TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 89.º Volume \ 2014

467 acórdão n.º 136/14 DECLARAÇÃO DE VOTO Votei no sentido da inconstitucionalidade do n.º 2 da Base XXII da Lei n.º 2127, de 3 de Agosto de 1965, na parte em que estatui que a “revisão só poderá ser requerida dentro dos dez anos posteriores à data da fixação da pensão”, por violação do princípio da igualdade (artigo 13.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa). 1. A Lei n.º 98/2009, de 4 de setembro, entrada em vigor no dia 1 de janeiro de 2010 (cfr. artigo 188.º do diploma), veio regulamentar, entre o mais, o regime de reparação de acidentes de trabalho, nos termos do artigo 284.º do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro. Um dos aspetos expressamente salientados na Exposição de motivos do Projeto de Lei apresentado na Assembleia da Repú- blica foi, precisamente, a “eliminação da regra que determina que a pensão por acidente de trabalho só pode ser revista nos 10 anos posteriores à sua fixação, passando a permitir-se a sua revisão a todo o tempo, tal como já sucede no regime da reparação de doenças profissionais” (cfr. Projeto Lei n.º 786/X/4.ª). À redação do n.º 3 do artigo 70.º, que permite a revisão a todo o tempo, com o limite de ser requerida uma vez em cada ano civil, não correspondeu, porém, a revogação do n.º 2 da Base XXII da Lei n.º 2127, que estabelece o limite de dez anos. Pelo contrário, a opção foi antes a de o novo regime valer apenas para os acidentes de trabalho ocorridos depois da entrada em vigor da Lei n.º 98/2009 (cfr. artigos 187.º, n.º 1, e 188.º). E é esta opção que coloca a questão de constitucionalidade que este acórdão decidiu – a de saber se, assim sendo, é inconstitucional, por violação do princípio da igualdade, a norma segundo a qual “a revisão só poderá ser requerida dentro dos dez anos posteriores à data da fixação da pensão”, norma que integra o regime da reparação de acidentes de trabalho ocorridos antes de 1 de janeiro de 2010. 2. O Tribunal tem reiterado o entendimento de que o princípio da igualdade não opera diacronica- mente, pelo que não será em regra aplicável a fenómenos de sucessão de leis no tempo (entre outros, Acórdãos n. os 43/88, 309/93, 99/04, 188/09, 3/10, 260/10 e 398/11, disponíveis em www.tribunalconstitucional.pt ). Lê-se no Acórdão n.º 260/10 que «o legislador não está impedido de, através de uma alteração legislativa, poder operar uma modificação do tratamento jurídico de uma mesma categoria de situações, implicando que realidades substancialmente iguais passem a ter tratamento diferente, pois isso não significa que essa diver- gência seja incompatível com a Constituição, desde que seja determinada por justificadas razões de política legislativa. Visando a alteração legislativa conferir um tratamento diferenciado a determinada matéria, a ocor- rência de situações de desigualdade, resultante da aplicação do novo regime em face do quadro legal revogado, é inerente à liberdade do legislador de alterar as leis em vigor». Mas mais se salienta que quando se diz que o princípio da igualdade não opera diacronicamente quer-se significar, por um lado, que a igualdade tem pro- teção diacrónica apenas por via do princípio da proteção da confiança e, por outro, «que apenas se abrangem as desigualdades resultantes de aplicação do mesmo regime legal durante a sua vigência, mas já não quando, após a entrada em vigor da nova lei, o legislador restringe a sua aplicação a determinadas situações, sem que se vislumbre fundamento razoável para essa distinção. Neste último caso, o princípio da igualdade consagrado no artigo 13.º da Constituição, imporá um juízo de censura constitucional sobre essa opção» (no mesmo sentido, Acórdãos n. os 203/86, 12/88, 407/10 e 398/11, disponíveis em www.tribunalconstitucional.pt ) . Por outras pala- vras, “a fixação do tempo de aplicação de uma norma poderá brigar com o princípio da igualdade se houver tratamentos desiguais para situações iguais e sincrónicas” (cfr. Acórdão n.º 34/86, disponível no mesmo sítio). 3. Em 2009, no exercício da sua liberdade de conformação em matéria de regime de reparação de aci- dentes de trabalho, o legislador eliminou o limite de dez anos que então valia para a revisão de pensões por acidente de trabalho (n.º 2 da Base XXII da Lei n.º 2127), estabelecendo a regra da “revisão a todo o tempo das prestações” (n.º 3 do artigo 70.º da Lei n.º 98/2009). Restringiu, porém, a aplicação desta regra aos acidentes de trabalho ocorridos após 1 de janeiro de 2010 (artigos 187.º, n.º 1, e 188.º da Lei n.º 98/2009).

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