TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 89.º Volume \ 2014
458 TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Assim, e relativamente aos acidentes ocorridos após 1 de janeiro de 2010, o direito de pedir a revisão das prestações deixou de estar condicionado ao limite máximo de 10 anos [na interpretação atrás indicada e que abrange a situação dos autos]. E a pergunta que devemos colocar é a seguinte; Será que em face do determinado na Lei n.º 98/2009 a interpretação que tem sido feita da Base XXII, n.º 2 da Lei n.º 2127 é agora inconstitucional por violação do princípio da igualdade, consagrado no artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa? É o que vamos analisar. O princípio da igualdade traduz-se na ideia da proibição do arbítrio, ou seja, «As medidas de diferenciação hão de ser materialmente fundadas sob o ponto de vista da segurança jurídica, da praticabilidade, da justiça e da solidariedade, não devendo basear-se em qualquer razão constitucionalmente imprópria» – Acórdão do Tribunal Constitucional de 23 de abril de 1992, no Boletim do Ministério da Justiça , n.º 416, pp. 296 e segs. Escreveu-se, também, no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 409/99 que ‘O princípio da igualdade, consagrado no artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa, impõe que se dê tratamento igual ao que for essencialmente igual e que se trate diferentemente o que for essencialmente diferente. Na verdade, o prin- cípio da igualdade, entendido como limite objetivo da discricionariedade legislativa, não veda à lei a adoção de medidas que estabeleçam distinções. Todavia, proíbe a criação de medidas que estabeleçam distinções discri- minatórias, isto é, desigualdades de tratamento materialmente não fundadas ou sem qualquer fundamentação razoável, objetiva e racional. O princípio da igualdade, enquanto princípio vinculativo da lei, traduz-se numa ideia geral de proibição do arbítrio (...)’. Posto isto avancemos para o caso concreto. Se o legislador da Lei n.º 98/2009 de 04.09 não impôs qualquer limite para a formulação do pedido de revisão das prestações devidas em consequência de acidente de trabalho é porque ‘abandonou’ a presunção de que o decurso de 10 anos, contados da data da fixação da pensão, e sem que o sinistrado requeira a revisão, é tempo mais do que suficiente para se considerar as lesões decorrentes do acidente consolidadas. E, se assim é, então os fundamentos que o Tribunal Constitucional tem invocado para não considerar a Base XXII, n.º 2, da Lei n.º 2127 inconstitucional, não foram acolhidos pela Lei n.º 98/2009 de 04.09. Assim, e no que diz respeito ao modo de exercício do direito de revisão das prestações, verifica-se, nitida- mente, uma diferença de tratamento de situações jurídicas idênticas. Na verdade, a diferença de tratamento reside no facto de o acidente de trabalho ocorrer antes, ou depois da entrada em vigor da Lei n.º 98/2009 [no o primeiro caso, o sinistrado que nunca tenha requerido a revisão durante dez após a data da fixação das prestações, já não o pode fazer; no segundo caso, o sinistrado pode requerer a revisão, uma vez por ano, e sem qualquer limite de tempo]. E salvo o devido respeito, não parece que essa diferença de tratamento de situações idênticas – quanto ao modo de exercício do direito de revisão das prestações – encontre justificação suficiente e razoável no princípio da não retroatividade da lei. Ou seja, tal princípio, consagrado no artigo 187.º, n.º 1 da Lei n.º 98/2009, não é suficiente para afastar o princípio da igualdade. E de algum modo, esta diferença de tratamento acaba, igualmente, por ofender o direito de justa reparação consagrado no artigo 59.º, n.º 1, alínea f ) da Constituição da República Portuguesa. Com efeito, o único elemento que separa os sinistrados – relativamente aos acidentes ocorridos antes ou depois de 1 de janeiro de 2010 – é apenas a data do acidente, e nada mais, o que, e ressalvando melhor opinião, nos parece bem pouco tendo em conta os interesses em causa e constitucionalmente protegidos. Por isso, e em face do disposto na Lei n.º 98/2009 de 04.09 – relativamente ao modo de exercício do direito de pedir a revisão das prestações – é inconstitucional o determinado na Base XXII, n.º 2, da Lei 2127 [na interpretação seguida pelo Tribunal Constitucional nos Acórdãos n. os 155/03 de 19 de março de 2003, n.º 612/2008 de 10 de dezembro de 2008 e n.º 219/2012 de 26 de abril de 2013], por violação dos princípios
Made with FlippingBook
RkJQdWJsaXNoZXIy Mzk2NjU=