TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 89.º Volume \ 2014
492 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL constitutiva da afirmação da vontade do órgão que legisla, permitindo, sim, que o diploma legal possa ser executado, mediante a publicação que se seguirá. (A promulgação ‘ fait passer la loi dans sa phase d’execution’ , observa Edouard Sauvignon, in ‘ La promulgation des lois: reflexions sur la jurisprudence Desreumeaux’, na Revue du Droit Public et de la Science Politique en France et à l’Étranger , n.º 4, de 1981, a p. 1001.) Por seu turno, a referenda, mais do que corresponsabilizar o Governo em relação a atos presidenciais que, direta ou indiretamente, impliquem colaboração política – enquanto expressão de poderes partilhados –, exerce, igualmente, um controlo certificatório semelhante ao da promulgação e, por reflexo, de harmonização e colaboração entre os órgãos de Estado intervenientes. Por via da referenda (do ato do Presidente da República que é a promulgação), o Governo apenas se res- ponsabiliza nos precisos termos em que o pode ser o Chefe do Estado por haver promulgado, como, aliás, a Comissão Constitucional teve oportunidade de sublinhar no seu Parecer n.º 5/80 (in Pareceres da Comissão Constitucional, 11.º vol., a pp. 140 e segs.). Assim, não merece a referenda, face ao processo de formação legislativa, entendimento diverso do adotado para a promulgação, quanto ao problema subjacente. 4 – De acordo com as considerações desenvolvidas e a orientação da jurisprudência deste Tribunal, aponta- -se para a não exigência de publicação dentro dos limites temporais fixados na lei de autorização, e, designa- damente, para a irrelevância da promulgação ou da referenda neste específico domínio, não se vislumbrando outro qualquer momento – ou elemento do processo de formação legislativa – com virtualidade para um diferente entendimento. Consignar-se-á, não obstante, uma certa hesitação doutrinal. Gomes Canotilho e Vital Moreira, ao tempo da redação originária do artigo 122.º, defenderam que os ‘decretos-leis autorizados devem ser publicados durante o período de autorização, pois só a publicação lhes dá existência e não é possível controlar o momento da aprovação’, se bem que reconhecessem poder a solução dar lugar a ‘consequências pouco razoáveis, uma vez que a data da publicação não depende do Governo’, dado ser ao Presidente da República que compete promulgar e mandar publicar esses diplomas (cfr. Constituição da República Portuguesa Anotada, Coimbra, 1978, a p. 336). Já na 2.ª edição desta obra, face à citada alteração do preceito constitucional, se bem que mantenham a pro- blematicidade da questão, cuja solução não têm por evidente, afirmam estes autores ser verdade que, por um lado, a aprovação pelo Governo não basta para que se dê por existente juridicamente um diploma legislativo e não é publicamente controlável, mas, por outro lado, a publicação deixou de ser condição de existência e, além disso, não depende do Governo ( ob. cit. , 1.º vol., 2.ª edição, Coimbra, 1985, p. 205). Nas diversas edições do seu Direito Constitucional, Gomes Canotilho denuncia a similitude na evolução do seu entendimento face às diferentes redações do artigo 122.º Assim, nas 1.ª e 2.ª edições da obra (respetivamente a pp. 305 e 356), começa por considerar prevalecente a tese da não exigência da publicação dentro dos limites temporais fixados pela lei de delegação, argumentando- -se nesse sentido com o facto de a publicação ser um ato sucessivo estranho ao exercício da autorização legis- lativa. Contrapõe, no entanto, que, a favor da exigência da publicação dentro dos limites temporais fixados na lei de autorização, pode dizer-se que a falta de publicidade dos atos implica a sua inexistência jurídica e, por isso, uma lei não publicada é uma lei inexistente. Porém, não deixa de reconhecer, a favor da suficiência da simples aprovação dos decretos-leis pelo Governo, o facto de, tal como a lei se considera aprovada depois da sua aprovação pelo órgão parlamentar, também o decreto-lei do Governo, no exercício de autorizações legislativas, se consideraria perfeito com a simples aprovação pelo Governo. Na 3.ª edição da citada obra, Gomes Canotilho já chama a atenção para o n.º 2 do artigo 122.º da Cons- tituição revista, que determina como sanção da falta de publicidade a ineficácia e não a inexistência, como acontecia na redação inicial deste artigo (p. 636). Este aspeto é igualmente salientado na 4.ª edição, de 1989 (p. 635), mas aí também se insiste em que a simples aprovação não é condição suficiente de existência de um
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