TRIBUNAL CONSTITUCIONAL Acórdãos 89.º Volume \ 2014

439 acórdão n.º 108/14 quando no artigo 40.º, n.º 2, b), iv) , dispõe que “a criança suspeita ou acusada de ter infringido a lei penal, tenha, no mínimo direito(…) a não ser obrigada a testemunhar ou a confessar-se culpada (…)”. Daí que, para proteção da autodeterminação do menor, este deva também ter a possibilidade de deci- dir, no exercício de uma plena liberdade de vontade, qual a posição a tomar perante a matéria que constitui objeto simultâneo do processo penal e do processo tutelar, nos quais é chamado a depôr, como testemunha e como menor a quem pode ser imposta medida tutelar, respetivamente. É certo que os menores de 16 anos não prestam juramento [artigo 91.º, n.º 6, alínea a) , do Código de Processo Penal], nem podem ser sancionados penalmente pela recusa em depor ou por prestarem depoimento falso (artigo 19.º do Código Penal), mas não deixam de ter a obrigação de prestar de depoimento e de dizer a verdade, nos termos do artigo 132.º, alínea d) , do Código de Processo Penal. Sendo necessário, relativamente ao menor sujeito a um processo tutelar, garantir que qualquer contri- buto, que resulte em desfavor da sua posição, seja uma afirmação esclarecida e livre de autorresponsabilidade, a simples obrigação deste prestar depoimento como testemunha, em processo penal, cujo objeto integre os mesmos factos que estão em jogo em processo tutelar, pode constituir uma violação do princípio nemo tene- tur se ipsum accusare . Todavia, restringindo-se a interpretação normativa sob análise à hipótese em que, no momento em que o menor depõe como testemunha no processo penal, o processo tutelar já terminou, tendo o mesmo já sido objeto de decisão de arquivamento, as razões que presidem à invocação daquele princípio deixam de se justificar, pois, o depoimento que o menor venha a efetuar já não é suscetível de contribuir para a aplicação de uma medida violadora dos seus direitos fundamentais. Na verdade, arquivado o processo tutelar educativo não prevê a lei a possibilidade do mesmo ser rea- berto com fundamento no depoimento prestado pelo menor em processo penal ou por terem sido descober- tas novas provas em resultado desse depoimento. Assim sendo, a obrigatoriedade do menor prestar depoimento no processo penal nestas circunstâncias deixa de constituir uma violação do princípio nemo tenetur se ipsum accusare , ficando por isso prejudicada a apreciação da questão, suscitada pelo Ministério Público nas suas contralegações, na senda do Acórdão n.º 304/04, deste Tribunal (acessível em www.tribunalconstitucional.pt ) , relativa à possibilidade de um ter- ceiro, para cuja condenação contribuiu um depoimento testemunhal prestado em violação daquele princí- pio, obter um juízo de inconstitucionalidade do critério normativo que validou esse depoimento. Por estas razões não deve julgar-se inconstitucional a norma constante do artigo 133.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, interpretado no sentido de não exigir consentimento para o depoimento, como testemu- nha, de menor de 16 anos, à data dos factos, a quem tenha sido instaurado processo tutelar educativo pela prática dos factos criminalmente imputados ao arguido, tendo esse processo já terminado com o seu arqui- vamento, julgando-se improcedente o recurso interposto. III – Decisão Nestes termos, decide-se: a) Não julgar inconstitucional a norma do artigo 133.º, n.º 2, do Código de Processo Penal, interpre- tada no sentido de não exigir consentimento para o depoimento, como testemunha, de menor de 16 anos, à data dos factos, a quem tenha sido instaurado processo tutelar educativo pela prática dos factos criminalmente imputados ao arguido, tendo esse processo já terminado com o seu arquiva- mento. E, em consequência, b) Julgar improcedente o recurso interposto por A..

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