TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 89.º Volume \ 2014
447 acórdão n.º 111/14 O ponto de dissídio reside no estabelecimento de um prazo para o pedido de revisão de pensões por aci- dente de trabalho (que pode justificar-se por simples razões de segurança jurídica) e que não tem correspon- dência na norma de direito civil. Note-se, em todo o caso, que, considerado globalmente, o regime de efetivação dos direitos resultantes de acidente de trabalho não se apresenta objetivamente mais desfavorável que o de responsabilidade civil por facto ilícito. Desde logo, o direito de indemnização cível está sujeito a um prazo prescricional curto, nos termos do artigo 498.º do Código Civil, e segue as regras processuais comuns, ao passo que o direito à reparação por acidente de trabalho segue o processo especial regulado nos artigos 99.º e seguintes do Código de Processo de Trabalho, com patrocínio oficioso do Ministério Público e sem sujeição a prazo de caducidade, com diversos outros mecanismos de garantia de efetivação dos direitos, como seja a existência de uma fase conciliatória preliminar. Por outro lado, mesmo no domínio da Lei n.º 2127, a que pertence a norma arguida de inconstitucional, a disciplina relativa à obrigação de indemnizar está fortemente orientada para assegurar o efetivo ressarcimento do trabalhador, quer por via de prestações em espécie que se destinam a restaurar a capacidade de trabalho, quer através de prestações em dinheiro que visam a compensação pecuniária por perda ou redução da capaci- dade de ganho da vítima (Bases IX a XIXI), e que incluem, como garantia do pagamento das indemnizações devidas, um sistema de obrigatoriedade de seguro (Base XLIII), bem como uma forma de responsabilidade subsidiária através do Fundo de Acidentes de Trabalho (Base XLV). Acresce que o dever de indemnizar assenta numa responsabilidade civil objetiva, mas que não obsta ao agravamento da indemnização e à ressarcibilidade de danos não patrimoniais quando se conclua pela existência de culpa por parte do empregador (Base XVII). Sendo que, em todo o caso, verificando-se os pressupostos da responsabilidade civil subjetiva, não está vedado ao trabalhador optar pelo ressarcimento segundo o regime de direito civil, e fazer funcionar os mecanismos de responsabilidade aquiliana que pudessem reputar-se, em concreto, como mais favoráveis aos interesses do trabalhador, e, designadamente, o mencionado regime de fixação da indemnização em renda, com possibili- dade de revisão a todo o tempo do montante indemnizatório em função da alteração de circunstâncias (Pedro Romano Martinez, Direito do Trabalho , II Vol., 2.º Tomo, 3.ª edição, Lisboa, p. 190). Em todo o caso, também neste plano de consideração, não é evidente que o regime definido no n.º 2 da Base XXII da Lei n.º 2127, represente uma violação do princípio da igualdade. 6. Certo é que, conforme observa o Exm.º Procurador-Geral Adjunto nas suas alegações, um sistema jurí- dico de revisão de pensões está sempre dependente da demonstração do nexo causal entre o acidente e o agra- vamento da lesão, pelo que a possibilidade de invocação de danos futuros adicionais resultantes do acidente, independentemente de qualquer prazo de caducidade, apenas agravaria o ónus processual do lesado que teria mais dificuldade em estabelecer a correlação do dano superveniente com o acidente. Poderia assim não haver nenhum motivo para o estabelecimento de um prazo limite, quando o lesado tem sempre o ónus de provar que o agravamento posterior do dano está ainda relacionado com o acidente. O ponto é que o legislador dispõe de alguma margem de livre conformação na concretização do direito à justa reparação por acidentes de trabalho e doenças profissionais constitucionalmente consagrado. Pelo que a questão que poderá colocar-se, para além das já analisadas, é a de saber se a fixação de um prazo de dez anos para a admissibilidade da revisão – que, como se viu, tanto é aplicável aos pensões por acidente de trabalho como às pensões por doença profissional não evolutiva –, é suscetível de violar o próprio direito constitucional previsto no artigo 59.º, n.º 1, alínea f ) , da Lei Fundamental. Assentando na ideia, que já antes se aflorou, de que o direito à justa reparação por acidentes de traba- lho apresenta natureza análoga aos direitos, liberdades e garantias, a fixação de um prazo para a revisão da pensão, nos termos previstos na n.º 2 da Base XXII da Lei n.º 2127, configura um mero requisito relativo ao modo de exercício do direito. E como tem sido sublinhado pelo Tribunal Constitucional, ‘[s]ó as normas restritivas dos direitos funda- mentais (normas que encurtam o seu conteúdo e alcance) e não meramente condicionadoras (as que se limitam
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