TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 89.º Volume \ 2014

471 acórdão n.º 137/14 O legislador tributário decidiu legitimamente criar um regime tributário especial para as SGPS – mais favorá- vel, em geral, do que o das normais sociedades (não SGPS) e adequado à sua natureza e características. As SGPS são sociedades que visam a detenção e gestão de participações estáveis (por mais de 1 ano) e significa- tivas (por regra mais de 10% do capital e direitos de voto) noutras entidades, como forma indireta de exercício de atividades económicas (artigo 1.º, n.º 1 a 3, do Dec. lei n.º 595/88, de 30/12). A lei fiscal, no desejo de que os grupos económicos sejam encabeçados por sociedades holding com a forma e natureza de SGPS (…) – concedeu-lhe variados benefícios fiscais específicos, quer, por exemplo, ao nível do imposto de selo (cfr. artigo 7.º, n.º 1, do Código de Imposto de Selo), quer em sede de imposto sobre o rendimento [não tributação dos rendimentos mais típicos das SGPS; as mais e menos-valias (saldo) com a venda das suas parti- cipações mais típicas (detidas duradouramente por mais de 12 meses); e os dividendos (à data dos factos, com uma regra especifica, no n.º 1 do artigo 31.º do EBF – pelo qual se excluía de imposto todos os dividendos auferidos por uma SGPS) – Cfr. “Relatório de Reavaliação dos Benefícios Fiscais”, in Cadernos de Ciência e Técnica Fiscal, 198, pp. 340 segs. e José Engrácia Antunes, Os Grupos de Sociedades, 2.ª edição, Almedina, Coimbra, pp. 88 segs.]. O artigo 31.º do EBF criou, por assim dizer, um regime-regra de não tributação dos rendimentos típicos e específicos das SGPS; quis, concreta e designadamente, uma suspensão de imposto neste patamar intermédio: tri- buta os rendimentos quando obtidos petas sociedades operacionais (patamar inferior) e quando sejam percebidos pelos acionistas pessoas singulares (patamar superior). Mas exclui do imposto se e quando estejam neste patamar intermédio, porque os fluxos financeiros terão de ser reinvestidos nas atividades empresariais operacionais. A lei (artigo 31.º do EBF), perante esta ratio , dizia claramente que os rendimentos típicos das SGPS não são tributados: a venda da raiz dos bens (mais e menos-valias com a venda das partes de capital) e os rendimentos periódicos dessas partes de capital (dividendos). Note-se que o intérprete tem de aceitar e acatar esse regime legal na sua literalidade, até porque a matéria dos benefícios fiscais está coberta pelo princípio da legalidade tributária vertido na Constituição (artigo 103.º, n.º 2, da CRP). O artigo 31.º, n.º 2, da EBF, não é, por isso, inconstitucional. Com efeito, não desconsidera propriamente as menos-valias em termos fiscais; diz apenas – num benefício fiscal de carinho a este tipo de contribuintes – que o saldo das mais e menos-valias (se detidas por 12 meses) não é tributado. O que se pretende é isentar as mais-valias de imposto. E o saldo positivo que nas entidades com escopo lucrativo corresponderá à situação mais frequente. Mas como usual regra de reciprocidade – retira também efeito tributário às menos-valias realizadas. Nada impedia, em abstrato, que a lei isentasse as mais-valias (se as partes de capital fossem detidas por 12 meses) e aceitasse fiscalmente as menos-valias (se as partes de capital fossem detidas por mais de 12 meses). Mas por não o ter feito – tal não significa que esse preceito padeça de qualquer inconstitucionalidade. O legislador criou um benefício fiscal – um bom benefício fiscal – ao isentar de imposto as mais-valias das SGPS. Mas não quis legitima e compreensivelmente estendê-lo à aceitação fiscal das menos-valias – e o intérprete tem de respeitar essa vontade legal. Com efeito, não o quis, por três motivos: por uma razão de reciprocidade (se as mais-valias não concorrem para o lucro fiscal, as menos-valias terão igual resultado); por razões técnicas [a lei fiscal tributa sempre o saldo (a diferença) entre as mais e menos-valias – cfr. artigo 46.º do CIRC e artigo 43.º do CIRS]; por razões operacionais [aceitar fiscalmente as menos-valias, e isentar as mais-valias – equivaleria a reconhecer e aceitar uma situação muito provável de constante prejuízos fiscais (pois as mais-valias e dividendos estão isentos de imposto) ou permitir que as menos-valias fossem deduzidos aos proveitos tributados das SGPS (menos usuais) – juros, prestações de serviço, mais-valias tributadas (por participações detidas por menos de 12 meses)...], num benefício fiscal de larguíssimo espectro que o legislador não quis manifesta e legitimamente estipular. Não há por isso, qualquer violação do rendimento real (igualdade e/ou capacidade contributiva): o legislador criou um benefício fiscal com o espectro que entendeu; a Constituição não impõe uma relação de causalidade necessária com a aceitação fiscal de todos os custos. Pode haver custos económicos sem reconhecimento fiscal

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