prossecução do interesse público 56. Aliás, O próprio Acórdão referido pelo Recorrente na sua petição de recurso (a saber, o Acórdão do Tri- bunal Constitucional (TC) n.º 442/2007, de 14 de agosto 2007, refere que (vide ponto 16.3 do acórdão) o segredo bancário localiza-se fora da esfera mais estrita da vida pessoal, e ainda que compreendido no âmbito de proteção, ocupa uma zona de periferia, pelo que a sua quebra por iniciativa da Administração tributária representa uma lesão diminuta do bem protegido. F) Assim, o n.º 6 do artigo 139.º do CIRC poderá eventualmente pôr em causa a privacidade do banco e dos seus administradores, mas, contrariamente ao invocado pelo ora Recorrente, jamais a dos seus clientes.
Made with FlippingBook
RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=