TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 89.º Volume \ 2014
464 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Para este entendimento concorreu também a «verificação da experiência médica quotidiana de que os agravamentos como as melhorias têm uma maior incidência nos primeiros tempos (daí a fixação dos dois anos em que é possível requerer mais revisões), decaindo até decorrer um maior lapso de tempo (que o legis- lador fixou generosamente em dez anos)», como lembrado é no Acórdão n.º 612/08, por referência a Carlos Alegre, Regime Jurídico dos Acidentes de Trabalho e das Doenças Profissionais, Coimbra, 2000, p. 128. e) Apreciação da questão de constitucionalidade colocada pela decisão recorrida 16. A questão de constitucionalidade colocada, tal como decorre da decisão recorrida, não se reconduz, todavia, à verificação de um limite temporal, em si mesmo considerado, para requerer a revisão da pensão, objeto da jurisprudência proferida pelo Tribunal Constitucional concernente à previsão legal daquele limite, referida anteriormente. Aliás, a decisão recorrida faz expressa menção a essa jurisprudência. A questão colocada pelo tribunal a quo incide antes em saber se «em face do determinado na Lei n.º 98/2009 a interpretação que tem sido feita da Base XXII, n.º 2 da Lei n.º 2127 é agora inconstitucional por violação do princípio da igualdade, consagrado no artigo 13.º da Constituição da República Portu- guesa», como expressamente identifica a decisão proferida. E é por concluir pela violação daquele princípio, designadamente por não encontrar justificação suficiente e razoável no princípio da não retroatividade da lei, para a diferença de tratamento de situações idênticas resultante da sucessão legislativa introduzida pela Lei n.º 98/2009, que, a final, se considera de algum modo também ofendido o direito de justa reparação consagrado no artigo 59.º, n.º 1, alínea f ) , da Constituição. 17. Ora, ao identificar a violação do princípio da igualdade, exclusivamente na dualidade de regimes vigentes no que respeita à existência, ou não, de prazo limite para o pedido de revisão de pensões devidas por acidentes de trabalho ocorridos antes e depois de 1 de janeiro de 2010, resultante da sucessão legislativa verificada, a decisão recorrida enferma de alguns problemas de fundo. Desde logo, a decisão não procede a uma análise global dos dois regimes, ignorando outros aspetos relevantes na compreensão do seu alcance como, por exemplo, a possibilidade prevista apenas no regime definido até 2010, de solicitação de duas revisões por ano, nos dois primeiros anos subsequentes à data da fixação da pensão. Para além disso, se tomarmos na devida consideração a jurisprudência do Tribunal Constitucional, já acima enunciada, a diferença nos regimes legais em confronto nem se encontra propriamente na previsão, na Base XXII, de um prazo limite para requerer a revisão, antes na previsão de um prazo (de dez anos) cujo decurso, sem que a pensão tenha sofrido qualquer revisão por alteração da incapacidade do sinistrado, pre- clude a apresentação de novos pedidos. 18. De qualquer forma, pode referir-se que o tratamento diferente, resultante da sucessão de regimes legais, de situações jurídicas que, por se prolongarem no tempo, se apresentam como sincronicamente iguais, pode encontrar justificação noutra ordem de razões. E é neste ponto que reside o maior problema suscitado pelo juízo de inconstitucionalidade formulado na decisão recorrida. Com efeito, esta fundou o juízo de inconstitucionalidade numa aplicação do princípio da igualdade, ignorando eventuais razões justificadoras da restrição do âmbito de aplicação do novo regime a qual, de resto, nem sequer resulta da norma cuja apli- cação foi recusada (mas sim da norma contida no artigo 187.º, n.º 1, da Lei n.º 98/2009). De facto, como todos os princípios fundamentais, também o princípio da igualdade sofre a força ini- bidora de outros princípios gerais aplicáveis à situação. Importa, assim, analisar se a diferença assinalada encontra ainda justificação em alguma outra ordem de razões a que a Constituição também manda atender.
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